Crise alimentar mundial: Jóia na coroa de quem?

O tão-badalado modelo político e económico que os países do mundo adoptaram com tanta esperança, cujas virtudes há tanto tempo e por tantos foram proclamadas, tem apenas um problema: não funciona. A economia de mercado baseia-se em fundamentais que são demasiado fáceis de corromper pela especulação e o actual modelo de social democracia nem é democrático nem o seu componente social basta para endereçar as necessidades dos cidadãos do mundo. A crise alimentar mundial é um exemplo esplendente do desastre em que este modelo se tornou.

De acordo com a ONU, pelo menos 100 milhões de pessoas correm o risco de enfrentarem graves faltas de alimentos por causa da alta nos custos – uma tendência crescente que lesa especialmente os mais pobres nos países em vias de desenvolvimento, onde tipicamente, 80% do orçamento familiar se destina a alimentos.

Entre 2006 e 2007, os preços dos alimentos aumentaram 37% e entre 2007 e 2008, por 56%, enquanto o preço dos cereais no mesmo período sofreu um incremento de 74%. Este salto sem precedentes põe em questão alguns dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.

Causas

As causas são muitas – o crescimento nas populações e em rendimentos criaram uma demanda/procura maior; condições meteorológicas e a concentração em bio-combustiveis em certas zonas reduziram a oferta e depois uma miríade de condições impostas por gula e especulação. Preços de petróleo a aumentar em flecha levaram a uma alta em custos de transportação e fertilizantes, levando agricultores a reduzirem a produção por dois terços em algumas áreas, que por sua vez aumentou ainda mais os preços. Políticas de compra motivadas mais por pânico do que por senso e o jogo nos preços das commodities – um passatempo tão popular nos dias de hoje, que envia ondas de choque quase diariamente através das economias da comunidade internacional – fizeram o resto.

Efeitos

Como sempre, os mais afectados são as mulheres e as crianças em geral e em especial, os órfãos, os doentes (SIDA/AIDS e VIH), os refugiados e Pessoas Internamente Deslocadas, nómadas e a população urbana pobre.

Os efeitos concretos para estas pessoas são três escolhas nuas e cruas: entre comer algo todos os dias ou comer mais em alguns dias e nada nos outros, gastar dinheiro em comida ou medicamentos e enviar as crianças à escola ou ao campo para trabalharem. Antigamente era nas escolas onde muitas crianças comiam uma refeição equilibrada. Hoje, muitas encontram, se tanto, um prato de arroz.

Soluções

A ONU realça o facto que a situação não é uniformemente muito grave em todas as regiões mas no entanto avisa que há mais que 100 milhões de pessoas em risco. Fez planos para uma ofensiva de três fases: no curto prazo, uma missão para buscar informações, identificar os mais vulneráveis e canalizar a distribuição; no médio prazo, programas de distribuição de sementes, fertilizantes e uma extensão de crédito; e a longo prazo, os planos incluem reformas políticas para fomentar a produção e investimento em redes de segurança alimentar sustentáveis.

Contudo, um belo comentário sobre a nossa comunidade internacional de hoje é providenciado pelo facto que falta ao Programa Alimentar Mundial da ONU a soma de 755 milhões de USD, num mundo onde se prefere desperdiçar centenas, senão milhares, de biliões de dólares no acto de chacina no Iraque do que fornecer serviços públicos numa escala global. Mas que sistema maravilhoso, esse.

A crise alimentar mundial é uma jóia esplendente na coroa de um sistema político e económico cuja única razão de ser foi historicamente constituir um cravo no pé do Socialismo e que não descansava enquanto não gastava triliões de dólares e empregava políticas assassinas para tentar (em vão) sabotar o modelo. O resultado é cristalino: caos no sistema monetária internacional, caos na economia global, caos no fornecimento de uma necessidade tão básica como comida na mesa para centenas de milhões de pessoas.

Este sistema não funciona.

Timothy BANCROFT-HINCHEY

PRAVDA.Ru

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey