Jauenses em Mariana contam detalhes da tragédia em MG

Dois estudantes jauenses que vivem em Mariana (MG) testemunharam na última semana momentos de sofrimento, vividos por quem perdeu tudo no Distrito de Bento Rodrigues, e de apreensão, diante de informações de que outra barragem apresenta rachadura. No dia 5 de novembro, duas barragens que continham água e rejeitos de mineração se romperam, o que provocou a morte de pelo menos sete pessoas e o desaparecimento de outras 18. Até a tarde de ontem, dois corpos aguardavam identificação. Os impactos ambientais são inestimáveis.

Foto: Casal caminha entre escombros do Distrito de Bento Rodrigues: em busca de pertences pessoais

Por João Guilherme D'Arcadia - Jornal Comércio do Jahu

Fotos: António Cruz/Agência Brasil, arquivo Pessoa

O Comércio conversou por telefone com a estudante de serviço social Raquel Donato, 27 anos, e com o de jornalismo Caio Macedo Rodrigues Aniceto, 20 anos. Ambos estudam no campus de Mariana da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop).

Raquel é estagiária da prefeitura e trabalha em um dos quatro Centros de Referência em Assistência Social (Cras) do município. A repartição atuou no cadastro dos moradores que perderam tudo no mar de lama. Ela coletou os dados dos tios de Emanuele Vitória Fernandes, de 5 anos, encontrada morta no dia 10 de novembro.

"A maioria das pessoas ainda não conseguiu lidar com isso, parece não ter 'caído a ficha'. Elas querem entender o que aconteceu e o que farão sem tudo aquilo que perderam", relata.

Superficial

 

Apesar das consequências avassaladoras do rompimento - a lama contaminou o Rio Doce, prejudicou o abastecimento de água em várias cidades e chegou ao Espírito Santo - o perímetro urbano de Mariana passou incólume pela tragédia. O temor agora é com a possibilidade de novo rompimento, sobre a qual se tem poucas informações oficiais.

Caio Aniceto critica justamente o conflito de versões e a cobertura superficial que a imprensa adotou para relatar as causas e as consequências da tragédia.

Ele menciona, por exemplo, que a área não dispunha de sirene de aviso, que foi instalada dois dias após o acidente. Também não havia plano de contingência e nem o cumprimento de parte das dezenas de condições de instalação da barragem.

Por fim, a preocupação em torno do fechamento da mineradora Samarco, que emprega a maior parte da população da cidade, provocou vitimização da empresa. "Todos estão chamando o caso de acidente, mas ninguém coloca a empresa em xeque", afirma. Na noite de sexta, Aniceto enviou um e-mail para a reportagem para relatar que depois da descoberta da fissura na terceira barragem a situação em Mariana era de "insegurança estável".

Em nota oficial, a mineradora afirmou que "está mobilizando todos os esforços necessários para priorizar o atendimento dos atingidos pelo acidente e mitigar os danos ambientais".

"O custo social é maior que o lucro"

Para a ambientalista e economista Amyra El Khalili, as empresas de mineração que atuam no Brasil ainda adotam métodos rudimentares, com danos ambientais altos e com baixo investimento em tecnologia para amenizar as consequências dos rejeitos.

A pesquisadora lembra que o minério é um bem público, tutelado pelo Estado. Após as privatizações, empreendidas no fim da década de 90, perdeu-se o controle sobre os mecanismos de mineração e os efeitos do extrativismo para os Estados que dispõem de jazidas.

"O custo social de minerar se tornou muito maior para o povo do que o lucro que a mineração traz para a sociedade", argumenta.

Amyra critica ainda a negligência nos licenciamentos ambientais e as tentativas de afrouxamento da legislação que rege o setor no Brasil. Do ponto de vista das reservas ambientais, a economista é ainda mais enfática. "Minas não merece virar um buraco. Não dá para contemporizar, a conta negativa sempre sobra para a população", menciona. (JGD)

 

Subscrever Pravda Telegram channel, Facebook, Twitter

Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
X