Logística: novas soluções

Mauro Lourenço Dias (*)

SÃO PAULO – Se para muitas reflexões a recente crise global serviu, uma delas foi para deixar claro que o conceito de intermodalidade veio para ficar. É verdade que a crise serviu também para abrir em trens e embarcações espaços que vinham sendo ocupados por granéis, mas hoje a tendência é utilizar cada vez mais a cabotagem e as ferrovias porque essas opções significam redução de custos logísticos, menores riscos de avaria e roubos e maiores benefícios ao meio ambiente, com a redução de carretas em rodovias.

Aliás, desde 2006, com o lançamento do Plano Nacional de Logística e Transportes (PNLT), houve por parte do governo a intenção de dar maior ênfase às ferrovias e hidrovias. Para sair da retórica e entrar no difícil terreno da prática, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) reservou R$ 58 bilhões em investimentos na infraestrutura de transportes.

Além disso, o PNLT propõe que sejam destinados R$ 20 bilhões por ano, durante a próxima década e meia, para que a estrutura de transportes do País suporte o crescimento do comércio exterior. Mas, como há sempre uma grande distância entre os recursos que são reservados e aqueles que são efetivamente aplicados, não se sabe se essa intenção será suficiente para que, em 2024, não se discuta mais a existência de gargalos logísticos no País.

Seja como for, há por parte do governo uma predisposição de investir em hidrovias, fazendo com o atraso de sempre o que os países europeus já fizeram há tantos anos. Assim, segundo os cálculos do Ministério dos Transportes, será possível ao modal hidroviário sair da atual parcela de 13% da matriz de transportes para 29%, o que equivaleria a deixar a atual marca de 850 milhões de TKUs (unidade que representa o volume em toneladas transportado por quilômetro útil) para alcançar 1,5 bilhão de TKUs. Nada mal.

No setor ferroviário, agora nas mãos de concessionárias, o que se percebe é que há trens cada vez mais transportando cargas conteinerizadas de setores como automotivo, metalúrgico, químico e eletroeletrônico. O volume total transportado pela América Latina Logística (ALL), por exemplo, atingiu 10,558 bilhões de TKUs no segundo trimestre de 2009, alta de 6,6% ante o mesmo período de 2008, 9,903 bilhões de TKUs. As operações no Brasil correspondem pela maior parte do volume transportado. O valor cresceu 9,1%, de 8,593 bilhões de TKUs naquele período de 2008 para 9,768 bilhões de TKUs entre abril e junho deste ano. Na Argentina, o volume caiu 16,9% na mesma base de comparação, de 950 milhões de TKUs para 789,5 milhões de TKUs.

Esses dados, além de mostrar que a crise global não afetou tanto a economia brasileira, deixam claro que há uma tendência cada vez mais forte em favor da utilização do modal ferroviário. E não só pelo agronegócio. Mas também por cargas industriais. Só que, neste segmento, ainda há muito que fazer, pois ao longo da malha ferroviária é grande a carência de terminais intermodais, que constituem estruturas imprescindíveis para que as empresas possam receber, armazenar e estufar contêineres. Nesse caso, porém, basta que haja a constatação da necessidade para que os investimentos privados surjam, de maneira muito mais rápida e eficiente que a ação do governo.

Na cabotagem, as perspectivas não são menores. O modal vem também registrando um notável crescimento na movimentação de cargas industriais conteinerizadas, que, igualmente, não está diretamente ligado à queda no transporte de grãos e minérios destinados à exportação. É que muitas indústrias já começaram a descobrir as vantagens de um modal, que não está sujeito a congestionamentos e apresenta menores níveis de avaria ou de roubos de carga.

Contra a cabotagem, há, porém, um obstáculo que não parece fácil de ser transposto: o alto custo do combustível marítimo na costa brasileira. Segundo dados da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), o combustível utilizado em embarcações de bandeira nacional é 37% mais caro que o usado no longo curso. Sem contar que o custo da mão-de-obra em navios de bandeira brasileira é maior que nas embarcações estrangeiras. Tudo isso compromete a competitividade da cabotagem.

Portanto, num momento em que a Antaq começa a colocar em prática o seu Plano Geral de Outogas (PGO) para a instalação de novos 22 portos, procurando atrair investidores e parceiros comerciais, é fundamental buscar soluções para tornar o combustível marítimo mais barato na costa brasileira. Caso contrário, será pretender começar a casa pelo telhado.

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(*) Mauro Lourenço Dias é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br

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