PCB: 101 anos da Fênix vermelha

Milton Pinheiro[1]

 O sentido político da atual quadra histórica é marcado pela ideologia do anticomunismo. Agências políticas da extrema direita (partidos do balcão de negócios), canais organizados para divulgar fake News, mídia corporativa, igrejas neopentecostais do comércio da fé, ONGs e agrupamentos golpistas, etc., são instrumentos de ação cotidiana para criminalizar e mentir sobre as ideias e práticas daqueles que lutam em defesa da classe trabalhadora e da emancipação humana.

O Partido Comunista Brasileiro (PCB) completa 101 anos de uma presença indelével na história política do Brasil. Desta longeva existência, 56 anos foram na mais violenta clandestinidade e grande parte do período de legalidade ocorre após 1985, quando do fim da ditadura burgo-militar de 1964. 

O PCB surgiu para representar um projeto de classe e lutar pelo programa da revolução brasileira. A inspiração primeira, foi a vitória da revolução russa de 1917 que representou o poder dos trabalhadores organizados em defesa das transformações estruturais e da humanidade. 

Os comunistas foram os revolucionários que deram sentido às greves do começo do século XX, que marcharam pelas ruas com manifestações em defesa dos direitos mais emblemáticos da classe trabalhadora, procurando se organizar para construir um operador político que daria sentido ao processo emancipatório. 

Século XX

O partido, no desenrolar do século XX, esteve presente nas lutas mais profundas desse breve século. Participou da organização dos instrumentos que agiram na luta de classes. Mesmo com o “estado de sítio”, que afrontava a democracia na década de 1920, foi criada uma combativa Imprensa Popular. Na década de 1930 esteve presente nas lutas proletárias e populares, mas também teve uma presença relevante nos quartéis das forças armadas. 

Com essa forte presença entre os militares, realizou o mais importante movimento de “assalto aos céus” da história brasileira: o levante antifascista e revolucionário de novembro de 1935, uma experiência de Poder Popular que durou quatro dias em Natal (RN); ocorrendo também em Recife e no Rio de Janeiro.  

Essa experiência revolucionária foi derrotada por tropas do Estado burguês, em aliança com coronéis locais e seus jagunços. Porém, mesmo com os erros desse processo, essa experiência foi uma brava resistência política contra o Estado burguês que apontou uma perspectiva de esperança social e autonomia política da classe operária.

Repressão

Após a brutal repressão que se seguiu ao levante, em virtude da perseguição do “Estado Novo”, o PCB organizou lutas de resistência contra o fascismo no Brasil e quando os ventos da derrota nazifascista, na segunda grande guerra percorreram o horizonte dos povos, o partido conseguiu encontrar a luz no fim do túnel. 

O PCB se tornou, com a legalidade, um partido de massas. Elegeu Luiz Carlos Prestes o senador mais bem votado do Brasil, assim como uma vigorosa bancada com 14 deputados federais. Nas eleições seguintes, para as Assembleias Legislativas dos estados em 1947, elegeu 46 deputados e mais dois deputados federais. Todavia, a ação do reacionarismo se impôs novamente e o partido foi colocado na ilegalidade. O registro do partido foi cassado e depois os mandatos dos parlamentares federais e estaduais.

Forte operador político

O partido voltou para à clandestinidade, todavia, agora, como um forte operador político da classe trabalhadora. Esteve na greve dos 300 mil em São Paulo, na Campanha do Petróleo é Nosso, marcou a luta pela reforma agrária de forma revolucionária através dos levantes camponeses de Porecatu, Trombas e Formoso. Organizou manifestações contra a presença de tropas brasileiras na guerra imperialista da Coréia, esteve onde a luta se fez necessária por todo o Brasil.

Com o Manifesto de agosto de 1950, constituiu novas formas de luta em profunda conexão com a revolução brasileira. Sindicatos livres, organizações populares e proletárias sem o controle do Estado, organização das lutas das mulheres e uma denúncia combativa e militante contra o racismo. Um partido com sentido de defesa de classe e perspectiva de lutas por rupturas revolucionárias.

O PCB teve a maior presença intelectual de todos os tempos; uma marca seminal na cultura brasileira. Afinal, na história do século XX, lutaram dentro do partido as figuras mais importantes das letras, ciências, artes, música, mundo artístico, teatro e do cinema. 

Origem da esquerda brasileira

O partido foi a origem da esquerda brasileira, contudo, no tempo presente, ainda não se transformou em um grande operador político desse campo ideológico. Porém, germinou no processo histórico brasileiro as lutas mais férteis dos trabalhadores e iluminou, com passos seguros, nas trevas ou à luz do dia, trilhas por onde as lutas que procuram o sentido da revolução brasileira. 

Ao completar 101 anos o PCB é uma Fênix da história, com erros e acertos. Esteve ao lado dos revolucionários que construíram as revoluções anticapitalistas pelo mundo, a exemplo da União Soviética, China, Coréia, Cuba, Vietnam e das democracias populares do leste europeu e da África. Combateu ao lado da luta anticolonial e das ações revolucionárias pelo mundo. Sempre foi um partido internacionalista que operou em defesa da revolução mundial. 

