A síndroma de bin Laden

É interessante observar que com tantos eventos importantes a acontecerem pelo mundo fora, a imprensa internacional possa atribuir o estatuto de destaque a um mero boato acerca de bin Laden.


É interessante que Usama bin Laden, vivo ou morto, conseguiu dar ao mundo uma lição brilhante em marketing pessoal, porque tem todos os órgãos da média prontos a atirar para o lixo a página principal, talhado com tanto amor e dedicação durante as últimas 24 horas, e colocar no seu lugar qualquer parágrafo acerca de um documento qualquer que apareceu num jornal qualquer algures na província francesa, que dizia que afinal o bilionário bin Laden morreu vítima de febre de carraça, tifo, ou quê.


Enquanto admitimos que um boato não é notícia, qualquer jornal que não publique a história “Bin Laden está morto” está a pedir sarilhos porque irá perder na corrida aos “hits” com todos a googlar ou hotbotar ou a pedir ao Jeeves informações acerca do homem mais procurado – e elusivo – no mundo. Não importa que ele tenha morrido já há dois anos ou três. Ou mais.


Depois de cinco longos anos, o bin Laden aparece como uma figura quixotesca, quimera na imaginação colectiva, herói para alguns, anti-herói para outros, mas para todos, o que executou o ataque terrorista que mais êxito teve na história, e autor de um evento que mudou o mundo. Em termos operacionais, foi brilhante. Em termos humanos, foi terrível.


A História irá julgá-lo como o David que bateu no Golias, ou como o monstro assassino que massacrou civis inocentes mas permanecerá sempre como fonte de notícias porque tem todos os elementos que lhe proporcionam o factor bin Laden – é apelativo para os consumidores de notícias.


A síndroma de bin Laden é a obsessão com esse tipo de notícias – a alta de adrenalina – o choque e pavor ao abrir o jornal e ver cifras cada vez maiores acerca de tragédias, ameaças, fotografias graficamente explícitas com títulos do tipo Rios de Sangue, a manipulação do medo, que mantém as pessoas nos seus lugares e que garante que aceitem o seu status quo enquanto são varridos as suas liberdades e direitos pelos quais lutaram durante séculos.


A síndroma de bin Laden viu numerosos Governos a apoiarem o pior ataque de sempre contra a lei internacional, o desrespeito pela ONU, a quebra da sua Carta, o massacre de civis, a violação de direitos humanos, da Convenção de Genebra e muitos outros princípios básicos que procuramos assegurar no meio de séculos de erros.


A síndroma de bin Laden em como sintomas a falta de visão, a ausência de coragem demonstrado pelo indivíduo, a ausência de uma vontade para lutar por aquilo que está certo, contra a usurpação dos seus direitos, a coragem de lutar por si. Como qualquer drogado condenado, esse indivíduo acorda de manhã (temendo a segurança do seu posto de trabalho, aceitando trabalhar mais horas por causa da concorrência e senão… e cuja mulher acabou de ser despedida com justa causa por ter ficado grávida e exercer seus direitos), liga a televisão e recebe a primeira alta de adrenalina.

 Satisfeito, ainda com um zumbir nos ouvidos devido ao batido dos tambores que acompanha as notícias actualmente, anda como morto-vivo para o trabalho e seus medos são reforçados com um orgasmo colectivo de histórias de tragédias ou então um jorrar de idiotice a falar do futebol e das ameaças que dirigente X fez ao dirigente Y.


Quem entrou burro, sai estúpido e quem entrou com limitações intelectuais, sai idiota.


Que o Brasil está a fabricar quantidades industriais de bio-diesel com enormes vantagens para o ambiente e para a economia, pouco interessa quando há histórias do tipo “Padre Pedófilo Pederasta”, um PPP de disparates. Não é notícia – é uma tragédia para as vítimas, ou mais provavelmente, os vítimas. A história “Menina-escrava em prisão subterrânea” (repleta de inuendos, com a única palavra não escrita, “sexual” subentendida e tão esperada) não apela à fantasia e à imaginação tanto quanto “Menina cega recebe diploma”, “Menina cega volta a ver”, ou então “Irão descobre a cura para a SIDA”, uma história com implicações enormes, impressa nas páginas da PRAVDA.Ru mas ignorado no resto da imprensa internacional porque afinal, o Ahmadinejad tem barba e por isso, deve ser mentiroso.


É tempo para as pessoas derrotarem o sindroma de bin Laden e voltarem a viver as suas vidas, tomando as rédeas da sua própria existência nas suas mãos, indo ao encontro daquilo que importa e deixando para lá a alta de adrenalina que tentam vender-nos – uma maneira desnecessariamente tensa de iniciar cada dia da nossa vida.

Timothy BANCROFT-HINCHEY
PRAVDA.Ru

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey