Por ANTONIO CARLOS LACERDA
Correspondente no Brasil
BRASILIA/SÃO LUIS (BRASIL) - A governadora do Estado do Maranhão, no Nordeste do Brasil, Roseana Sarney, filha do senador José Sarney, presidente do Congresso Nacional, foi acusada pelo jornal Estadão de lavagem de dinheiro, segundo documentos bancários.
Roseana Sarney teria simulado empréstimo de R$ 4,5 milhões no Banco Santos para resgatar US$ 1,5 milhão na Suíça, mas, ao negar, disse ser muito estranho que uma denúncia fantasiosa, de seis anos atrás, seja desenterrada agora que estamos em plena campanha eleitoral.
Já a ex-ministra Dilma Rousseff, aliada política da governadora e candidata à Presidência da República pelo PT, partido de sustentação do Governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso, disse que não se baseia em matéria de jornal e quer provas antes de falar sobre o caso.
Segundo o jornal, documentos que estão nos arquivos do Banco Santos indicam que a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, e seu marido, Jorge Murad, simularam um empréstimo de R$ 4,5 milhões para resgatar US$ 1,5 milhão que possuíam no exterior.
Os documentos, obtidos pelo Estadão (incluindo um relatório confidencial do Banco Santos), dão detalhes da operação, montada legalmente no Brasil, com um prazo de seis anos. Os relatórios mostram, no entanto, que o empréstimo foi pago por meio de um banco suíço cinco dias depois da liberação dos recursos no Brasil.
O dinheiro foi, segundo os documentos, investido na compra de participações acionárias em dois shoppings, um em São Luís e outro no Rio de Janeiro. O Banco Santos teria servido apenas como ponte para Roseana e Murad usarem os dólares depositados lá fora, operação conhecida por "back to back".
O acordo ocorreu em julho de 2004 entre a governadora, seu marido e Edemar Cid Ferreira, ex-dono do Banco Santos, que quebrou quatro meses depois e está sob intervenção judicial até hoje.
Edemar é íntimo da família Sarney, tendo sido padrinho de casamento de Roseana e Murad. Condenado a 21 anos de cadeia, Edemar Cid Ferreira chegou a ser preso, mas recorreu e responde em liberdade. Ele foi condenado por crime contra o sistema financeiro, lavagem de dinheiro, crime organizado e formação de quadrilha. O rombo no Banco Santos foi estimado em R$ 2,9 bilhões.
Segundo a reportagem, os documentos reforçam os indícios que a família Sarney sempre negou: que tem contas não declaradas no exterior.
O administrador judicial do Banco Santos, Vânio Aguiar, teria confirmado a autenticidade dos documentos. "Eu não sabia da existência deles. Mandei levantar e confirmo a existência desses documentos que você me mostrou nos arquivos do banco", teria dito Aguiar ao Estadão.
Os documentos mostram que coube à então secretária de Edemar Cid Ferreira, Vera Lucia Rodrigues da Silva, informá-lo sobre o pagamento no exterior, através de mensagem eletrônica enviada por ela às 11h56m do dia 03 de agosto de 2004. "Dr. Edemar. A Esther/UBS confirmou hoje o crédito de 1.499.975,00, aguarda instruções. Vera Lucia".
Vera Lúcia referia-se a Esther Kanzig, diretora do banco UBS em Zurique, na Suíça, que, segundo ex-diretores do Banco Santos ouvidos pelo Estadão, representava os suíços nas relações com Edemar Cid Ferreira.
Por sua vez, Edemar Cid Ferreira responde a Vera Lucia às 12h47m e demonstra que essa era uma prática rotineira do banco: "Vera, proceder da mesma maneira que da vez anterior com a distribuição entre administradores qualificados. Grato, ECF."
O Banco Santos não tinha autorização para atuar no exterior e, segundo as investigações sobre sua falência, Edemar usava off-shores laranjas para receber recursos fora do Brasil, afirma a reportagem.
A operação com a família Sarney começou no dia 29 de julho de 2004, quando Roseana e Murad assinaram o contrato de empréstimo de número 14.375-3, no valor de R$ 4,5 milhões, em nome da Bel-Sul Administração e Participações Ltda.
Na época, a governadora detinha 77,9% da Bel-Sul, seu marido, 22,1%, e o dinheiro foi liberado no mesmo dia e investido nos dois shoppings, no Rio de Janeiro e em São Luís do Maranhão.
Segundo o contrato, a Bel-Sul teria de pagar o empréstimo ao Banco Santos em cinco parcelas até 27 de dezembro de 2010. Cinco dias depois da concessão do empréstimo, em 3 de agosto de 2004, a Bel-Sul, mostram os documentos, liberou US$ 1,5 milhão para Edemar Cid Ferreira, através de uma conta no UBS.
Essa história é fantasiosa, diz advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, que representa a governadora Roseana Sarney e seu marido, Jorge Murad. Ele afirmou que o empréstimo foi regular no Brasil.
"Eles (Roseana e Murad) desconhecem a existência desses documentos sobre recursos no exterior. Esse é um problema que o banco tem de explicar. O empréstimo foi regular e quitado. Essa história é fantasiosa", disse Almeida Castro.
Aliado de Sarney
A transação entre a governadora, seu marido e o Banco Santos envolveu ainda mais um aliado da família Sarney: Miguel Ethel Sobrinho, ex-presidente da Caixa Econômica no governo de José Sarney e, até o ano passado, conselheiro da fundação que leva o nome do presidente do Congresso Nacional do Brasil.
