Ao que parece, a União Europeia (UE) desistiu mesmo de assinar um acordo de livre-comércio com o Mercosul, mas isso não significa que tenha deixado de lado a hipótese de assiná-lo só com o Brasil. Depois dos 15 acordos setoriais de cooperação firmados pela Argentina com a China, que incluem até a construção de um base espacial na província de Neuquen, o Mercosul, em tese, deixou de ser entrave para que os demais parceiros assinem tratados em separado, mas o governo brasileiro, de forma diplomática, ainda insiste em dizer que o acordo com a UE depende da concordância dos seus sócios sul-americanos.
Milton Lourenço (*)
É de se lembrar que Mercosul e UE fazem negociações com vistas à assinatura de um acordo de livre-comércio desde 1999, mas que os entendimentos estiveram bloqueados de 2004 a 2009. Na reunião de cúpula de 2004, o então presidente da Comissão Europeia, o português José Manuel Durão Barroso, deixou escapar que o grande impedimento para a formalização do acordo havia sido a oposição argentina à redução de tarifas de importação.
Obviamente, não se pode defender o esvaziamento ou a anulação do Mercosul em favor de um acordo com a UE, até porque o ideal é que ambos existam e convivam sem refregas ou retaliações. Até porque desde 2010 o Mercosul tem sido o principal fornecedor de bens de capital para a Argentina, assumindo o Brasil mais de 90% dessas exportações. E há do lado brasileiro o interesse de continuar considerando a parceria com a Argentina como fundamental para a integração sul-americana.
Portanto, há necessidade de um entendimento de alto nível para que o Mercosul libere o Brasil e os demais sócios interessados em assinar um tratado de livre-comércio com a UE. Sabe-se que a UE quer que o Mercosul apresente uma lista de produtos que terão tarifa de importação liberada, englobando pelo menos 90% do comércio entre as duas regiões. E que o prazo dessa liberação dure pelo menos dez anos.
Se a Argentina entende que não lhe interessa a liberação de tarifas de importação para vários produtos considerados sensíveis, o bom senso recomendaria que deixasse os seus parceiros livres para continuar as negociações, sem que isso significasse o fim do bloco. Caso contrário, o Brasil, como o parceiro economicamente mais forte, só terá a perder porque a UE deu a entender que já não conta com um possível acordo com o Mercosul.
Como necessita conquistar novos mercados, depois de 12 anos de letargia em sua diplomacia comercial, o Brasil precisa correr para não perder vantagens e espaço no mercado europeu. Se conseguiu reabrir as portas em Washington, o governo deve procurar fazer o mesmo esforço em relação à UE. Como se sabe, Estados Unidos e UE negociam há mais de dois anos um acordo amplo que, se for fechado, poderá reduzir o espaço para aquelas nações que não têm tratados de preferências com esses dois blocos, que simplesmente são os maiores do planeta.
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(*) Milton Lourenço é presidente da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e Logística (ACTC). E-mail: [email protected]. Site:www.fiorde.com.br.
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