Umberto Martins *
Este foi o grito que percorreu as ruas de Atenas, capital da Grécia, nesta quarta-feira (10). A cidade foi ocupada por milhares de trabalhadores e trabalhadoras do setor público, que paralisaram os serviços por 24 horas e realizaram uma grande manifestação contra as medidas econômicas de corte neoliberal anunciadas pelo governo em resposta à crise econômica que castiga o país e a chamada zona do euro.
Afetada pela crise mundial do capitalismo, a Grécia acumula uma dívida pública que se aproxima de 113% do PIB e um déficit (de 12,7% em 2010) quatro vezes superior ao estreito limite (3%) estipulado pela União Europeia. Com os bancos europeus e os grandes investidores receosos de continuar emprestando dinheiro, taxas de juros em alta e dúvidas crescentes sobre a capacidade de pagar ou refinanciar os débitos, o país parece às portas de uma moratória. O fato, aliado a perturbações fiscais em outros países do velho continente (como Portugal, Espanha e Itália), abalou a credibilidade do euro e deprimiu os mercados de capitais em todo o mundo nos últimos dias.
Pacote de maldades
Sob pressão dos credores e das maiores potências europeias, com destaque para a Alemanha (sua maior credora), o governo liderado pelo primeiro-ministro George Papandreou pretende impor duras medidas de contenção dos gastos públicos, focado basicamente na redução de direitos e conquistas do funcionalismo.
O pacote de maldades divulgado pelas autoridades gregas inclui a redução dos salários reais dos trabalhadores e trabalhadores; fim do pagamento de bônus; elevação da idade mínima para obter o direito à aposentadoria, para 63 anos; aumento dos preços dos combustíveis; congelamento das contratações e supressão de subsídios.
FMI rejeitado
O funcionamento de escolas, tribunais e repartições públicas foi afetado pelos protestos. A paralisação dos controladores do tráfego aéreo forçou o cancelamento de voos domésticos e internacionais.
Foi realizada uma passeata até o Ministério do Trabalho que durou 90 minutos. O governo montou um forte aparato repressivo e a polícia dispersou manifestantes reunidos no centro da capital com bombas de gás lacrimogêneo. O Partido Comunista grego também organizou um ato diante do Parlamento contra os cortes propostos. Proprietários rurais também estão protestando por maiores subsídios à agropecuária.
A União Europeia rejeitou o malfadado socorro sugerido pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), cujos funestos efeitos no chamado Terceiro Mundo são mundialmente conhecidos. Todavia, a receita recomendada à Grécia pela grande burguesia europeia não difere muito. Possui o mesmo caráter de classe.
Luta de classes
Em essência, a receita de Papandreou para contornar a crise fiscal é orientada pelo interesse de preservar os investimentos e os lucros do sistema financeiro. Ele promete reduzir o déficit de 12,7% para menos de 3% ao longo dos próximos três anos, cortando na carne da classe trabalhadora e reduzindo subsídios aos produtores rurais. Em resumo, arrochando o funcionalismo o governo garantiria recursos para honrar o pagamento dos juros da dívida pública. É uma operação Hobin Hood ao avesso, que subtrai renda dos pobres para alimentar a ganância dos ricos e na qual o Estado se mostra um dócil instrumento da oligarquia financeira.
A receita é antiga e não difere daquelas que foram impostas no passado a países como o Brasil pelo FMI ao longo da chamada crise da dívida externa, que custaram décadas de desenvolvimento e uma intolerável depreciação da força de trabalho. Em poucas palavras, o governo grego e a União Europeia propõem que a classe trabalhadora pague pela crise mundial do capitalismo, de modo a assegurar os privilégios da banca internacional, que é de longe a maior responsável pelas turbulências financeiras.
A reação das ruas, liderada pelo movimento sindical e por forças políticas progressistas, nos dá a medida da luta de classes que a crise despertou, evidenciando o choque de interesses antagônicos entre capital e trabalho. A classe trabalhadora quer inverter a lógica do jogo capitalista e seu pleito transparece claramente na palavra de ordem que ecoou quarta-feira no centro da histórica capital grega: Os ricos que paguem a crise. Na prática, isto significa preservar direitos e conquistas sociais e, ao mesmo tempo, transferir os prejuízos da crise aos seus reais promotores, os grandes capitalistas, especialmente os parasitas que se nutrem da dívida pública. A moratória pode ser o preço a pagar neste caso, mas é um custo muito mais justo e tolerável do ponto de vista social.
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