Robert C. Merton (nova-iorquino, 1944) dividiu, em 1997, o Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel (Nobel de Economia) com Myron Samuel Scholes (canadense, 1941). Seus trabalhos, em outros tempos, poderiam leva-los à fogueira, pois desenvolveram um modelo inédito para prever o futuro das aplicações financeiras, reduzir os riscos das especulações no mercado de títulos. Magia ou mandinga?
Yanis Varoufakis (O Minotauro Global - A verdadeira origem da crise financeira e o futuro da economia global, Editora Autonomia Literária, SP, 2016) assim comentou o feito da dupla: “quem dera o infeliz comitê do Nobel tivesse imaginado que, em alguns poucos meses, a elogiada “fórmula pioneira” causaria um desastre multibilionário espetacular, o colapso de um dos principais fundos de hedge (o infame LTCM, no qual Merton e Scholes tinham investido toda sua reputação) e, naturalmente, o resgate patrocinado pelos infalíveis e prestativos contribuintes norte-americanos”.
LTCM, Long-Term Capital Management fundada por John Meriwether, ex-vice-presidente do Salomon Brothers, aplicava colossais valores. O investimento mínimo era US$ 10 milhões, comprometidos pelo mínimo de três anos e com taxa de administração de 2% e mais 25% sobre os retornos do fundo de hedge. Até o Banco Central da Itália, que não aplicava em hedge, investiu US$ 100 milhões no LTCM. Em 1997, surpreendentemente, Meriwether decide retornar US$ 2,7 bilhões aos investidores originais (fundadores).
Com tudo se desfazendo no ar, o Federal Reserve Bank injeta US$ 3,6 bilhões e assume 90% do controle do empreendimento.
Voltamos a Varoufakis (obra citada): “a causa verdadeira da falência do LTCM, que foi um mero ensaio para a crise muito maior de 2008, foi extremamente simples: enormes investimentos que se baseavam na improvável hipótese de que alguém pode avaliar a probabilidade dos acontecimentos que o seu próprio modelo assume não só como improváveis, mas, de fato, como impossíveis de serem teorizados”.
E tem mais, os “fundos hedges” são compostos por derivativos, isto é, contratos que tem seu valor derivado de uma referência que pode ser um título financeiro, um índice, um bem real (matéria prima, metal, moeda, imóvel). Como se vê, são, na realidade, papeis sem lastro que os garantam. Um barril de petróleo gera mil barris ou mais em contratos. Solidez, zero; preditibilidade, previsibilidade de retorno, nula.
Quem são e qual a razão do prêmio aos “Nobel de Economia” de 2021?
David Card (canadense, 1956), com metade do prêmio de 10 milhões de coroas suecas (R$ 6,27 milhões), Joshua D. Angrist (israelo-americano, 1960) e Guido Imbens (holandês, 1963), todos sediados nos EUA e com estudos sobre o trabalho.
O ex-ministro de Dilma Rousseff, economista Marcelo Neri, escrevendo para o Estadão (página B4, 12/10/2021), ressalta os trabalhos sobre situações reais, “o Nobel de 2021 restabelece justiça dos reconhecimentos, senão vejamos: em 2019, o Nobel foi para (Abhijit) Banerjee, (sua esposa, Esther) Duflo e (Michael) Kremer, uma geração mais nova, pela aplicação de experimentos aleatórios em economia cujo objetivo também é possibilitar inferências de causa e efeito. O ponto comum é fazer a comparação entre grupos de tratamento e de controle, só que nos experimentos naturais estamos fora de condições ideais. Isto é, ao invés de criar um experimento aleatório onde dois grupos são escolhidos por sorteio de forma a garantir a perfeita simetria das comparações, lança-se mão de situações já observadas no mundo real”.
Card analisou os efeitos do salário mínimo, da imigração e da educação no mercado de trabalho. Ele havia contestado a ideia, comum nos anos 1990, que o aumento do salário mínimo causaria alta no desemprego. Angrist e Imbens desenvolveram metodologias para validar e interpretar as conclusões de estudos já realizados.
Todos sabemos o caráter político dos prêmios Nobel. Um Nobel de literatura em 2015, alertou para o interesse da OTAN em desestabilizar a Bielorrússia, atingindo assim a Rússia. Hoje encontra-se em plena execução. Nobel da Paz tem tanto significado político que contemplou, preventivamente, Barack Obama, como um incentivo para promover novas guerras, pois Bill Clinton não beneficiara suficientemente a indústria bélica estadunidense. A não eleição da senhora Clinton pode ter sido uma consequência daquele “erro” do ex-presidente.
Os vencedores de 1997 cuidaram de dar “solidez” aos derivativos, que haviam ficado questionáveis com as quatro crises até então desencadeadas nos anos 1990 (bolha imobiliária japonesa, Sistema Monetário Europeu, México e Gigantes Asiáticos). A década concluiria com mais duas: na Rússia (1998) e no Brasil (1999).
No momento em que o desemprego assombra o mundo ocidental, as legislações tratam de excluir direitos e vantagens para os trabalhadores assalariados, que são substituídos pelos “empreendedores individuais”, sem assistência nem previdência com recursos patronais, o que espera o sistema financeiro dominante com estes Nobel de Economia?
Não faz muito tempo, um Nobel de Medicina transformou-se em garoto propaganda da vitamina C, carro chefe de laboratório farmacêutico.
Com o trabalho já precário, a automação transformando atividades, as finanças exigindo apenas as transferências de rendas dos Estados e isenções tributárias, o futuro da produção e do trabalho não nos aparenta muito exitoso. Os premiados reforçam as piores expectativas.
Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.
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