Elis merecia um filme melhor
Elis, o filme, dirigido por Hugo Prata, contando a história de vida da maior cantora brasileira de todos os tempos, Elis Regina, se sustenta apenas pela interpretação de Andreia Horta.
Além da semelhança física com a grande cantora gaúcha (1945/1982), Andreia defende com muita garra a sua interpretação, conseguindo em muitos momentos dar credibilidade a um roteiro mal costurado, que tenta colocar nas duas horas do filme todos os momentos importantes da vida da cantora.
Com isso, algumas sequências chegam à beira do ridículo, como o do pretenso interrogatório de Elis pelos militares, irritados pelo fato de que ela teria chamado os generais de gorilas, numa entrevista dada em Paris
A preocupação dos roteiristas do filme de "limpar a barra" de Elis, os fez incluir uma sequência de cenas quase inverossímeis pelo modo como são apresentadas. Depois de ser pressionadas pelos militares, Elis aceita cantar na Olímpiadas do Exército. Vendo na televisão, estas imagens, o cartunista Henfil a inclui na lista dos mortos vivos (charges que publicava no Pasquim) Posteriormente, Elis cobra de Henfil por isso, e ele dá um discurso lembrando que, enquanto ela cantava para os militares, os presos políticos eram torturados. Os dois vão se reconciliar quando ela grava O Bêbado e o Equilibrista, falando no irmão do Henfil, "que partiu num rabo de foguete".
Os fatos, mesmo que sejam verdadeiros, perdem a sua credibilidade pela maneira como são colocadas no filme e parecem mostrar apenas a preocupação do diretor e roteiristas de explicar alguns comportamentos pouco corretos da cantora.
Com isso, em muitos momentos, o filme lembra uma novela de televisão, onde os personagens são quase sempre falsos, recitando frases e diálogos inverossímeis.
Dito isso, a conclusão é de que não vale à pena ver o filme?
Não.
Algumas das muitas canções que Elis canta (a atriz Andreia Hora faz todo o gestual, mas voz de é de Elis) conseguem emocionar os expectadores do filme, principalmente os mais velhos, que acompanharam sua carreira
0s atores que fazem os dois grandes amores de Elis, Reinaldo Boscoli e Cesar Camargo Mariano, respectivamente, Gustavo Machado e Caco Cocler, estão convincentes, assim como Júlio de Andrade, que vive o cantor e bailarino, Lane Dale.
A reconstituição da época é boa, a fotografia é correta e as músicas que Elis canta são ótimas.
Mas, em vez de se arriscar saindo de casa, de gastar dinheiro com o ingresso no cinema, quem sabe não vale à pena por um velho LP na vitrola e ouvir mais uma vez, sentado na sua poltrona predileta, mais uma das canções de Elis?
Você só não tem a imagem de Elis (ainda que falsa), mas a voz, o que realmente importa, essa você pode ouvir quantas vezes quiser.
Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS
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