Menosprezo do povo boliviano organizado

Como o Jornal Nacional os classificou? "Pequenos grupos que desrespeitam a lei e querem desestabilizar o país", diz o enviado especial, que completa afirmando (e mostrando uma imagem) que os movimentos sociais estão "em menor número".

Manipulação grosseira com a imagem e mentiras com as palavras, eis o que se deu. Contra o poder das imagens e do monopólio, no entanto, o bravo povo boliviano nada pode fazer. O que não o impede de parar a venda de recursos naturais da Bolívia a preço de banana. Inclusive para a gigante transnacional PETROBRÁS — alguém aí conhece? —, o que fez o JN se preocupar profundamente com "o bloqueio das estradas que ameaça o abastecimento do país". Faltou dizer que país é esse.

O jornal O GLOBO vai na mesma linha e diz qual é a justificativa do presidente: "O governo alegou que aumentar os royalties acima de 18% levaria a processos contra a Bolívia em tribunais internacionais". [edição de 11/3/2005].

Quando é governo, é um "argumento". Uma coisa fina, de gente boa. Agora vejam como o líder da oposição, Evo Morales, é tratado: "O líder cocalero, chefe do Movimento ao Socialismo (MAS), manteve-se firme em sua rejeição à nova Lei de Hidrocarbonetos proposta pelo governo, que estabelece a cobrança de 18% de royalties das empresas petrolíferas que atuam no país: Morales bateu pé na exigência de 50% de royalties".

Para O GLOBO, não se trata de um argumento. Ele "bateu o pé". Coisa de criança, que quer porque quer e ponto! Além disso, trata a crise como se fosse um "fosso de discórdia entre os dois [Mesa e Morales], que mergulha a Bolívia numa crise institucional desde a semana passada". A Bolívia passa por uma crise social há séculos e a discórdia é entre todos os movimentos sociais e a minoria privilegiada. O que a GLOBO enxerga? A crise institucional. Dane-se o povo, viva as instituições.

O enviado especial Flavio Henrique Lino continua sua exaltação a Mesa: "Dezenas de milhares de bolivianos atenderam à convocação de Mesa e acorreram ontem às praças centrais das principais cidades para pedir o fim dos bloqueios nas estradas do país. Em La Paz, Cochabamba, Tarija, Santa Cruz de la Sierra, Potosí e outras cidades, a cena foi a mesma: multidões de manifestantes agitando bandeiras bolivianas, lenços brancos, gritando slogans de apoio a Mesa e exigindo o retorno à normalidade. “Queremos paz” e “Não aos bloqueios” foram os gritos de guerra dos manifestantes". (matéria "Negociação entre Mesa e opositor fracassa", O GLOBO, 11/3/2005)

Chegou ao cúmulo de dizer que a "massa" de apoiadores de Mesa pediu "mano dura (sic) do governo contra os bloqueadores das estradas". Repressão: pelo jeito, a GLOBO não consegue se livrar da sua origem, em 1965, durante a ditadura militar.

Será que isso tem a ver com o tipo de "integração" que a própria empresa deseja? Porque no mesmo dia, na parte de Economia, João Roberto Marinho, vice da empresa, declarou que "para O GLOBO é de suma importância contar com o intercâmbio de informações editoriais com os jornais mais importantes da região (sic), no momento em que o Brasil está promovendo sua integração com a América Latina". Ele disse isso após tomar posse na presidência do Grupo de Diarios América (GDA), consórcio formado em 1991 por 11 jornais latino-americanos líderes em seus países "para reforçar a posição de seus associados na região e em seus próprios mercados". (matéria "O GLOBO assume presidência do GDA", O GLOBO, 11/3/2005)

Recado claro: se não fizermos a integração dos povos antes, a elite a fará.

Gustavo BARRETO www.consciencia.net

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