Foi vitória política para ambos, Putin e Trump, com possíveis importantes implicações geopolíticas de curto prazo.
Adiante, os pontos principais.
1. Síria
EUA, Rússia e Jordânia implementarão e garantirão um cessar-fogo no sudoeste da Síria, cobrindo Daraa, Quneitra e Sweida. O cessar-fogo coincidirá com a criação de uma nova zona de desescalada na região, a ser monitorada conjuntamente por Rússia, EUA e Jordânia. Os detalhes foram fixados num memorando sobre zonas de desescalada acordado entre Washington, Moscou e Amã.
O cessar-fogo entrará oficialmente em vigor às 12h, hora de Damasco, dia 9 de julho de 2017.
Lavrov disse que os EUA aceitaram a importância de reconhecer a soberania da Síria e trabalhar para uma solução política. A implicação mais imediata disso é que os EUA firmaram o compromisso com a Rússia de não buscar qualquer mudança de regime em Damasco. Em outras palavras, Putin disse e Trump não discordou que 'Assad pode ficar e ficará'.
Sergey Lavrov também confirmou que o novo cessar-fogo e zona de desescalada no sudoeste da Síria não substituem, mas complementa, as zonas de desescalada estabelecidas no Memorando de Astana assinado em maio de 2017.
2. Guerra Ucrânia-Donbass e Península da Crimeia
Os presidentes de Rússia e EUA concordam com a criação de um canal de comunicação bilateral entre Moscou e Washington sobre a guerra no Donbass, que prossegue, e a deterioração da situação na Ucrânia.
Haverá em breve reuniões em Moscou entre o Ministério de Relações Exteriores da Rússia e o enviado dos EUA para questões da Ucrânia que foi nomeado hoje pelos EUA, Kurt Volker, ex-embaixador à OTAN.
As discussões trabalharão para implementar os acordos de Minsk para um cessar-fogo na guerra do Donbass.
Lavrov confirmou que Donald Trump não acrescentou nenhuma opinião nem qualquer outra solução para a crise do Donbass-Ucrânia, além do compromisso de respeitar os acordos de Minsk e o formato Normandia vigentes para a paz.
Também ficou confirmado que Putin e Trump falaram sobre a península da Crimeia, mas não se divulgaram detalhes dessa conversa.
3. Russiagate e Ciber-segurança
Sergey Lavrov disse que Donald Trump aceitou a palavra do presidente Putin, de que a Rússia não teve nenhuma participação em nenhum tipo de hacking ou intromissão nas eleições presidenciais nos EUA.
Rússia e EUA continuarão a discutir essa questão.
Sergey Lavrov reproduziu palavras de Donald Trump, para quem a obsessão nos EUA com o Russigate e "bizarra".
Rússia e EUA afirmaram o compromisso de cooperar no campo da ciber-segurança contra o terrorismo, a pedofilia, o encorajamento ao suicídio e atividades do crime organizado.
4. República Popular Democrática da Coreia ["Coreia do Norte"]
Sergey Lavrov e Rex Tillerson manter-se-ão em contato próximo quanto à questão da desescalada na península coreana.
Rússia e EUA também trabalharão sobre o mesmo tema dentro do Conselho de Segurança da ONU.
5. Embaixadores russos e propriedades de russos nos EUA e cidadãos russos em prisões dos EUA
Donald Trump prometeu trabalhar com a Rússia para acelerar o processo de enviar novos embaixadores e pessoal diplomático russo para os EUA (que Barack Obama expulsou do país nos seus últimos meses de governo.
Os dois lados também trabalharão juntos para a restauração de propriedade russa nos EUA (confiscada pelo governo Obama).
Os dois lados também continuarão a trabalhar sobre a questão dos direitos humanos de cidadãos russos detidos nos EUA, inclusive de Viktor Bout.
6. Relações Pessoais
Lavrov não disse que Putin e Trump seriam amigos. Em vez disso, informou que a reunião aconteceu em
"Atmosfera construtiva, porque os dois presidentes foram conduzidos por interesses nacionais. Ambos compreenderam também que os dois países só podem fazer desse modo (cooperação positiva) se se buscar um equilíbrio entre os interesses de nossos dois países".
Não se marcaram encontros futuros, mas os dois lados comprometeram-se com a agenda delineada na reunião.
7. Análise
O resultado mais importante, de longe, da reunião, foi a criação de uma zona de desescalada para o sudoeste da Síria e o cessar-fogo que a acompanha.
É a segunda vez que o governo russo consegue sucesso no serviço de envolver em processo político de paz um estado cuja posição sempre foi de oposição ao governo sírio. O novo processo de paz, também mais uma vez, rejeita explicitamente a mudança de regime e procura trabalhar construtivamente com a Rússia.
Na primeira vez, aconteceu quando a Rússia conseguiu levar a Turquia para as conversações de paz de Astana.
Houve especulações de que o Irã seria expulso do processo de paz na Síria, a favor dos EUA e da Jordânia, aliada dos norte-americanos, mas é ainda muito cedo para considerar qualquer real possibilidade de que aconteça assim. Parece que não se discutiu a visível deterioração das relações com a Turquia, efeito do apoio dos EUA aos curdos na Síria; também parece que o Iraque não foi discutido.
Contudo, o fato de que EUA, Rússia e Jordânia supervisionarão o cumprimento do cessar-fogo em partes da Síria na fronteira com Israel, mas não no Irã, com quem Israel não tem relações diplomáticas, significa que Israel deverá pôr fim aos atos militares de agressão ilegal contra a Síria - o que dará ao Exército Árabe Sírio e seus aliados russos melhores condições para lutar expulsar do sudoeste da Síria os terroristas da al-Qaeda.
Se Putin obteve uma vitória geopolítica ao trazer os EUA para o processo negociado de paz, que não envolve mudança militante de regime, Donald Trump também obteve algo bem semelhante a uma vitória política doméstica. Agora, Trump pode dizer que, com apenas uns poucos meses de governo, já conseguiu firmar um bom acordo com a Rússia. - Obama jamais chegou sequer perto disso.
Claro que, como no caso da participação da Turquia no processo de Astana, não há garantias de que os EUA respeitem a própria palavra, ou de que a zona de desescalada no sudoeste da Síria funcione a contento. Nesse sentido, como no caso de Astana, as implicações políticas e geopolíticas são mais importantes que as implicações militares.
Falando dos aspectos militares, a Síria com apoio de seus aliados russos está rapidamente dando cabo da maioria dos grupos terroristas a oeste do rio Eufrates. Astana não inibiu essa ação (ao contrário, pode-se dizer que o processo foi acelerado depois de assinado o memorando de Astana), e não há como dizer que o novo acordo possa ter qualquer impacto negativo naquele processo. Pode, sim, ter efeito positivo - sobretudo se fizer com que Israel ponha fim (mesmo que só temporariamente) às agressões contra a Síria.
Quanto ao Donbass, é claro que Donald Trump pouco se preocupa com esse conflito, o que significa, em termos realistas, que estará menos disposto que seu predecessor Obama a tirar de Kiev o regime fascista. De fato, não houve realmente nenhum desenvolvimento novo ou surpreendente quanto a essa questão.
Finalmente, sobre a acusação de que 'hackers' russos teriam influído nas eleições nos EUA, é bem evidente que Donald Trump confia mais em Vladimir Putin, que em membros do Partido Democrata, alguns Republicanos, e muito mais em Putin que na mídia-empresa mainstream nos EUA. Nem chega a ser surpresa, se se consideram declarações de Trump de antes do encontro na Rússia.*****
7/7/2017, Adam Garrie, The Duran
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