Barnabé-Bagres: a hora é agora

Milton Lourenço (*)

Não fossem outros anúncios, que nunca se concretizaram, seria de se elogiar a iniciativa da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) de procurar colocar em execução os planos para a construção do complexo Barnabé-Bagres na margem esquerda do Porto de Santos. Quando concluído, aí por volta de 2015, na melhor das hipóteses, o projeto irá mais do que duplicar a capacidade de movimentação do Porto, passando das atuais 110 milhões de toneladas por ano para 230 milhões de toneladas.

Como se sabe, a empresa Santos-Brasil já vem fazendo estudos de viabilidade econômica e ambiental para a utilização das duas ilhas que dão nome ao projeto.

Se tudo correr bem, com a licença ambiental devidamente sacramentada, as primeiras unidades do novo porto deverão estar em funcionamento em cinco anos.

Quem se der ao trabalho de ler uma entrevista que o antigo diretor comercial da Codesp, Fabrizio Pierdomenico, concedeu em meados de 2005 vai descobrir que, àquela época, a capacidade de 110 milhões de toneladas, que seria possível alcançar com todas as ampliações que estavam em curso, já era considerada o limite a que a movimentação de cargas do Porto poderia chegar, sem que fosse registrado um apagão logístico. E que o dirigente portuário dizia que, se o Porto continuasse a crescer 10% ao ano, isso poderia se dar em cinco anos. Pois bem. Menos de três anos depois, essa marca já foi alcançada e o projeto Barnabé-Bagres, que seria uma das principais alternativas para a ampliação dessa capacidade, ainda não saiu do papel.

Nunca é demais lembrar que, quando concluído, o projeto Barnabé-Bagres vai acrescentar mais 11 quilômetros de cais aos atuais 13 quilômetros e oferecer 45 berços de atracação, que se vão juntar aos 64 berços que funcionam às margens de Santos e Guarujá. Sem contar que todos esses novos terminais terão à disposição equipamentos mais modernos e eficientes do que os que estão em funcionamento, o que deverá redundar em considerável redução do tempo das operações de carga e descargas dos navios.

Olhando por esse lado, pode-se até dizer que Santos estará, enfim, equiparando-se aos portos mais modernos do mundo. Acontece, porém, que é, praticamente, impossível imaginar-se o que será o mundo em 2015 ou 2020. Se projeções feitas há menos de três anos já se mostram superadas, como idealizar, sem margem de erro, quais serão as necessidades do Porto daqui a sete ou 12 anos? Se o crescimento da movimentação de cargas continuar a 10% ao ano, com certeza, mesmo com a conclusão do projeto Barnabé-Bagres, haverá um déficit na capacidade operacional do Porto em relação à demanda.

É bem verdade que a construção do chamado Porto Brasil, em Peruíbe, pela empresa EBX, pode aliviar a atração de cargas para Santos, atuando mais como um complemento de suas atividades. Mas não há garantias de que isso deverá ocorrer a curto ou médio prazo, já que são muitos os obstáculos -- inclusive, ambientais e em relação aos direitos dos indígenas -- que podem atrasar ou até desestimular a sua implantação É por isso que se tornam necessárias outras medidas que busquem maior eficiência para as operações portuárias.

Além de uma legislação que venha a desestimular greves demoradas por parte do funcionalismo público, são necessárias ações que ataquem, de maneira efetiva, a burocracia que impede que um terminal de contêineres brasileiro alcance, por exemplo, o nível de operacionalidade de um europeu. Ou seja: hoje, enquanto um terminal na Europa apresenta um giro de sete vezes ao mês em sua capacidade estática, em Santos, quando um terminal consegue fazer o mesmo giro quatro vezes, é motivo para comemorações porque, afinal, a média está entre duas e três vezes.

Se isso não for melhorado, não há como imaginar que Santos possa se transformar da noite para o dia em porto concentrador de cargas (hub port). Hoje, enquanto em portos mais modernos a checagem de um contêiner destinado a transbordo demora 24 horas, em Santos essa operação exige até sete ou oito dias. Como o transbordo constitui o fulcro dessa filosofia de trabalho, não há como imaginar Santos como hub port. E muito menos como o único porto CSI (sigla em inglês para Container Security Initiative ou Iniciativa de Segurança de Contêineres) do Brasil, ou seja, credenciado junto à aduana norte-americana para que as cargas aqui embarcadas fiquem isentas de uma fiscalização mais demorada pelas autoridades dos EUA.

Se levarmos em conta que os EUA, principal parceiro comercial do País, são compradores e vendedores de mercadorias com valor agregado e não de commodities, isso equivale a dizer que a corrente de comércio entre os dois países é basicamente movimentada por contêineres. Na hipótese de, um dia, o Porto virar efetivamente CSI, todos os contêineres com destino aos EUA terão de passar por Santos, o que significa que as projeções de movimentação que se têm feito até aqui estarão completamente superadas. É por isso que não se pode mais adiar o início da construção de Barnabé-Bagres e outros projetos de ampliação do Porto. A hora é agora. Ou até já passou.

(*) Milton Lourenço é diretor-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP. Site: www.fiorde.com.br

E-mail: [email protected]

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