Quando a questão se transforma em interesse

Por Ricardo Mohrez Muvdi*
 
Muitos descendentes de palestinos — filhos e netos daqueles que foram arrancados de suas terras pela ocupação — proclamam sua lealdade e defesa da causa palestina. No entanto, essa lealdade muitas vezes se esvai quando a questão entra em conflito com seus interesses pessoais, econômicos ou políticos. A memória histórica torna-se então mera decoração, usada quando conveniente e relegada a segundo plano quando se torna confusa.
 
A diferença com o sionismo é gritante. Os sionistas, independentemente do custo humano ou da verdade histórica, não hesitam um instante em apoiar a entidade criminosa "Israel". Fazem-no com cegueira ideológica, disciplina e coerência que beiram a cumplicidade. Em contraste, alguns descendentes de palestinos preferem o silêncio, a acomodação ou mesmo a justificação do carrasco quando sentem que seus interesses ou privilégios estão ameaçados.
 
A causa palestina não é um slogan nas redes sociais, nem um símbolo cultural vazio exibido em uma foto posando com um keffiyeh. A causa é a resistência, a dignidade, a justiça e a memória de um povo que continua sendo massacrado, despojado e silenciado. Não aceitamos padrões duplos nem o silêncio de covardes.
 
O sionismo percebeu que sua força reside na unidade inquebrável, mesmo que seja uma unidade no crime. Quanto à Palestina, ela precisa que seus filhos e netos correspondam aos sacrifícios de seus antepassados e pais. A questão não é viver na nostalgia, mas sim manter a coerência: estar sempre com a Palestina, mesmo que isso nos custe décadas, amizades ou benefícios políticos.
 
A verdadeira lealdade não se mede quando defender a Palestina é fácil, mas quando se torna custoso. Essa é a diferença entre aqueles que fazem da causa uma bandeira da vida e aqueles que a transformam em um acessório passageiro.
 
Porque a Palestina não é uma moda nem uma memória: é uma ferida aberta que exige dignidade e ação permanente.

Ricardo Mohrez Muvdi* é palestino, nascido em Beir-Jala, Palestina (1952). Refugiado na Colômbia, é administrador de empresas e presidente da União Palestina da América Latina (UPAL).
 
 
 

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Author`s name Amyra El Khalili