As lembranças de Marx e Lenin estão por todos os lados em Moscou, como pode ser comprovado pela foto do autor dessas linhas, na Praça da Revolução, bancando o revolucionário com o casaco vermelho do Internacional para lembrar a cor preferencial desses velhos comunistas.
Mas não são apenas em monumentos, pinturas, ruas, estações de metrô e bibliotecas, que os nomes de Marx e Lenin desafiam o tempo e às campanhas de difamação dos velhos inimigos da revolução proletária de 1917.
Os setenta anos de grandes conquistas, mas também de erros enormes, que transformaram um país agrícola e atrasado numa grande potência mundial, a única capaz de enfrentar o poderio militar e ideológico do imperialismo americano, foram trocados por um capitalismo selvagem e destruidor de quase todas as conquistas sociais do comunismo soviético.
Obviamente, uma semana dividida entre as duas grandes metrópoles russas - Moscou e São Petersburgo - não autoriza ninguém a uma análise mais profunda da sociedade russa, nem é minha intenção fazer isso.
O que quero deixar registrado são observações de um turista interessado em política e que antes de se dispor a atravessar um oceano para conhecer um pouco da vida russa atual, se muniu de leituras sobre importantes figuras do seu passado, da dinastia dos Romanov, passando pelos revolucionários como Lenin, Trotski, Plekanov e Stalin, aos burocratas, como Kruchiov e Brejnev e chegando aqueles que, como Ieltsin e Gorbachov, foram os grandes agentes da destruição da revolução soviética.
Primeira observação: poucos ganharam muito e muitos perderam quase tudo com o fim do regime soviético. Quase tudo não é exagero de linguagem. Casa, eletricidade, aquecimento (vital na Rússia) e água, totalmente de graça ou subsidiada em quase sua totalidade pelo Estado, passaram a ser cobrados como manda o catecismo do capitalismo. A educação e a saúde, antes totalmente bancadas pelo Estado, hoje são extremamente caras.
O pleno emprego do passado, mesmo que os salários fossem baixos, desapareceu e em seu lugar surgiu um modelo trabalhista que não dá um mínimo de garantias ao trabalhador, nem aquelas mais corriqueiras no mundo capitalista mais avançado, como o registro em carteira do salário integral e o direito à indenização em caso de demissão.
Em contrapartida, o capitalismo russo encheu às cidades de lojas, shoppings e bancos, que estão produzindo uma classe média extremamente consumista. Uma prova são as ruas de Moscou, permanentemente conflagrada por milhares de carros, que entopem suas amplas avenidas
Segunda observação: uma figura cultuada no exterior, Gorbachov, é totalmente desprezada pelo povo russo. Ao propor democratizar o sistema, através da Perestroika e da Glasnost, ele, na visão dos russos, destruiu o que funcionava e não criou nada melhor e pior, aniquilou com o orgulho dos russos, que viviam numa nação poderosa e que, da noite para o dia, se transformou num país caudatário da economia americana. Esse sentimento, de certa forma, explica a enorme popularidade de Vladimir Putin, visto como um grande nacionalista, que está fazendo com que os russos voltem a sonhar com o seu passado, quando faziam parte de uma nacão poderosa.
A última observação é fruto de uma visita aos palácios construídos pela dinastia dos Romanov, a partir de Pedro, o Grande, em São Petersburgo. A imensa riqueza, que ainda hoje pode servista, principalmente nos Palácios de Inverno e de Verão dos czares, mas também nas catedrais e prédios oficiais espalhados pela cidade, construída onde antes havia apenas um grande pântano, contrastava violentamente com a pobreza do povo, submetido à fome e ao frio enregelante e ajuda a explicar porque a Revolução Comunista começou nessa cidade, com a invasão pelos bolchevistas do Palácio de Inverno em outubro de 1917.
Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS
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