Médico brasileiro recupera visão com cola

Técnica aplicada em portadora de herpes ocular evita complicações cirúrgicas e permite selar olho sem perder o sinal de perfuração da córnea que prioriza o transplante. Doação de córnea cai no país.

Dor nos olhos, lacrimejamento, sensibilidade à luz e redução da acuidade visual são os principais sintomas oculares causados pelo vírus do herpes. Transmitido pelo contato com um portador ou queda da imunidade, em geral o vírus se instala no organismo por volta dos cinco anos de idade e permanece inativo. Estresse, febre, traumas e doenças como resfriados ou gripe ativam o vírus que causa inflamações na córnea afirma o oftalmologista do Instituto Penido e diretor médico do Banco de Olhos de Campinas, Leôncio Queiroz Neto.

A reincidência das crises afina a córnea, pode levar à cicatriz e até à perfuração que causa perda da visão. Foi o que aconteceu com a adaptadora de lentes de contato, Nelida Gomes de Lorenzo, 54. Viúva e mãe de duas meninas, ela conta que desde os cinco anos de idade basta ficar estressada ou ter algum problema de saúde para começar a sentir dor no olho esquerdo. No último desconforto, pingou colírio corticóide por conta própria e teve uma perfuração da córnea enquanto lavava o rosto. Queiroz Neto conta que para recuperar a visão de Nelida utilizou cola de cianoacrilato que evita o vazamento do humor aquoso e a aderência ocular interna que inviabilizaria o posterior transplante óptico para devolver a funcionalidade ocular e salvar o olho.

O especialista diz que escolheu esta técnica porque permite selar o olho sem perder o sinal de perfuração da córnea que prioriza o transplante. O cianoacrilato, comenta, serve de apoio para o crescimento de tecido cicatricial sobre a área perfurada, retarda a necrose e tem ação bactericida. Por sorte, ressalta, a perfuração não atingiu 3 mm que é o tamanho máximo para aplicação da cola que se torna tóxica em áreas maiores.

Recuperação poderia demorar até oito meses

O resultado não poderia ser melhor. Cinco dias depois Nelida passou por um transplante óptico e afirma que já enxerga melhor com a nova córnea apesar do olho não estar completamente recuperado. Emocionada ela diz que é um milagre poder voltar ao trabalho uma semana depois da perfuração.

De acordo com Queiroz Neto, além do uso de cola poderia ter sido feito transplante tectônico ou recobrimento conjuntival. Ele explica que o transplante tectônico é uma espécie de curativo biológico feito com uma córnea que seria descartada por não ser adequada para restituir a visão ao receptor. O problema, comenta, é que o transplante tectônico é muito mais invasivo porque pode gerar mais procedimentos, aumenta o risco de surgir catarata, forte reação inflamatória e a recuperação para o transplante definitivo demoraria, no mínimo, quinze dias.

Já a recuperação por meio do recobrimento conjuntival é de seis a oito meses, período em que a paciente ficaria com o olho branco, teria dificuldade para voltar às atividades e ainda corria o risco de entrar na fila de espera por córnea porque o sinal de perfuração poderia desaparecer apesar do comprometimento da visão.

Dicas para brecar crises herpéticas

A dica do especialista para prevenir a reincidência das crises herpéticas que induzem à perfuração da córnea é incluir carne, peixe, leite, ovos e queijos na alimentação. Isso porque, estes alimentos contêm lisina que tornam o portador mais resistente ao vírus.

Já o consumo exagerado de chocolate, amendoim, passas, gelatina, cereais e passas estimulam a replicação do herpes por conterem outro aminoácido, a arginina, que também é suprimida pela ingestão de lisina. Ele lembra que a terapia completa inclui além da lisina os antivirais aciclovir ou valaciclovir e que o acompanhamento médico periódico é fundamental.

Queda na doação de córnea é crítica

Queiroz Neto ressalta que desde o início do ano as doações de córnea vêm caindo e que muitos bancos de olhos do país se tornaram inoperantes por não terem apoio financeiro, apesar de existir uma dotação extra do Ministério da Saúde para transplantes que precisa ser solicitada pelos Conselhos Municipais de Saúde. Só para se ter uma idéia, o número de captações mensais feitas pela UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas) caiu de uma média de 50 para 12 no mês passado, o Banco de Olhos de Campinas não teve captações e a fila de espera da região hoje soma 924 pessoas após a fusão com Sorocaba.

“Tenho um paciente de 48 anos que só tem um olho e não se enquadra nos critérios de prioridade estabelecidos pelo sistema nacional de transplantes. Não quis correr este risco com mais uma paciente”, desabafa. O médico ressalta a importância das pessoas que têm intenção de doar a córnea avisarem à família, uma vez que a retirada acontece até seis horas após o coração parado, momento de natural abalo psicológico dos familiares. Quando a família desconhece o desejo do falecido é comum ter uma reação contra, comenta. Para ele, a queda da doação de córneas só será revertida mediante o apoio orçamentário previsto pelo Ministério da Saúde que não tem chegado a todos os bancos de olhos.

Fonte: Eutrópia Turazzi - LDC Comunicação

[email protected]

Subscrever Pravda Telegram channel, Facebook, Twitter

Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
X