A disputa pelo Ártico

Onde há fumaça, há fogo. No início deste mês, um submarino russo cravou a bandeira nacional no solo submerso do Ártico, numa versão moderna dos antigos navegadores europeus. Uma nova corrida do ouro está começando, desta vez nesta inóspita e longínqua região. A questão principal ali não é bem se os ursos polares estão ameaçados pelo aquecimento global; os objetos do desejo são justamente as causas maiores do efeito estufa: gás e petróleo.

A região tem gigantescas reservas de gás e petróleo, mais uma prova de que os combustíveis renováveis não impedirão o crescimento da indústria petrolífera. Por esta razão, mais do qualquer outra, cresce a importância política e estratégica do Ártico.

No local reivindicado (também) pelos russos, está o que eles chamam de parte submersa da cadeia de montanhas Lomonosov, que alegam ser a continuação da plataforma continental siberiana, mas são contestados pelo Canadá e Dinamarca, que pretendem provar que as montanhas submarinas são parte das respectivas plataformas continentais. O recuo da camada de gelo em direção ao Norte facilita a passagem de navios de prospecção, e cada país luta pelo direito - se é que algum há - de explorar as riquezas locais. Atualmente, a região é considerada neutra, águas internacionais – é o que dizem os EUA, outro grande interessado nas reservas energéticas locais.

A disputa tem tudo para se tornar uma enorme confusão – e espera-se que jamais um sério conflito -, pois o Canadá, que já enviou para lá dois navios militares, pleiteou a soberania do Pólo Norte em 1950, e uma arbitragem internacional determinou que assim seria, desde que nenhuma outra nação requeresse o mesmo num período de cem anos, mas outras quatro, por enquanto, estão na disputa: EUA, Noruega, Rússia e Dinamarca.

Por ali há também o arquipélago de Svalbard, sob a soberania da Noruega, a cerca de mil quilômetros ao Norte de sua linha costeira, mas uma cláusula de um antigo acordo internacional dá a outros países o direito de explorar seus recursos naturais, embora a Noruega conteste o acordo, alegando que só dá direito exploratório às demais nações nas regiões de terra, e não às jazidas sob as águas que cobrem sua plataforma continental. Mas é claro que a questão é vista de outro ângulo sob a perspectiva dos outros países.

Há mais um ingrediente nesta encrenca: a Passagem do Noroeste, ao longo da linha costeira dos EUA, que pode ligar o Atlântico e o Pacífico, pela primeira vez na História está praticamente aberta à navegação; seu gelo está muito fino, como jamais se viu, um efeito-cascata do aquecimento global. O trajeto é considerado uma rota estratégica de transporte de carga.

Não é difícil imaginar o que acontecerá quando (e não mais se) começar a exploração econômica da região, com a prospecção de petróleo e gás e a passagem de navios. Vai sem dizer o risco de vazamentos.

A poluição no Ártico é disfarçada por sua aparência; resíduos são transportados para lá pelas correntes de ar, e os níveis de mercúrio e outros dejetos industriais já podem ser mais altos do que nos países que os produzem. Aquela que era considerada a última região virgem do planeta está em via de deixar de sê-lo.

O fato de cinco países cobiçarem jazidas de óleo e gás situadas em uma região tão inóspita mostra como é grande o poder de sedução de uma fonte de energia que já vem pronta, embora seu uso seja classificado como grande gerador de emissões de gás carbônico.

Luiz Leitão

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey