José Serra e o caos na saúde pública

ALTAMIRO BORGES

Nas suas recorrentes campanhas eleitorais – para presidente, prefeito da capital paulista, governador de São Paulo e, provavelmente, outra vez para a presidência em 2010 –, o ex-ministro da Saúde na gestão de FHC e atual governador do estado, José Serra, sempre procura vender a imagem do político preocupado com a saúde do povo. Porém, a prática, que é o critério da verdade, desmente o seu marketing eleitoreiro. Num curto espaço de tempo, o presidenciável tucano coleciona péssimas notícias neste front. Se fosse um governador da base de apoio do presidente Lula, ele seria espinafrado pelas manchetes dos jornais e pelos âncoras da TV. Mas, como protegido da mídia, pouco se fala sobre o caos na saúde pública em São Paulo.

A redução de investimentos e o completo sucateamento do setor levaram o Sindicato dos Funcionários de Hospital das Clinicas a solicitar o fechamento imediato do prédio para uma rigorosa vistoria. Para Itamar Fernando, presidente da entidade, a medida abrupta, que penalizaria a população carente, é urgente “antes que alguma tragédia maior aconteça”. No último dia 24, ocorreu um principio de incêndio no sexto andar do prédio, interrompendo o atendimento hospitalar por 20 minutos. Foi o terceiro incidente somente neste mês de janeiro. Já na noite de Natal de 2007, outro grave incêndio atingiu o edifício e obrigou a remoção dos pacientes. A unidade ficou fechada por nove dias e milhares de consultas e exames foram suspensos.

Uma lucrativa mercadoria

A gravidade da situação já atemoriza os próprios pacientes. Maria José Antunes, de 52 anos, que passou por uma cirurgia no HC em meados de janeiro, lembra que ficou apavorada com o odor de queimado. “Os médicos me acalmaram e explicaram que o cheiro era ainda do incêndio do Natal. Isso é um absurdo”. O mesmo quadro de abandono se verifica no Hospital do Servidor Público de São Paulo. Em novembro de 2007, a direção do órgão demitiu 212 funcionários, incluindo 55 médicos. A medida visou reduzir custos e veio acompanhada de novas terceirizações. “Os pacientes sentem o reflexo das decisões arbitrárias, que prenunciam o caos”, desabafou Otelo Junior, presidente da Associação dos Servidores do Iamspe.

O caos na saúde pública de São Paulo reflete bem a opção neoliberal do presidenciável José Serra, que ainda engana os inocentes com a sua retórica “desenvolvimentista”. Como afirma Benedito de Oliveira, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde (Sindsaúde), o setor se encontra degradado “e não é por falta de recursos financeiros. São Paulo é o estado mais rico do país. É uma questão de prioridades. O governo não investe na saúde porque decidiu há mais de dez anos transferir os serviços públicos para o setor privado”. Primeiro, o tucanato entregou os hospitais novos para os abastados empresários. Depois, reformou antigas unidades e as repassou às chamadas Organizações Sociais de Saúde (OSS), uma forma marota de privatização. “Se o maior hospital da América Latina está vulnerável a um incêndio, como estão os subterrâneos e dutos de outros hospitais públicos de São Paulo?”, questiona o dirigente sindical.

Reação autoritária e histérica

Na prática, a saúde pública virou lucrativa mercadoria na gestão tucana! Diante das críticas dos pacientes e dos servidores – que ainda registram o brutal arrocho dos salários, as péssimas condições de trabalho e ausência de concursos para repor o quadro funcional –, o governador Serra esbanjou sua truculência. Num ataque de histeria, afirmou que “o incêndio pode ter sido criminoso” e rejeitou a proposta da entidade dos servidores de interdição do HC até a sua vistoria completa. “O sindicato lá é petista. Torce pelo pior e age com base em provocação para enfraquecer a direção do HC. Isso é provocação petista”. A insinuação de “incêndio provocado” e o ataque ao sindicato até mereciam processo na Justiça por calúnia e difamação.

A experiência mundial demonstra que neoliberalismo não combina mesmo com a democracia. A qualquer crítica ou pressão, os neoliberais escancarados ou enrustidos partem para a violência. José Serra não foge à regra. Ele já demitiu dirigentes sindicais e ativistas metroviários que lideraram uma greve em defesa do veto presidencial à Emenda-3, da precarização do trabalho, num visível atentado à Constituição. Também se recusa a negociar com lideranças do MST as pendências relativas à reforma agrária. A truculência e a intransigência são marcas deste tucano. “O que se espera de um governador é maior sensatez”, pondera o presidente do Sindicato dos Médicos, Cid Carvalhaes. Mas de José Serra isto é pouco provável.

Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB e autor do livro “As encruzilhadas do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi, 2ª edição).

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