UNCTAD: Países em desenvolvimento deveriam diversificar mais as economias

Genebra/Brasília – Embora os preços elevados das commodities, vendidas no mercado internacional pelos países em desenvolvimento há bastante tempo, tenham ajudado bastante essas nações nos últimos anos, elas precisam continuar se concentrando na diversificação econômica e na industrialização sustentada, afirma o Relatório de Comércio e Desenvolvimento de 2008 (TDR) da UNCTAD (1).

Uma das principais mensagens do documento é a necessidade de maiores investimentos nesses países, para criar uma nova "capacidade produtiva" - habilidade para fabricar produtos mais variados e sofisticados – e a idéia de que o financiamento para essas atividades pode vir cada vez mais de fontes domésticas, desde que os sistemas monetário e financeiro sejam projetados e encorajados a isso. Com o subtítulo de "Preços de Commodity, Fluxos de Capital e Financiamento de Investimentos", o relatório foi divulgado hoje. Para incentivar investimentos que acelerem tantas mudanças estruturais, os países em desenvolvimento não devem confiar apenas no aumento da poupança doméstica e no afluxo de capital estrangeiro.

A política monetária nacional e os sistemas financeiros locais devem ser projetados de modo que empresas do setor privado tenham acesso confiável e acessível para investimentos que estimulem a capacidade produtiva, a eficiência e a diversificação. Com este posicionamento, o relatório, conhecido como TDR 2008, desafia as teorias convencionais de desenvolvimento financeiro, que vêem os investimentos nos países em desenvolvimento como provenientes de poupanças provenientes principalmente da poupança familiar, e complementada pela importação de capitais ("poupança externa"). "Não são apenas os pressupostos desses modelos que estão longe da realidade, mas também suas previsões, que já foram repetidamente refutadas por evidências empíricas".

O documento sugere uma abordagem alternativa, baseada nos trabalhos de Schumpeter e Keynes e derivada de experiências do pós-guerra da Europa Ocidental e de desenvolvimento acelerado do Leste Asiático, onde o financiamento de investimentos produtivos foi baseado principalmente nos lucros retidos das empresas e na capacidade de criação de crédito dos sistemas bancários locais. Entre as fontes domésticas de investimento, o autofinanciamento através dos lucros retidos é a mais importante e confiável, segundo o relatório.

O crédito bancário é a segunda fonte mais importante de financiamento para empresas, especialmente para novos negócios e pequenas e médias companhias. "É de extrema importância que uma parte substancial dos ganhos das empresas seja reinvestida na capacidade produtiva", considera o Secretário-Geral da UNCTAD, Supachai Panitchpakdi, no panorama geral do TDR 2008. O relatório sugere que investimentos financeiros poderão ser obtidos por meio de uma série de incentivos fiscais, como tratamento fiscal diferenciado para lucros retidos ou reinvestidos, ou incentivos especiais de depreciação. O relatório enfatiza que o poder de criação de crédito dos sistemas bancários, baseado na liquidez promovida pelos bancos centrais, deve ser combinado a fortes arranjos institucionais e instrumentos de política adicionais para manter a estabilidade de preços.

Em especial, o relatório solicita a criação de uma política de renda que previna aumentos excessivos dos salários nominais, além de uma política fiscal flexível. Esta tem sido uma receita de sucesso nos países recentemente industrializadas do Leste da Ásia (NIEs). Nesses países, as taxas de juros reais têm sido consideravelmente mais baixas do que na maior parte da América Latina e da África, onde a política monetária tendeu a se focar quase inteiramente em evitar a inflação. Isso deu origem a baixos níveis de investimento e crescimento lento.

Experiências em vários países demonstraram que políticas de taxas de juros altas – baseadas na premissa de que elevações anteriores nos níveis de poupança doméstica e de afluxo de capital estrangeiro são pré-requisitos para maiores investimentos – são contraproducentes. Os juros altos reduzem os lucros dos negócios por conta da menor demanda agregada e do elevado custo de financiamento, desacelerando o investimento doméstico e o crescimento dos lucros.

De acordo com o TDR, esta é provavelmente a principal razão pela qual as reformas financeiras realizadas por muitos países em desenvolvimento e economias em transição, nas décadas de 1980 e 1990, falharam em aumentar os níveis de investimento. Ao invés de criarem um aumento sustentado dos empréstimos bancários com propósito de investimento a empresas privadas, a maioria dessas reformas levou a um boom de empréstimos para consumo e compras de imóveis resultando, geralmente, em crises bancárias e financeiras.

Encontram-se ainda em níveis excessivamente elevados, na maioria dos países em desenvolvimento, os diferenciais de juros entre, por um lado, a taxa básica do Banco Central e a taxa paga aos depósitos e, por outro, a taxa cobrada aos empréstimos. Nesses países, a maioria dos bancos comerciais considera mais rentável e menos arriscado expandir o crédito destinado ao consumo e à habitação, ou comprar títulos da dívida pública, do que promover empréstimos de longo prazo para projetos de investimento e novas atividades comerciais.

O acesso ao crédito bancário ainda depende muito do tamanho da empresa, fazendo com que firmas novas, pequenas e inovadoras freqüentemente encontrem sérias dificuldades de financiamento, mesmo quando elas podem arcar com as elevadas taxas de juros reais dos empréstimos. "Na perspectiva de financiar o desenvolvimento, não importa apenas o potencial de lucro microeconômico de um projeto mas, também, os benefícios externos que esse processo gera para a economia como um todo", observa o TDR.

Economistas da UNCTAD recomendam, portanto, que os governos influenciem de maneira mais forte o direcionamento do crédito para setores e atividades estratégicos. Isto pode levar, por exemplo, ao fornecimento direto de fundos por instituições financeiras públicas ou subsídios fiscais a projetos selecionados.

Um controle mais rigoroso do crédito para fins de consumo ou especulativos também pode encorajar a alocação de crédito para projetos de investimento. Em instâncias onde taxas de juros elevadas refletem percepções de risco elevadas, as garantias do governo podem ser consideradas para empréstimos que financiem projetos de investimento promissores de empresas que, de outra maneira, podem ter acesso ilimitado, ou mesmo inexistente, a crédito bancário de longo prazo.

Uma maneira de aproximar considerações comerciais e de desenvolvimento na alocação de crédito seria no financiamento conjunto, por bancos públicos e privados, de certos projetos de investimento. Isso uniria a experiência do setor privado na avaliação de viabilidade de projetos às considerações estratégicas das instituições públicas, cuja participação no financiamento também reduziria os riscos do banco privado envolvido.

(UNCTAD/PRESS/PR/2008/025, orignal em inglês)

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey