Sempre nos impressionou negativamente o laxismo reinante no mundo dos negócios. Tudo é permitido ao Capital, sobretudo quando ele é grande e opera à escala planetária, porém tratando-se do Trabalho, a conversa é outra Ao primeiro é autorizado lucros especulativos, evasão fiscal via off-shore, benefícios fiscais, sonegação de impostos, etc. Enquanto o segundo, tem que se contentar com uma magra remuneração, tendencialmente exaurida pelo constante aumento do custo de vida, carga tributária excessiva e se reclamar muito, tem sobre a cabeça a ameaça do desemprego, por que hoje dar trabalho a alguém é quase um favor
O Grande Capital pode contar ainda, na hora do aperto, com o chapéu protector do Estado, como acontece agora nos USA, país que é a pátria do Neoliberalismo e modelo da Economia de Mercado. Vejam bem, uma Economia que sempre descartou as obrigações sociais, alérgica ao controle político, arrogantemente contra o Estado, não o enjeita na hora do prejuízo e o Governo, que andou este tempo todo a contemporizar com o delírio da especulação imobiliária, corre solicito a ajudá-lo. É no mínimo surreal. Marx deve ter dado uma volta no caixão
Os especuladores, embora responsáveis pela Crise Financeira, saem ilesos da sua malfeitoria e quem irá pagar as favas será a classe média americana. Nós, por tabela, também pagaremos. Graças a uma Globalização feita à medida dos interesses das grandes famílias financeiras, que controlam o sistema financeiro internacional. Sofreremos os efeitos nefastos de uma minoria delirante e profundamente desonesta. Vamos sofrer mais do mesmo, mais desemprego, mais congelamento de salários, mais carestia de vida, etc. De um lado e do outro do Atlântico, os bancos centrais se articulam para injectar liquidez nos mercados e naturalmente farão repercutir o custo dessa operação por todo o sistema, não tenhamos dúvidas a esse respeito. Com propriedade se diz que o prejuízo está a ser socializado e mais uma vez enormes recursos públicos, dos contribuintes, são transferidos para os privados.
Quem acompanhasse com olhos de ver a evolução do mercado financeiro, cada vez mais prevalecente em relação à Economia Produtiva, a única que produz efectivamente riqueza, saberia que mais cedo ou mais tarde a fobia do lucro fácil e rápido dava numa crise. E saberia, pelo simples facto de que não se pode lucrar até ao infinito e ainda por cima com algo que tem mais de fictício do que real. Que tem a ver mais com um fetiche, do que com uma ciência apoiada na razão. Tanto que há quem fale numa crise de fé na Economia de Mercado e que o principal problema é restabelecer o clima de confiança perdido A coisa foi dando enquanto milhões de investidores sem dinheiro acreditaram que era possível enriquecer de um dia para o outro, recorrendo simplesmente ao crédito.
Porém tão logo viram que a valorização do objecto da sua devoção, o imobiliário, começou a quebrar, como ratos, abandonaram o barco Entretanto os grandes responsáveis pela louca demanda à compra de casa, conhecedores antecipados do efeito que causaram, na véspera, tiraram o cavalinho da chuva e venderam em alta os papéis que detinham à conta da especulação e enxugaram a liquidez dos bancos e casas financeiras que entraram no jogo do Capitalismo de Casino. Agora tais papéis não valem senão isso mesmo: papel que se calhar não dá nem para reciclar.
Os banqueiros não saberiam do risco que corriam? Os Governos dos principais centros do Capitalismo Internacional não saberiam que tanta fartura iria dar no que deu? Porquê contemporizaram com tão grande especulação, tendo à mão mecanismos regulatórios e de supervisão? Tudo leva a crer que os primeiros, como de costume, contavam com o Chapéu protector do Estado, embora abominem este quando se trata de pagar impostos
Os segundos, por sua vez, sabiam que têm sempre bons argumentos para justificar a transferência de enormes recursos públicos para o sector privado, porque é a forma do barco não se afundar além de contarem com a ignorância e distracção habituais do cidadão comum, pouco dado a grandes conjecturas económicas e financeiras. Uns e outro são os primeiros a negar a auto regulação do mercado que defendiam a pés juntos antes da derrocada do mundo financeiro. São os primeiros que não confiam na mão invisível de Adam Smith, que acreditava que a acção livre do egoísmo individual, acabaria por suprir todas as necessidades e anseios de uma sociedade livre. Ledo engano!!! O que tal regra produz é a ganância. Os resultados estão à vista..
A ausência de Ética no mundo da Economia, a começar nas Universidades, onde se ensina que uma e outra não se casam, é que permite que homens sem escrúpulos queiram tudo para si e nada para os outros, embora alguns sejam religiosos. Calvino, séculos antes, compreendendo que a actividade comercial dos burgueses de Genebra, já nessa ocasião especulativa, não se coadunava com a prática cristã, criou a Doutrina da Predestinação para justificar a riqueza de uns e a pobreza de outros, o que, em termos de doutrina evangélica, foi e é uma aberração.
Esta Crise Financeira, antes de tudo, entronca-se na crise geral de valores, que há muito assola o Ocidente. Perdeu-se a dimensão ética que deve presidir aos actos humanos. E para isto acontecer, foi necessário primeiro desumanizar o homem, afastando-o da sua dimensão espiritual, que na nossa civilização tem Jesus Cristo e os seus ensinamentos como referências fundamentais. A perda destes fundamentos espirituais e culturais está a levar-nos para um beco sem saída. Dizia o insuspeito Napoleão de Bonaparte que um povo sem Deus, é como um assaltante na estrada. Ou seja, nada respeita. Efectivamente o que falta, antes de tudo, é a presença de Deus no coração e na mente dos homens, tendo-o como fonte inspiradora do Bem. O homem verdadeiramente crente, reconhece no outro um seu irmão e como tal o respeita. Há que retomar urgentemente estes princípios antes que nos afundemos todos
Artur Rosa Teixeira
Subscrever Pravda Telegram channel, Facebook, Twitter