Mauro Lourenço Dias (*)
Quem costuma viajar e conhece portos pelo mundo sabe que o sistema portuário precisa ter agilidade de gestão. É por isso que os grandes portos europeus e asiáticos são administrados pelos municípios. E, como mostram os números, funcionam muito bem, ao contrário dos portos brasileiros que, em geral, dependem de decisões por parte de vários ministérios, que ficam a quilômetros de distância, em Brasília, na região Centro-Oeste.
Nestes tempos de informação digital, talvez a distância não seja obstáculo tão intransponível, mas a verdade é que, se a decisão é local, tudo flui de maneira mais rápida. Não se está aqui a defender que não existam regras ou planejamentos estratégicos ou princípios nacionais, mas apenas que a gestão seja local. Em outras palavras: é preciso que haja um condutor local para dar a última palavra e providenciar a implementação dos projetos. Até porque só uma gestão local está capacitada a avalizar corretamente todas as implicações de uma decisão.
Por esse lado, não há dúvida de que o Brasil segue na contramão da História mundial. E deverá continuar assim por muito tempo porque o município na atual Federação brasileira pouco peso tem nas decisões nacionais. Com certeza, se algum dia a administração portuária sair do âmbito federal, será para ficar sob o controle do governo do Estado. A única mudança seria que, em vez do presidente da República, caberia ao governador do Estado assinar a indicação do administrador da gestão portuária, provavelmente por sugestão do cacique de alguma organização partidária capaz no momento de lhe render maioria de votos no Parlamento. É assim que funciona o jogo político no País.
Portanto, parece claro que, com o atual modelo portuário, não se pode esperar mesmo muita agilidade por parte das autoridades. É claro que isso não impedirá o crescimento dos portos nem um maior desenvolvimento do País. E sempre será possível ao administrador portuário brandir, numa palestra, números em favor de sua gestão.
A questão, porém, é mais complexa. É que, se não houvesse tanta burocracia, esse desenvolvimento poderia ocorrer a números mais significativos e de maneira menos desordenada. Veja-se, por exemplo, a questão do arrendamento de uma área portuária. Nas circunstâncias atuais, de acordo com a Lei de Modernização dos Portos (Lei nº 8.630/93), para se fazer esse tipo de procedimento burocrático, depende-se de vários ministérios. Um responde pela parte portuária, outra pelo meio ambiente, outro pela segurança nacional. Até o Tribunal de Contas da União tem de aprovar os textos dos contratos.
Não é assim que funciona no mundo desenvolvido. Lá o processo licitatório é extremamente rápido. E a validade da licitação, geralmente, é de 20 ou 25 anos, com direito assegurado de renovação por igual período. Quando depois de meio século a concessão está encerrada não se pense que há necessariamente a imposição de uma nova licitação. Basta a autoridade portuária constatar que o arrendatário cumpriu todos os objetivos da licitação, atendendo tanto ao interesse social quanto ao interesse público, que lhe é permitido renegociar o contrato para determinado período.
Talvez o leitor acostumado a ver com justificada desconfiança o trato da coisa pública no Brasil detecte nessa posição uma forma velada de defender o continuísmo ou o favorecimento de determinados grupos que costumam viver sob a sombra frondosa do Estado. Mas não é isso o que aqui se defende. Pelo contrário. O que se defende é a racionalidade de gestão.
Em outras palavras: se não houver essa possibilidade de renovação, está claro que o grupo econômico detentor da concessão vai passar os últimos cinco ou dez anos de seu contrato a investir cada vez menos, pois não terá garantia de continuidade. E não irá fazer investimentos cujos dividendos serão usufruídos pelo vencedor da próxima concorrência. Com isso, o porto corre o risco de passar alguns anos sem investimentos.
Portanto, se o arrendatário tem cumprido todos os objetivos e os estudos da autoridade portuária demonstram que a tecnologia empregada é moderna e adequada, não há razão para que não lhe seja permitida a renovação de contrato. Mas não é o que diz a Lei nº 8.630.
É nisso que a Secretaria Especial dos Portos (SEP) e demais autoridades portuárias deveriam pensar com urgência, pois, em pouco tempo, vários contratos de arrendamento no Porto de Santos estarão no fim. E, de acordo com a lei, novas licitações terão de ser realizadas, com todas as delongas burocráticas que cercam esse procedimento.
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(*) Mauro Lourenço Dias é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br
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