O socialismo possível
A longa crise em que vive o sistema capitalista no mundo do inteiro desde a última década do século passado, tem levado inúmeros pensadores a voltar a cogitar de uma sociedade socialista como remédio para os males da humanidade.
Istvan Meszaros recuperou aquele famoso dito de Rosa Luxemburgo de que a opção ao socialismo é a barbárie, ao qual ele acrescentou um adendo: na melhor das hipóteses.
Slavoj Zizek, Alain Bandiou e Jacques Rancieri, cada um a sua maneira, têm escrito e falado alertando que o capitalismo, financeiro e globalizado, perdeu aquele vigor antigo de destruir o velho para construir o novo e hoje é apenas uma força que destrói a natureza e empregos no mundo inteiro, transformando milhões de pessoas em não-vivos ou semivivos.
Ao lado desses pensadores europeus com essa visão do socialismo, se destaca um brasileiro, Jacob Gorender, que infelizmente morreu em 2013, com o livro Marxismo sem Utopia.
O livro pode ser dividido em três etapas. Na primeira, Gorender faz uma revisão de alguns conceitos de Marx, reforçando o papel do acaso nas transformações sociais e defendendo a impossibilidade de extinção do Estado, como propunha o autor do Manifesto Comunista.
Na segunda parte, analisa o fracasso da experiência soviética a partir de duas variáveis: as dificuldades materiais da União Soviética, oriundas dos erros de sua política de planejamento econômico e a falta de democracia interna do país, onde o chamado "centralismo democrático" substituiu a participação popular em quase todos os seus níveis. Nem por isso, é um descrente na possibilidade de reconstruir o ideal socialista a partir dos ensinamentos de Marx e Engels e mesmo das experiências dos mais de 70 anos de vida na União Soviética.
Diz Gorender: "Sendo uma possibilidade, o socialismo não decorrerá de leis históricas inelutáveis. Tão pouco decorrerá de um imperativo ético, como propunha Bernstein, pois será uma possibilidade inscrita objetivamente na história. O objetivo socialista se colocará como opção para as tendências anticapitalistas radicais, que os próprios males do capitalismo suscitarão. Este objetivo se implementará sob a forma e conteúdo muito variados, de acordo com as peculiaridades históricas de cada povo".
Para a consecução desse objetivo revolucionário, Gorender se aproxima de uma das teses fundamentais de Lenin, que em 1917 dizia que o proletariado não estava ainda preparado para comandar revolução, que deveria então ser liderada por intelectuais comprometidos com as aspirações dos trabalhadores.
As modificações profundas que ocorreram nas relações de trabalho desde o Manifesto Comunista, levou Gorender a sintetizar como poderia ser este novo mundo socialista.
1) Permanência da divisão do trabalho entre físico e intelectual, sob a hegemonia de assalariados intelectuais.
2) Socialismo como objetivo abrangente em uma única fase, deixando de lado a visão utópica de Marx sobre o comunismo.
3) Permanência do Estado, sob o controle socialista ao invés de sua extinção.
4) Um sistema de democracia pluralista no socialismo.
5) A combinação de planejamento e mercado na economia socialista.
Marino Boeira é jornalista formado em História pela UFRGS
Subscrever Pravda Telegram channel, Facebook, Twitter