Edward Snowden, Julian Assange e Glenn Greenwald, heróis ou pop puppets?

Fernando Soares Campos

Assim como se faz arte pela arte, e adquire-se conhecimento pelo conhecimento, e acumula-se fortuna pela fortuna, hoje se busca, cada vez com maior empenho e aperfeiçoamento, o poder pelo poder, e pratica-se o terror pelo terror, e declara-se a guerra pela guerra.

 

A espionagem passou a ter um fim em si mesma, e as agências de inteligência tornaram-se empresas altamente rentáveis, cujos produtos, mão de obra e serviços são ofertados para atender à demanda gerada pelo terrorismo de estado e às guerras autotélicas.

 

Os "vazamentos" feitos por Edward Snowden, "ex-funcionário" subcontratado da CIA através de empresa de terceirização de mão de obra e serviços, a Booz Allen Hamilton, não alteram a imagem que temos dos seus antigos contratantes, pois já faz muito tempo que soubemos que eram o que são: colonialistas, escravagistas, exploradores, aventureiros, corruptores, armamentistas, belicistas e imperialistas - hoje até podemos admitir mais uma degradante qualificação: terroristas.

 

Tais "documentos vazados" têm servido para criar o caos no mundo da diplomacia, uma providencial perturbação que só "beneficia" a quem não tem habilidade para relações diplomáticas (o "Fuck" União Europeia, de Victoria Nuland para o embaixador Geoffrey Pyatt, demonstra esse estado), a quem sempre "conquistou" aliados através da demonstração da força bélica, ou corrompendo valores morais e culturais. É gente que atualmente dissemina o terror para vender instrumentos e métodos de segurança, o que também não é uma prática recentemente arquitetada e implementada, nem revela qualquer originalidade, pois criar dificuldades para vender facilidades sempre foi o lema de opressores nas mais variadas atividades humanas - sistemas públicos de educação, saúde e segurança são intencionalmente desmantelados para gerar alternativas nos setores privados. (Um pouco mais de esclarecimento sobre essa questão pode vir da leitura do artigo "Snowden! A bomba!")

 

Concordo com aqueles que afirmam que Edward Snowden e Julian Assange (Wikileaks) não revelaram nada que muita gente mundo afora não soubesse, principalmente as pessoas diretamente relacionadas com órgãos de inteligência de qualquer país, ou pesquisadores e curiosos interessados no assunto.

 

No artigo-reportagem "Revelações de Edward Snowden - Geopolítica e lições a aprender (I)", o autor afirma: "Muitos creem que Edward Snowden não teria revelado nada que já não se soubesse, ou do que já não se desconfiasse há muito tempo. Mas o que chama a atenção é a escala da invasão, que deixa boquiabertos até os especialistas profissionais."

 

Subtende-se, portanto, que o autor também concorda que as denúncias do ex-funcionário subcontratado para monitoramento de espionagem da CIA (um dos tentáculos da NSA, a Agência de Segurança Nacional dos EUA) realmente não revelaram novidades, atos praticados e até então desconhecidos, mas apenas surpreenderam pela magnitude das operações, a abrangência de alvos e a difusividade de interesses; surpresa essa que só se justifica porque as vias internáuticas, as comunicações no chamado mundo virtual, ainda surpreendem por si mesmas, visto que sua existência não foi conscientemente assimilada e naturalizada por seus próprios usuários (não confundir "naturalizar" com "viciar").

 

Entretanto, um dos fatos que parece ter causado mais estarrecimento foi o de que os sistemas de espionagem têm características de Big Brother, do gênero "1984", de George Orwell, visto que espionam inclusive as pessoas comuns, com a colaboração de empresas tais como Microsoft, Yahoo!, Google, Facebook, AOL, Skype, YouTube, Apple, PalTalk... Porém, em muitos casos, esse "estarrecimento" pode ser interpretado como "regozijo", contentamento disfarçado de contrariedade. Pessoas que se sentem inferiorizadas, complexadas, carentes de atenção e reconhecimento, se sentiriam extremamente prestigiadas, caso fossem identificadas como alguém que despertou o interesse das hollywoodianas agências de inteligência, e "protestariam veementes", a fim de que todos soubessem que foram alvos delas.

 

Depois de muitas décadas, o cinema finalmente faz a vida imitar a arte em todo o seu ilusório esplendor. Hoje qualquer anônimo em qualquer parte do mundo pode se sentir tão importante quanto O Satânico Dr. No e parodiar Bond, James Bond, dizendo: "Meu nome é Mané, Zé Mané".

 

Espionar pessoas comuns é prática antiga. Sempre grampearam as telecomunicações, há muitos anos espionam as correspondências via correios e telégrafos. Desenvolveram técnicas para abrir e fechar cartas sem deixar marcas de violação.

 

Em épocas de intensos conflitos bélicos (como hoje em dia) funcionários dos correios e telégrafos eram treinados para identificar correspondências e decodificar mensagens telegráficas suspeitas. Os indícios que despertariam as suspeições eram fundamentalmente estabelecidos pelas origens e destinos, assim como em função das personalidades envolvidas, atentando-se para alguns detalhes subjetivos, como a frequência na troca de correspondência entre os mesmos elementos.

 

Pessoas comuns podem ser alvo de espionagem (ou simples monitoramento) por interesses diversos, mas, hoje, geralmente o são em função do controle e manipulação de dados pessoais que possam servir de base para estratégias de marketing e propaganda comercial (esta notícia extraída do site CUBADEBATE indica o quanto estão avançando neste sentido: Televisores inteligentes "espían" en los hogares).

 

As revelações de Snowden incluem espionagem com grampos telefônicos e vigilância de atividades online, sem autorização judicial, com a colaboração dos gigantes da informática. Entretanto esses meios empregados e a legislação que ampara as operações ("USA Patriot Act", uma lei de 2001, que recebeu posteriores adições) também já eram de conhecimento público muito antes dos tais vazamentos.

 

Atualmente qualquer pessoa pode ser envolvida em operações de espionagem, por mera suspeita ou acidentalmente, e sofrer consequências angustiantes, visto que o monitoramento através da rede mundial de computadores é feito por programas e sistemas robôs (atentemos para este detalhe, isso aí pode nos esclarecer mais que os tais "vazamentos" de Wikileaks e de Snowden).

 

Observemos como funciona o sistema de monitoramento a partir de uma das muitas centrais de interceptação de mensagens espalhadas pelo mundo:

 

A cerca de 2,5 mil quilômetros do Recife (PE), numa região inóspita do Atlântico Sul, existe uma pequena ilha de colonização britânica chamada Ascensão. É lá que os agentes de Barack Obama captam aproximadamente dois milhões de mensagens por hora. São basicamente conversas telefônicas, troca de e-mails e posts em redes sociais. 

 

As antenas da ilha de Ascensão conseguem captar as mensagens logo depois de serem produzidas, antes mesmo que elas cheguem aos satélites para serem distribuídas. Uma vez recolhidas, as informações são lançadas em um gigantesco computador instalado no Fort Meade, em Maryland, nos EUA. Lá, são processadas em um programa chamado Prism (Prisma), que localiza, por intermédio de palavras-chaves, aquilo que os bisbilhoteiros procuram, entre os milhões de dados recebidos por hora. A partir daí as informações são submetidas a um outro programa, que quebra a criptografia. Ainda em Maryland, computadores traduzem as informações coletadas. Feita a análise, o que for de interesse do governo americano será distribuído aos agentes espalhados por todo o mundo para continuar o serviço de monitoramento. Muitas vezes empresas americanas ligadas à telefonia e à internet são acionadas para informações complementares. Com acesso à rede, por um técnico autorizado, é possível captar todo o tráfego de dados, sejam arquivos de vídeo, sejam fotos, trocas de mensagens ou chamadas de voz sobre IP. ["Como eles Espionam" - ISTOÉ Independente]

 

Quer dizer: só precisaram sofisticar os instrumentos de espionagem, em função das novas tecnologias de comunicação interpessoal (principalmente o celular e o computador conectado à internet), mas tudo isso tem as mesmas características dos métodos antigos.

 

Niilismo e uma nova era

 

Por que nas últimas décadas do século passado falavam tanto sobre o fim de tanta coisa, como, por exemplo, o fim da História, o fim das ideologias, o fim das religiões, o fim do emprego e até o fim do mundo? Certamente porque o simbolismo da entrada do novo milênio era bastante apropriado para se estabelecer o início de uma "nova era".