Nessa longa história de lutas, é importante reverenciar os fundadores, mas também os homens e as mulheres que lutaram para que o PCB pudesse estar aqui hoje. Figuras como Minervino de Oliveira, Octávio Brandão, Elisa Branco, Giocondo Dias, Carlos Marighella, Lyndolpho Silva, Maria Aragão, Mário Alves, José Maria Crispim, Yeda Maria Ferreira, Osvaldo Pacheco, Câmara Ferreira, Antonieta Campos da Paz, Horácio Macedo, Ana Montenegro, Dinarco Reis, Paulo Cavalcanti, Iraci Picanço, Gregório Bezerra, Maria Brandão, Zuleika D’Alembert, Adalgisa Cavalcanti  e o lendário Luiz Carlos Prestes. 

Em um momento de grande simbologia como o presente, é preciso rememorar aqueles militantes históricos que tiveram seu sangue derramado quando lutaram em defesa da classe trabalhadora, das liberdades democráticas e contra a opressão burguesa. Jamais serão esquecidos os 43 mártires assassinados pela ditadura burgo-militar de 1964: Ivan Rocha Aguiar (estudante), Antogildo Pascoal Viana (operário), Carlos Schirmer (operário), Pedro Domiense de Oliveira (carteiro), Manuel Alves de Oliveira (militar), Newton Eduardo de Oliveira (operário), João Alfredo (camponês), Pedro Inácio de Araújo (camponês), Israel Tavares Roque (operário), Divo Fernandes D’oliveira (marítimo), Severino Elias de Melo (militar), Inocêncio Pereira Alves (Alfaiate), Lucindo Costa (funcionário público), João Roberto Borges de Souza (estudante), José Dalmo Guimarães Lins (jornalista), Francisco da Chagas Pereira (militar), Epaminondas Gomes de Oliveira (sapateiro), Ismael Silva de Jesus (estudante), Célio Augusto Guedes (dentista), José Mendes de Sá Roriz (militar), Davi Capistrano da Costa (militar), José Roman (operário), João Massena Melo (operário), Luiz Ignácio Maranhão Filho (jornalista), Valter de Souza Ribeiro (militar), Afonso Henrique Martins Saldanha (professor), Elson Costa (caminhoneiro), Hiran de Lima Pereira (administrador), Jayme Amorim de Miranda (jornalista), Nestor Veras (camponês), Itair Veloso (operário), Alberto Aleixo (operário), José Ferreira de Almeida (militar), José Maximino de Andrade Neto (militar), Pedro Jerônimo de Souza (comerciário), José Montenegro de Lima (estudante), Orlando Bonfim (jornalista), Vladimir Herzog (jornalista), Neide Alves Santos (propagandista), Manoel Fiel Filho (operário), Feliciano Eugênio Neto (operário), Lourenço Camelo Mesquita (taxista) e José Pinheiro Jobim (diplomata). 

Mesmo com os equívocos do pré-1964, a luta desenvolvida pelo PCB na construção dos movimentos populares e proletários, e na articulação da Frente Democrática, foram fundamentais para derrotar a ditadura e plantar um novo tempo de liberdades democráticas com o fim do regime militar. 

Os anos 1980 foram tempos de confusão política e ideológica, se configuram como o pior momento da história do PCB, quando o taticismo politicista tentou matar o operador estratégico. No entanto, a Fênix Vermelha soube operar sua depuração e organizar a Reconstrução Revolucionária a partir de 1992.

O PCB voltou à centralidade das lutas proletárias e populares, colocou na ordem do dia a estratégia socialista como formulação central para orientar a ação tática. Construiu instrumentos de combate à sociabilidade da ordem capitalista, a exemplo do Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro (CFCAM), Coletivo Negro Minervino de Oliveira (CNMO) e o LGBTComunista. Avançou na organização de frentes de massas, a exemplo da União da Juventude Comunista (UJC) e a Unidade Classista (UC). 

Nesses 101 anos de luta o PCB soube fazer a autocrítica necessária e reorganizar bandeiras e ações para operar nas batalhas hodiernas das lutas de classes. O partido assumiu seu compromisso histórico com as bandeiras anticapitalista antiimperialista, contra a exploração capitalista e as opressões da sociedade burguesa, sempre na perspectiva da revolução brasileira e da confirmação do projeto socialista.

Hoje, os comunistas brasileiros, estão completando 101 anos de lutas que marcaram a história do Brasil e do mundo. Afinal, muitos dos militantes comunistas lutaram na guerra civil espanhola, na resistência francesa e nas batalhas da segunda guerra mundial na Europa. 

Durante essa longa jornada, o sangue dos militantes se confundiu com o vermelho da bandeira comunista e adubou o solo fértil das batalhas que a classe trabalhadora desenvolveu no Brasil e no mundo. 

Com essa história e com a confirmação dessas bandeiras, o PCB ainda não é o maior partido da esquerda brasileira, mas não ocorrerá lutas da classe trabalhadora sem a sua presença convicta. Afinal, o operador político da longeva história brasileira, desde o começo do século XX, encontra sentido para sua práxis revolucionária na consigna Fomos, Somos e Seremos Comunistas.

Viva os 101 anos do PCB!

 


 
[1] Milton Pinheiro é militante do PCB, Cientista Político e professor titular de história política da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).

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