Renovação Comunista: Referendo sobre Constituição Europeia

A Renovação Comunista considera que o Governo e a Assembleia da República não podem invocar mandato popular sobre matérias fundamentais que constam do projecto de Constituição Europeia.

Por isso a RC defende a realização de um referendo nacional, e a sua realização entre o final da Conferência Intergovernamental e as eleições para o Parlamento Europeu. A RC critica a ambiguidade e a duplicidade sobre o referendo por parte dos partidos com assento parlamentar, com a excepção do Bloco de Esquerda, que comprometem a sua concretização. São igualmente inaceitáveis as propostas de perguntas surgidas publicamente que iludem o essencial sobre o que os portugueses devem ser ouvidos. Para obviar às dificuldades de enquadramento do referendo, a RC defende que os partidos representados na AR usem o período de revisão constitucional em curso para tornar possível referendar tratados da União Europeia, começando já pela Constituição Europeia.

A RC defende uma representação justa e equilibrada dos estados e dos povos no futuro desenho dos órgãos e dos processos de decisão a nível europeu, que inclua nomeadamente a formação de uma segunda câmara de representação paritária dos Estados, o abaixamento da fasquia de bloqueio das decisões do Conselho de forma a reforçar o peso dos pequenos países e a manutenção do princípio de um comissário por país, com direito a voto. A RC está a examinar a possibilidade de, ao abrigo do direito de participação e propaganda reconhecido, nos referendos, aos movimentos de cidadãos, apelar à realização de uma campanha nacional em torno de uma plataforma política sobre as questões europeias a debater e a apresentar aos portugueses.

1. A Renovação Comunista já anteriormente tornou público que o método seguido para a elaboração do projecto de Constituição Europeia, que os governos da União Europeia estão agora a debater, não era o único, nem terá sido a melhor solução para avançar no sentido da elaboração de um documento desta importância.

2. Além disso, sem desvalorizar o conteúdo de tal documento, a designação adoptada - “Constituição” - não é claramente apropriada para um texto que tem a natureza de um tratado internacional, cujo conteúdo está agora a ser estabelecido (e pode no futuro ser alterado) apenas por decisão intergovernamental.

3. A falta de debate das questões europeias constitui um dos mais graves défices democráticos que se registam na sociedade portuguesa. Défice que ainda é mais acentuado do que noutros países da União, devido ao facto dos portugueses nunca terem sido anteriormente chamados a pronunciar-se, especificamente, em relação ao processo de integração europeia e às opções fundamentais que foram sendo adoptadas.

4. Os portugueses, com o risco de permanecerem à margem de decisões fundamentais para o seu futuro e para o futuro do país, não podem continuar alheados da dimensão europeia dos seus problemas. E essa dimensão não pode ser confundida ou reduzida à questão da obtenção de fundos comunitários, por muito importante que ela seja, como é.

5. A necessidade do reforço da componente política da UE e do desenvolvimento de uma consciência europeia é tanto mais importante, quanto a ocupação do Iraque pôs a nu o inquietante unilateralismo dos círculos extremistas neoconservadores que comandam actualmente a administração norte-americana e a sua flagrante violação de princípios básicos do direito internacional. 6. A evolução para uma UE que se afirme como espaço de diversidade, defensora do direito internacional e da ONU, e que “respeitando os estados que a compõem”, como escreveu João Amaral, assuma “uma configuração jurídica federadora, na persecução de interesses comuns e de um interesse autónomo, que tem que ser reconhecido, que é o interesse europeu” representará sem dúvida uma importante evolução. Uma União Europeia distinta em relação aos “restantes blocos político-económicos (entendendo os Estados Unidos como um bloco) no plano ético-social, quer pelo nível elevado das suas políticas sociais e de protecção dos trabalhadores, contra as políticas desregulamentadoras e de cariz neo-liberal, quer pela defesa no plano internacional de regras de comércio justo, de combate à pobreza e de apoio ao desenvolvimento”.

7. A Renovação Comunista considera que o Governo e a Assembleia da República não podem invocar terem mandato dos portugueses sobre matérias fundamentais que constam do projecto de tratado que está a ser debatido a nível intergovernamental.

8. A Renovação Comunista entende, por isso, que a realização de um referendo nacional que apure a vontade democrática dos portugueses em relação à Constituição Europeia se apresenta como uma incontornável exigência democrática e de cidadania. E sustenta que a data mais natural para a sua realização deveria ser após a finalização da negociação intergovernamental em curso e antes da realização das eleições para o Parlamento Europeu, que é aliás uma das instituições consagradas na Constituição Europeia.

9. A respeito da efectiva realização do referendo, as posições do Governo e dos partidos com representação parlamentar, excepção feita em relação ao Bloco de Esquerda, têm cultivado uma ambiguidade e até uma duplicidade, que importa ser esclarecida. 10. Por parte do Governo, do PSD e do PP, é assumida a necessidade de realizar o referendo… desde que ele de facto não se realize. O PS, não se pronunciando formalmente contra, faz depender da finalização da Conferência Intergovernamental a ponderação da necessidade da sua realização. No que respeita ao PCP, este partido assume formalmente a sua realização, mas apresenta depois sucessivas condicionantes limitativas, que traduzem afinal a preocupação de não ter que se expor com uma posição abertamente contrária à integração europeia, que é ultra-minoritária entre os trabalhadores e a generalidade dos portugueses.

11. Além disso, algumas propostas de perguntas a inscrever no referendo que têm vindo a circular publicamente, iludem o debate que é indispensável fazer em relação ao próprio tratado ou têm-se mostrado redutoras, como é o caso das que foram adiantadas pelo Bloco de Esquerda.

12. Nestas circunstâncias a Renovação Comunista reclama de todos os partidos representados na Assembleia da República a afirmação clara e inequívoca de que aprovarão a realização do referendo nacional. O que deverá significar, também, que não serão utilizados quaisquer pretextos (como a fixação rígida da data) ou outras condicionantes, para impedirem de facto a sua concretização. E reclama igualmente dos partidos com assento parlamentar que utilizem a revisão constitucional que está em curso, para abrir a possibilidade de os portugueses referendarem os próprios tratados relativos à União Europeia, a começar pelo da Constituição Europeia, como irá aliás acontecer noutros países europeus.

13. A Renovação Comunista procederá, oportunamente, à entrega formal desta reclamação junto de todos os grupos parlamentares, e do Presidente da AR, e dará dela conhecimento ao Presidente da República e ao Governo.

14. O futuro da UE e dos seus vinte e cinco Estados está altamente dependente da redacção final que o tratado vier a ter: da consagração de uma definição mais clara dos fins e competências das instituições europeias; da efectiva incorporação no seu texto da Carta dos Direitos Fundamentais; da comunitarização dos pilares da política externa e da defesa e da segurança e justiça; de um acrescido papel dos parlamentos nacionais e do Parlamento europeu; de um maior equilíbrio (do que aquele que consta do projecto), entre o princípio da igualdade de todos os Estados e os seus diferentes pesos demográficos, sociais e políticos.

15. Em relação a este último aspecto, a Renovação Comunista sustenta abertamente a ideia da criação de uma segunda câmara europeia, um senado, com representação paritária de todos os Estados, e o abaixamento da fasquia de bloqueio nas deliberações do Conselho, em relação aos 40% propostos, de forma a defender e a valorizar a posição das pequenas e médias nações. Do mesmo modo que se afigura essencial ser mantida na Comissão a presença de um comissário de cada Estado com direito a voto.

16. A Renovação Comunista tem prosseguido um aprofundado debate sobre as questões de política europeia, nomeadamente as que dizem respeito à Constituição Europeia; tem desenvolvido contactos com outras correntes e individualidades de esquerda sobre a matéria; tem procurado acompanhar o debate que está em curso na esquerda europeia; e está empenhada na definição de uma linha comunista neste domínio, diferenciada da estreiteza de posições que têm caracterizado a direcção do PCP.

17. A Renovação Comunista tem vindo a examinar a possibilidade e tomará oportunamente decisões em relação à sua intervenção directa no referendo, ao abrigo do direito de participação e de propaganda reconhecidos aos movimentos de cidadãos eleitores. O que significará, se assim for decidido, a promoção de uma campanha política nacional em torno de uma plataforma política sobre as questões europeias a debater e a apresentar aos portugueses.

8 de Novembro de 2003

A Dinamizadora Nacional da Renovação Comunista

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