Paulo Passarinho (*)
O IBGE acaba de divulgar os números referentes ao desempenho da economia no primeiro trimestre desse ano. Esses números reforçam o otimismo daqueles que julgam que a atual política econômica nem tão atual assim, pois em curso desde o início do segundo mandato de FHC, em 1999 é a mais adequada ao nosso desenvolvimento.
O crescimento do PIB alcançou a marca de 5,8%, tanto na comparação com o primeiro trimestre do ano passado, quanto em relação ao acumulado nos últimos 12 meses, embora esse comportamento da economia de janeiro a março tenha apresentado uma elevação de apenas 0,7% em relação ao último trimestre de 2007, o que indica uma clara desaceleração no ritmo do crescimento observado nos últimos meses.
Pelo lado do consumo, e sempre com base na comparação com o mesmo trimestre de 2007, o aumento dos gastos das famílias (6,6%), do governo (5,8%) e dos investimentos (15,2%) sustentaram esse crescimento. Entretanto, o crescimento das importações (18,9%) e os resultados das exportações (-2,1%) continuam a sinalizar uma mudança negativa nos números da balança comercial, com a redução dos seus saldos e a conseqüente degradação nos resultados das transações correntes (soma das transações de comércio e serviços do país com o resto do mundo).
O consumo das famílias tem se sustentado há 18 trimestres consecutivos em crescimento - pela expansão do crédito, puxado por mecanismos como o empréstimo consignado, e, em menor grau, pelo crescimento da massa salarial. Entretanto, em comparação com o último trimestre de 2007, a expansão do consumo das famílias neste primeiro trimestre foi de apenas 0,3%, o que pode indicar que há sinais de esgotamento nessa fase expansionista recente.
Pelo lado da oferta, o crescimento da indústria (6,9%) e dos serviços (5%) foram os responsáveis maiores por esse bom desempenho da economia, caso a olhemos apenas através da frieza dos números. A taxa de investimento (proporção de gastos com investimentos em relação ao PIB) neste primeiro trimestre manteve-se em elevação (18,3%), porém continuando muito abaixo da taxa de 25%, estimada para uma sustentabilidade duradoura de um crescimento de médio e longo prazo.
Conforme já frisamos em artigos anteriores, os resultados negativos nos saldos das transações correntes são o principal indicador que não nos permite concordar com o otimismo destilado pelas autoridades econômicas, e amplamente repercutido pela grande imprensa e seus comentaristas. Isso nos faz voltar à dependência de capitais externos que ingressam no Brasil, sob a forma de investimentos diretos (aquisição de empresas já existentes e/ou abertura de novos negócios) ou de aplicações de natureza financeira (títulos públicos, bolsa de valores). No primeiro caso, esses investimentos acabam por impactar mais ainda as despesas, em moeda forte, com a remessa de lucros, dividendos e pagamento de royalties.
Além disso, sabe-se que, por precariedade dos mecanismos fiscalizatórios, filiais de empresas estrangeiras (mas também empresas nacionais, vide o caso Daslu) muitas vezes usam e abusam de fraudes em suas operações de importações, exportações e desvio de recursos para o exterior.
No segundo caso, aplicações financeiras, o efeito dessas operações pode deixar o país mais vulnerável às oscilações do mercado financeiro mundial, cada vez mais suscetível a crises repentinas, que fazem com que esses capitais possam ser repatriados frente a qualquer instabilidade financeira, independentemente da origem da crise aqui se localizar. Na maior parte dos casos, são capitais em busca de alta rentabilidade, no menor espaço de tempo possível, e que aqui procuram compensar, através de lucros financeiros absurdos, eventuais prejuízos contraídos em negócios realizados em outras praças.
Em suma: o remédio para compensar os déficits em conta corrente do nosso balanço de pagamentos pode significar apenas o adiamento de uma crise futura, de natureza cambial, conforme inúmeras vezes já experimentamos.
Porém, até o momento, apenas abordamos algumas considerações de ordem funcional para o equilíbrio econômico-financeiro do modelo em curso na economia brasileira. Ficamos até aqui, limitados às considerações relativas à frieza dos números. E não compartilhamos do mesmo futuro antevisto pelo governo, seus aliados e a grande imprensa, especialmente pela clara dependência que voltamos a ter de capitais externos para o financiamento das nossas contas externas.
Nesse quadro, quero destacar que continuaremos a caminhar na perspectiva do aprofundamento do nosso papel subalterno na nova divisão internacional do trabalho, onde temos nos especializado enquanto um mercado exportador de matérias primas energéticas e produtos agrícolas, ao mesmo tempo em que nos consolidamos enquanto um mercado consumidor de produtos de média e alta tecnologia, de acordo com os planos de negócios de transnacionais aqui instaladas, e cada vez mais dominantes do nosso parque produtivo.
Esses segmentos, inclusive, cada vez mais operam com peças e componentes importados, o que faz com que os resultados da balança comercial desses setores com o exterior sejam crescentemente deficitários, mesmo levando-se em conta a atividade exportadora dessas verdadeiras montadoras internacionais de produtos tecnológicos.
Destacamos, também, queesse caminho faz com que as conseqüências desse modelo de desenvolvimento se é que assim podemos chamá-lo fortalece cada vez mais as empresas de atuação multinacional, como as verdadeiras gestoras da vida econômica de nossa sociedade, com impactos extremamente negativos nas mais diferentes áreas, do meio-ambiente ao padrão de educação formal do sistema de ensino.
Recentemente, o governo divulgou o anúncio de uma chamada Política de Desenvolvimento Produtivo, onde se procuraria atingir metas importantes para o desenvolvimento industrial em áreas de alta tecnologia, em setores como o de produção de softwares, biotecnologia, nanotecnologia, equipamentos de saúde, tecnologia da informação, dentre outros. Contudo, com as restrições impostas pela política macroeconômica, e com a própria prevalência de empresas transnacionais no segmento industrial mais desenvolvido tecnologicamente, as justas intenções desse referido plano vão encontrar imensas dificuldades para se transformarem em realidade palpável e benéfica para a imensa maioria da população brasileira.
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(*) Vice-presidente do CORECON-RJ
www.cofecon.org.br
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