Os carrões da PF

A Polícia Federal vem prestando excelentes serviços no combate ao crime, especialmente o organizado, e o exemplo mais eloqüente disso é a investigação de desvios de RS$ 15 bilhões em obras públicas entre 2000 e 2008, a maioria dos casos através do superfaturamento.


A boa atuação da PF, no entanto, não combina com o uso político que o Planalto faz dela, evidenciado pela lerdeza com que conduz inquéritos nos quais averiguados ligados ao governo ou ao PT tiveram participação em casos rumorosos. O mais recente exemplo dessa conduta foi a inédita alegação de “dificuldades técnicas” para fazer escuta nos telefones de Romênio Pereira, secretário do partido suspeito de envolvimento no desvio de dinheiro de obras públicas, justamente aquele setor do próspero ramo da corrupção onde mais se rouba o erário.

Estes desvios de conduta são inaceitáveis para uma instituição “republicana”, como gosta de defini-la o ministro da Justiça, Tarso Genro, responsável, em última análise, pela longevidade destas práticas.


Outra mazela daquela organização policial, até aqui pouco criticada, é o uso que seus delegados fazem de automóveis de luxo apreendidos em suas operações. Não é razoável a Justiça autorizar policiais a utilizar carros de R$ 300 mil ou mais, como o Porsche Carrera, um esportivo para apenas dois passageiros, para “uso em serviço e segurança dos agentes e de seus familiares”.


Afinal, sabe-se que pelo menos um delegado da PF, lotado na Agência Brasileira de Informações (Abin), usava um automóvel BMW X5 avaliado em cerca de R$ 300 mil para se deslocar de casa para a sede da agência, ou seja, dele dispunha como automóvel particular.


Em outro exemplo da impropriedade deste tipo de concessão, o insigne delegado Protógenes Queiroz é alvo de sindicância interna da PF para apurar o uso de um Land Rover que estava sob sua responsabilidade, apreendido de uma empresa.


É temerária a utilização destes veículos por funcionários públicos por uma razão singela: se os acusados forem absolvidos, eles lhes deverão ser devolvidos; se não, irão a leilão e o dinheiro arrecadado reverterá em favor do Tesouro. Ainda que todos estejam cobertos por seguro feito por seus ainda legítimos donos, em caso de acidente o pagamento do sinistro, muito provavelmente, será recusado pelas seguradoras, que alegarão uso diverso da finalidade prevista em contrato.


Além disso, o desgaste e o aumento da quilometragem aceleram a depreciação dos automóveis, causando prejuízos aos seus donos, sejam eles os atuais ou venha a ser o Estado.


Neste caso, como em tantos outros, é sempre difícil separar o público do privado, e não é difícil que os carrões venham a ser usados no dia-a-dia por aqueles que forem nomeados seus fiéis depositários.


Cabe à direção da PF e ao Judiciário coibir a prática. E ao governo federal, que bate recordes de arrecadação de tributos, deve prover recursos suficientes para o seu pleno funcionamento. Agir de outra maneira será uma sandice, porque as operações desencadeadas pela Federal, só na área dos crimes de colarinho branco, mais do que justificam maior generosidade do Executivo em relação a ela.


Luiz Leitão [email protected]

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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