 

Mas... a quem interessa um "novo mundo" a partir de uma virtual hecatombe global da esperança? Quem quer mesmo o aniquilamento de práticas religiosas (progressistas ou conservadoras, se forem evangelizadoras; mantendo-se apenas um arremedo de "religião mercantilista")? Quais os interesses de quem decreta o fracasso de experiências sociais que, na verdade, vêm mesmo é gradativamente se aperfeiçoando? Que "novideologia" é essa que nega a autenticidade de conceitos ideológicos formulados através do debate filosófico ao longo dos séculos?

 

Provavelmente tudo isso interessa a quem manipula a verdade dos fatos históricos e a realidade contemporânea, a fim de manter o domínio sobre os destinos da Humanidade.

 

E como fazê-lo?

 

Certamente os mais eficientes instrumentos são as mídias de massa (mass media).

 

Organizações oligopolizadas controlam as tecnologias mais populares, manipulam a informação criando para o seu público ilusórias visões da realidade; massificam o pensamento único em função do individualismo: o perigo mora ao lado, o inferno são os outros, dormindo com o inimigo, entre a cruz e a espada, salve-se quem puder, primeiro eu, depois eu, em seguida eu... Não é propriamente o egoísmo sendo revelado como sentimento dominante na natureza humana, mas sim o terror obrigando o indivíduo a manifestá-lo com maior intensidade do que os sentimentos nobres, que, por sua vez, passam a ser considerados atitudes ingênuas, próprias dos parvos.

 

Nessa inversão de valores, existem aqueles que, em raras ocasiões, praticam o altruísmo, a abnegação, o desapego, a renúncia, o sacrifico voluntário... mas tratam de justificar suas atitudes, como se estivessem se desculpando por terem cometido deslizes: "Não me segurei, aquilo amoleceu meu coração!", "Nem sei por que estou lhe dando uma segunda chance...", "Pegue logo, antes que eu me arrependa!", "Perdoo, mas não esqueço!" (querendo dizer que a mágoa permanece latente),

 

Espiões, a fama pela incompetência

 

No final dos anos 1980 eu trabalhava para uma indústria do setor químico, produtora de revestimento anticorrosivo (tintas industriais). Participei de um encontro de funcionários da empresa em um hotel em Águas de Londóia, interior do Estado de São Paulo. Conversando com um jovem técnico que atuava no departamento de pesquisa e desenvolvimento de produtos, ele me perguntou: "Por que hoje não surgem mais inventores como antigamente?" - aí citou alguns exemplos de inventos e inventores consagrados tempos atrás.

 

Naquele exato momento não tive uma resposta satisfatória, e, como sempre me aconteceu em outras ocasiões, aquilo ficou me incomodando, passei a ser mais um entre milhões de pessoas que devem estar fazendo essa pergunta.

 

A partir daquele questionamento, comecei a observar que megaempresas dos setores eletroeletrônico e automotivo fazem pré-lançamento de seus novos produtos através de matérias jornalísticas (merchandising), anunciando aperfeiçoamentos tecnológicos, descobertas e inventos, mas sempre atribuindo o mérito das criações aos seus laboratórios de pesquisa, ou ao seu quadro de engenharia, nunca destacando possíveis responsáveis diretos pela criação de novos engenhos.

 

Nos últimos tempos, somente os criadores de alguns produtos de Tecnologia da Informática tiveram seus nomes consagrados como autores dos inventos: Henry Edward Roberts, criador do primeiro microcomputador (PC), Tim Berners-Lee, criador da internet, Mark Zuckerberg, criador do Facebook (junto com alguns colegas menos expressivos), entre outros inventores na área de TI.

 

Lembrei-me de alguns agentes de espionagem, aqueles que se tornaram famosos enquanto ainda atuavam, os espiões que entraram numa fria, pois, na vida real, espião que vira celebridade demonstra, ao contrário de inventores, incompetência profissional.

 

Mata Hari (Margaretha Gertruida Zelle): Contratada pelos alemães durante a Primeira Guerra Mundial, foi capturada pelo inimigo e trabalhou como agente duplo, encerrando sua carreira em frente a um pelotão de fuzilamento.

 

Harold Worden: EUA, espionagem industrial, trabalhou durante 30 anos para Kodak, aposentou-se e criou uma firma de consultoria, empresa de fachada, que na verdade servia apenas para vender informações sobre processos industriais da Kodak. Detido e processado, não se pôde comprovar sua atuação como espião, mas, em 1997, foi julgado e condenado por outros delitos.

 

Julius e Ethel Rosenberg: EUA, atuaram em período da Guerra Fria (pós-Segunda Guerra Mundial), forneceram aos russos (à União Soviética) segredos militares, informações sobre armas nucleares. Foram presos em 1950 e executados na cadeira elétrica em 1953. ["O McCarthyismo  não passou de fascismo em embrião, embora, com a execução do casal Rosenberg, já estivéssemos desgraçadamente próximos do fascismo." [Norman Pollack, Counterpunch, em EUA: interpenetração "business"- estado, capital monopolista e industrialismo avançado]

 

Espião competente termina sua carreira, aposenta-se e curte o resto da vida em paradisíaca ilha caribenha ou polinésia, anônimo.

 

Emancipação do indivíduo e terceirização de mão de obra e serviços

 

Nos primeiros momentos da popularização da Rede Mundial de Computadores, a Web, que tem como base a Internet, muito se falava (e ainda se insiste em afirmar) que o emprego formal estaria em extinção, que a tendência seria o empreendedorismo, a implementação de projetos individuais de geração de renda por produtividade, comissão, contrato temporário, consultoria, freelancer etc.; o autoemprego, o indivíduo como agente do seu próprio negócio, autônomo, profissional liberal, nas mais diversas atividades, desde engenheiros e técnicos a torneiros mecânicos, pintores, polidores e tantos outros menos qualificados. Tudo isso baseado no avanço das novas tecnologias da informática e robotização das linhas de produção.

 

Viver sem patrão, sem a monótona rotina de trabalho sob autoritárias chefias, também sem o caos estressante dos congestionamentos de trânsito ou as filas e superlotação dos transportes coletivos, talvez seja isso que chamam de "emancipação do indivíduo"; entretanto, já podemos observar que essa promessa não passa de um "salve-se quem puder".

 

Agentes e subagentes de espionagem sempre puderam ser encontrados em qualquer latitude (elementos estrangeiros titulares de cargos em suas agências, ou terceirizados, subcontratados, como ocorre hoje em dia) e sempre contaram com ajuda de informantes remunerados à base de propina.

 

O que o fim da História, o fim das ideologias, o fim das religiões, o fim do emprego e até o fim do mundo têm a ver com o aparente recrudescimento da prática de espionagem?

 

A questão é que tudo isso está relacionado com o declínio do capitalismo e a crise econômica mundial, que revela o fracasso do modelo neoliberal, com a priorização e incremento da prática do rentismo, agiotagem e investimentos especulativos em geral. Tudo isso provocou, em alguns países do chamado Primeiro Mundo, um extremo desequilíbrio nos setores básicos da economia: primário, secundário e terciário.

 

Nesses países os setores primário (atividades agrícolas, pecuárias e extrativistas) e secundário (indústria de transformação) foram relegados a plano inferior, negligenciados pelos órgãos de planejamento e desenvolvimento, os quais dedicaram todo empenho em estruturar uma sociedade fundada nas atividades econômicas próprias do setor terciário: comércio, educação, saúde, segurança, telecomunicações, turismo, serviços de informática, transporte, limpeza, alimentação, serviços bancários, administrativos etc. 

 

Vejamos esse depoimento:

 

Ao contrário do setor manufatureiro, o capital financeiro não necessita de uma população de trabalhadores educados, saudáveis e produtivos. A sua própria "força de trabalho" é composta de uma pequena elite educada de especuladores, analistas, traders e corretores nos níveis de topo e médios e de um pequeno exército de varredores de escritório contratados, secretárias e trabalhadores subalternos na base. Eles têm o seu próprio exército "invisível" de servidores domésticos, cozinheiros, fornecedores de comida, jardineiros e governantes privados de qualquer "Segurança Social", cobertura de saúde e planos de pensão. E o setor financeiro tem as suas próprias redes de médicos e clínicas, escolas, sistemas de comunicações e mensageiros, propriedades e clubes, agências de segurança e guardas pessoais; ele não necessita um sector público educado e qualificado; e certamente não quer que a riqueza nacional apoie sistemas públicos de alta qualidade em saúde e educação. Ele não tem interesse em apoiar estas instituições públicas de massa que considera como um obstáculo para "libertar" vastas quantias de riqueza pública para a especulação. Por outras palavras, o setor dominante do capital não tem objeções ao "Homeland Security"[Ministério da Segurança Interna]; na verdade partilha muitos sentimentos com os proponentes do estado policial e apoia a contração do estado de bem-estar social. Ele está preocupado é com a redução de impostos sobre o capital financeiro e o aumento dos fundos de salvamento federais para a Wall Street enquanto controla a cidadania empobrecida." (James Petras, em A Grande Transformação dos EUA: "De Estado-Previdência em Estado-Policial-Imperial".)

 

Depois dessa longa digressão nos últimos parágrafos, volto a lembrar a questão da robotização dos meios de produção ("...o monitoramento através da rede mundial de computadores é feito por programas e sistemas robôs").

 

[Acabei de receber release do Portal Comunique-se com o seguinte título em destaque: JORNALISMO SEM JORNALISTA Robôs já escrevem artigos, revela pesquisa.]

 

O buraco negro é mais em cima

 

Enquanto o mundo indigna-se e discute a questão da invasão de privacidade e a sofisticação dos métodos empregados, trava-se, nos EUA, outro debate, talvez o que mais interessa ao povo estadunidense e do qual pode aflorar melhor entendimento sobre o desenrolar dos fatos. Trata-se da análise e contestações sobre a influência e os custos das empresas privadas nos sistemas de segurança nacional, as quais ficam com cerca de 70% dos US$ 52 bilhões do orçamento nacional destinado aos serviços secretos, deixando apenas 30% para cobrir as despesas dos efetivos da administração direta do Estado. A exagerada desproporção torna-se mais evidente quando se observa que o setor privado fornece apenas cerca de 30% do pessoal (os subcontratados), enquanto 70% trabalham sob regime de administração direta.

 

Oficiais superiores das Forças Armadas dos EUA e civis que ocuparam cargos no primeiro escalão do governo daquele país são hoje diretores executivos de grandes empresas privadas de segurança, formam e realizam fortíssimos lobbies que influenciam congressistas, ministros e governantes, também exercem poder junto a empresas midiáticas (presstitutes, como hoje são camadas), de tal forma que são atendidos em quase tudo que propõem: criação de novas agências e legislações específicas (em alguns casos, inconstitucionais), determinam público alvo e inimigos em potencial, trabalham para a iniciativa privada (bancos, petroleiras, e corporações com interesses diversos) fazendo tráfico de influencia e usando todo o poder que detêm no âmbito do Estado, inclusive informações de inteligência ultrassecreta: "A marinha dos Estados Unidos escolheu, no mês passado [junho/2013], a mesma companhia como parte de um consórcio para trabalhar em outro projeto multimilionário para uma "nova geração de operações de inteligência, vigilância e combate". A Booz Allen obteve esses contratos de várias formas. Além de seus vínculos com o DNI (Diretor de Inteligência Nacional), se orgulha do fato de metade de seus 25 mil empregados estarem autorizados a acessar informação de inteligência ultrassecreta. Um terço dos 1,4 milhão de pessoas com essa autorização trabalha no setor privado."

 

Ainda sobre A Grande Transformação dos EUA: "De Estado-Previdência em Estado-Policial-Imperial, diz James Petras:

 

"Não houve virtualmente qualquer oposição dos trabalhadores: a conversão gradual dos sindicatos dos EUA em organizações altamente autoritárias dirigidas por "líderes" milionários que se auto-perpetuavam e a redução do número de sindicalizados dos 30% da força de trabalho em 1950 para menos de 11% em 2012 (com mais de 91% dos trabalhadores do setor privado sem qualquer representação sindical) significou que os trabalhadores americanos ficaram com menos poderes para organizar greves a fim de proteger seus empregos, muito menos para aplicar pressão política em defesa de programas públicos e do bem-estar."

 

Snowden sempre foi contra investimentos públicos no Sistema de Segurança Social e ardoroso defensor do Sistema de Segurança Nacional.

