ARTHUR CHARLES CLARKE (1917-2008)
No dia 19 deste mês, morreu o escritor inglês de ficção científica Arthur Clarke, o último autor realmente grande neste gênero, aos 90 anos de idade. Sua obra mais conhecida é 2001 Uma Odisséia no Espaço, escrita a pedido do diretor Stanley Kubrick, que a transformou no filme de ficção científica mais emblemático (e, para muitos, até hoje insuperável).
Clarke era formado em física, e durante a Segunda Guerra Mundial trabalhou em estações de radares um dos elementos mais importantes na defesa da Grã-Bretanha durante os ataques aéreos massivos da Alemanha em 1940. Logo depois da guerra, em 1945, elaborou uma proposta para colocar satélites artificiais em órbita geoestacionária (ou seja, sempre sobre um mesmo ponto do planeta) para permitir transmissões de rádio a toda a Terra esta órbita passou a ser conhecida como órbita Clarke, e foi a primeira elaboração teórica dos satélites de telecomunicações que permitem a transmissão de informação em tempo real em todo o mundo.
A partir do final dos anos 40, passou a dedicar-se a obras de ficção e divulgação científica, sendo um dos mais famosos e excelentes no gênero. Um conto breve desta época é O Sentinela, que contém o tema básico do 2001: na Lua se encontra um objeto alienígena antiqüíssimo, que prova que nosso planeta fora visitado por uma civilização muito avançada antes que existisse a humanidade, e que foi a responsável pela evolução da inteligência na Terra. Esta foi a origem do famoso monolito que aparece no 2001.
Este tema aparece em outro famoso romance de Clarke, O Fim da Infância.
Este livro também lida com questões paranormais, pelos quais o autor na época se interessava.
Muitos críticos afirmam que suas obras têm uma psicologia pobre, o que é verdade: comparando com os grandes mestres da literatura tradicional, seus personagens são unilaterais e pouco profundo. No entanto, suas obras são de ficção realmente científica, pois estão baseadas em fatos (e não em fantasias absurdas, como em muitos autores do gênero), e repletos de dados fascinantes. Por exemplo, no 2001 as descrições de Japetus, lua de Saturno, são quase proféticas, considerando que na época em que o livro foi escrito muito pouco se conhecia sobre os planetas externos e seus complexos sistemas de luas.
Em 1956, mudou-se para o Sri Lanka, onde viveu até a morte. Adorava seu novo país, e adquiriu a cidadania cingalesa. Em 1959, contraiu pólio, que depois começou a deixá-lo paralítico, e já na década de 80 passou a usar uma cadeira de rodas. Daí surgiu seu interesse pelo mergulho: o ambiente aquático lhe parecia semelhante à imponderabilidade experimentada em viagens espaciais, e por isso não sentia nenhuma restrição ao movimento.
Em 1998, o tablóide sensacionalista The Sunday Mirror acusou-o de abusar de crianças cingalesas. A polícia do Sri Lanka, porém, jamais encontrou nenhuma evidência, e o próprio jornal depois se retratou. No ano 2000, Clarke se tornou cavaleiro do Império Britânico.
Clarke sempre foi bastante crítico com as religiões, chegando mesmo a afirmar no seu livro 3001 que esta é a loucura da humanidade. Outro conto, A Estrela, afirma que a estrela que guiou os reis magos até a manjedoura onde nasceu o Cristo foi uma supernova que destruiu uma próspera e pacífica civilização. Se bem que é verdade que muitos crimes foram cometidos em nome da religião, não significa que esta tenha a culpa: qualquer doutrina, por mais nobre que seja, pode ser deturpada e servir de pretexto para atos cruéis.
Além disso, Clarke cometeu o erro, bastante comum, de crer que o ateísmo é uma postura científica e racional. Não temos elementos para afirmar que existe um ser supremo, mas também não temos nenhum para negá-lo, e o ateísmo é uma questão de fé igual a qualquer crença religiosa. A única postura realmente científica, neste tipo de questões, é o agnosticismo, como bem notou o cientista (e também ocasional escritor de ficção) Carl Sagan.
Por outro lado, Arthur Clarke sempre mostrou uma grande fé nos valores humanistas. Acreditava que a humanidade deveria unir-se pacificamente para explorar e colonizar outros planetas, em vez de desperdiçar recursos e vidas em guerras. Era muito crítico do setor militar-industrial e um conto seu dos anos 50 mostra um supercomputador programado por um gênio anarquista para responder sempre com impropérios toda vez que tentam usá-lo em questões bélicas. Além disso, já nas suas primeiras obras se nota sua postura de tolerância não apenas para com todas as culturas e religiões, mas também com diferentes opções sexuais.
No seu aniversário de 90 anos, celebrado em outubro do ano passado, Arthur Clarke afirmou que seus três maiores desejos eram: que a humanidade consiga contatar-se com uma civilização alienígena, que dependa menos do petróleo, e que termine a guerra civil no Sri Lanka. Infelizmente, morreu sem vê-los cumpridos.
Carlo MOIANA
Pravda.ru
Buenos Aires
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