 

Em janeiro de 2009 , no site Ars Technica, usando o antigo nome de usuário, "TheTrueHOOHA", Snowden criticou The New York Times e as suas fontes anônimas por expor uma operação secreta da administração Bush para sabotar as capacidades nucleares iranianas. Tais violações, para ele irritantes, haviam ocorrido "uma e outra e outra vez", reclamou Snowden. The Times, disse ele, era "como Wikileaks" e merecia ir à falência; fontes que vazaram "merda classificada" para o Times deveriam tomar "um tiro nas bolas".

 

Quando um interlocutor em linha sugeriu que poderia ser "ético " denunciar "intriga do governo", Snowden respondeu enfaticamente: "Violar segurança nacional? Não".

 

Quanto à Segurança Social, ele disse coisas assim: "Quase todo mundo era antes de 1900 trabalhadores por conta própria".

 

Em outra troca de sala de bate-papo, Snowden debateu os problemas da Segurança Social fazendo afirmações como estas:

 

"Economizar dinheiro? Corta essa merda de segurança social."

"Yeah! Foda-se as pessoas de idade!"

"segurança social é uma treta"

"vamos atirar idosos na rua"

"cheiram engraçado"

"De alguma forma, a nossa sociedade conseguiu existir centenas de anos sem segurança social"

"Malditos retardados"

(Informação coletadas em "Será que você sentiria de forma diferente sobre Snowden, Greenwald e Assange se você soubesse o que eles realmente pensam?", em inglês)

 

O que podemos deduzir de tudo isso?

 

Que a celeuma criada em torno da invasão de privacidade dos cidadãos comuns tornou-se matéria mainstream, corrente em voga para desviar a atenção sobre a verdadeira questão: a desavença entre os que ficam de fora ou comem pelas beiras e os que abocanham as maiores fatias do bolo: os bilhões de dólares destinados ao Sistema de Segurança.

 

Na Sociedade de Serviços e Estado Policial em que se tornaram os Estados Unidos da América, a terceirização e subcontratação dos postos de trabalho, tanto nos setores privados quanto no setor público, geraram a criação de milhares de micro, pequenas, médias e grandes empresas fornecedoras de mão de obra e serviços. Num ambiente desses, os tubarões se fartam, e os peixes pequenos ou lhes servem de alimento ou sobrevivem em orgia simbiótica.

 

Edward Snowden, Julian Assange e Glenn Greenwald são heróis ou pop puppets de um puppet government? Eles "estouraram no norte" e brilham no sul.

 

Colocar Snowden, Assange e Greenwald no mesmo saco de todos os acusados de vazamento de "ciberdocumentos" e denúncias contra o governo e empresas dos Estados Unidos e seus parceiros mais graduados é fazer o jogo do "todos são iguais" ou que "todos têm a mesma intenção".

 

Por que a CIA e a NSA não divulgam (deixam vazar) informações detalhadas sobre as atuações de Snowden no período em que colaborou para eles? Certamente isso o desqualificaria da condição de herói. Mas, nesse caso, sobraria para ele a desconfiança geral de que fora obrigado (chantageado) a fazer os tais "vazamentos", a fim de beneficiar algum grupo em detrimento de outro. Sejam grupos dentro da própria esfera privada (empresa contra empresa) ou entre o setor privado e os quadros da administração direta do Estado.

 

A única atuação de Snowden como "espião em campo" ocorreu no período como "olheiro" numa universidade. Em vista do silêncio em torno de suas atividades, não sabemos das consequências desse seu "estágio" entre os estudantes: se alguém foi preso, interrogado, perseguido, torturado, desaparecido ou executado. Quaisquer que tenham sido suas tarefas, elas são inconfessáveis. Mesmo assim, virou herói "sem passado".

 

E existe quem defenda essa condição:

 

"Snowden, um administrador de sistemas do Centro de Operações de Ameaças da NSA no Havaí, trabalhou para a CIA e para a companhia de serviços de informática Dell antes de se unir à Booz Allen. Mas o papel obscuro que pode ter desempenhado fica branco [!] ao lado do que outros tiveram. (Pratap Chatterjee, da IPS/Envolverde, em "Como a segurança dos EUA ficou a cargo de uma empresa privada.")

 

Isso rende muito mais o que pensar do que simplesmente discutir a questão da megaescala de invasão de privacidade. 

 

Fernando Soares Campos

 

 

 

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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