Miguel Ethel detém 50% da Participa Empreendimentos, empresa que vendeu as ações dos shoppings São Luís, na Maranhão, e Nova América, no Rio de Janeiro, à Bel-Sul, empresa administrada por Jorge Murad, marido de Roseana.
Segundo o processo de empréstimo, a Bel-Sul compraria, na época, 5% das ações da Participa no shopping Nova América e 10% da sociedade dela no empreendimento de São Luís, no Maranhão.
O ex-presidente da Caixa e seu sócio, Walter Luiz Teixeira, foram denunciados em 2007 pelo Ministério Público Federal por lavagem de dinheiro e sonegação fiscal, além de alvos da Operação Kaspar 2, que desmontou um esquema de remessa irregular de dólares ao exterior, envolvendo bancos, doleiros e empresas.
Segundo o Estadão, os documentos mostram ainda que Roseana Sarney, então senadora da República, participou pessoalmente da operação financeira, assinando, junto com o marido, o empréstimo como representante da Bel Sul e como avalista da cédula de crédito bancário.
De acordo com o processo financeiro, o dinheiro foi liberado em 29 de julho de 2004, mas só em 2007 a empresa da família Sarney começou a pagá-lo. Foram oito transferências eletrônicas entre 15 de janeiro de 2007 e 26 de fevereiro deste ano para quitar a transação no Brasil.
Segundo ex-diretores do Banco Santos, Edemar Cid Ferreira precisava de dólares no exterior nos meses que antecederam a quebra do banco, em novembro de 2004. Operação semelhante, por exemplo, realizou em agosto daquele ano com a Odebrecht, segundo o processo de falência do Banco Santos.
Em troca do acordo com a família Sarney, Edemar Cid Ferreira teria acertado devolver os recursos à Bel-Sul durante o pagamento das prestações. Segundo ex-funcionários próximos a Edemar, ele acreditava, naquele período, que ainda poderia salvar o Banco Santos.
Hoje, a governadora Roseana Sarney, candidata à reeleição, não é mais sócia da Bel-Sul, tendo transferido sua participação a sua filha, Rafaela, mas a administração continua com seu marido, Jorge Murad.
Em 2002, cotada nas pesquisas eleitorais para ganhar a Presidência da República, Roseana perdeu a chance de disputar as eleições depois do "escândalo Lunus", quando uma operação da Polícia Federal encontrou R$ 1,3 milhão na empresa Lunus, de Roseana e seu marido.
A candidata do PT à presidência da República, Dilma Rousseff, afirmou que não pode se basear em notícias de jornal para eventualmente comentar acusações contra a governadora do Maranhão e candidata à reeleição, Roseana Sarney.
"É importante noticiar que nunca no Brasil se combateu tanto a lavagem de dinheiro. Antes, não tínhamos uma política sistemática (de lavagem de dinheiro). (Sobre o caso Roseana) não me baseio em matéria de jornal", disse a petista.
Ao comentar políticas de combate à lavagem de dinheiro, Dilma disse que, se eleita, pretende dar continuidade a parcerias como a da Polícia Federal e do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) - consideradas por ela exitosas - e manter investigações "não baseadas só em escândalos".
A candidata do PT à Presidência da República disse que só depois de conhecer os documentos do Banco Santos sobre a operação que permitiram a sua aliada política, a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, e seu marido Jorge Murad, resgatar US$ 1,5 milhão depositados na Suíça, é que se manifestará sobre o fato.
Dilma Rousseff alegou que não pode se basear em acusações de jornais. "Eu tenho de ver as provas e aí, sim, eu me manifesto", alegou. Ela destacou que manterá as medidas adotadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, "não apenas baseada só em escândalos", mas por acreditar que o desempenho do Brasil nessa área, eliminou "rotas" do tráfico de dinheiro de origem desconhecida.
"Então, eu vou dar continuidade a essa política, não baseada só em escândalo, mas como uma política institucional, que vem para ficar de forma sistemática", destacou.
Dilma Rousseff lembrou que o desempenho do Brasil contra a lavagem de dinheiro foi reconhecido pelo Departamento de Estado do governo dos Estados Unidos, sobretudo quanto a seus efeitos em relação ao terrorismo internacional.
"O relatório do Departamento de Estado reconhece que o Brasil foi o País que deu um combate sem trégua à questão da lavagem de dinheiro, com relação ao problema do terrorismo internacional, eliminando as rotas de tráfico de dinheiro pelo mundo afora", afirmou.
A candidata do Governo à Presidência da República sugeriu que quando da publicação de matérias sobre lavagem de dinheiro, os órgãos de imprensa informem também que, ao contrário do que acontecia antes, o combate tem sido intenso no País.
"É importante, quando vocês noticiarem, noticiar também que nunca no Brasil se combateu tanto a lavagem de dinheiro, através da Polícia Federal, do Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeiras), e junto com toda a articulação internacional".
A governadora Roseana Sarney disse que a denúncia tem caráter eleitoral para prejudicá-la na campanha à reeleição, e desmentiu irregularidades no empréstimo, mas não nega ter dinheiro no exterior. Para ele, o episódio tem relação com a descoberta de gás no Maranhão.
"É muito estranho que uma denúncia fantasiosa, de seis anos atrás, seja desenterrada agora que estamos em plena campanha eleitoral, quando todas as pesquisas apontam uma tranqüila liderança para a minha candidatura, afirmou Roseana Sarney.
"Não fiz nada de ilegal, não devo nada a ninguém e para mim este assunto está encerrado", disse a governadora do Maranhão. "Mais uma vez, em época de campanha eleitoral, repito, começam a surgir denúncias e acusações descabidas, ofendendo minha honra e meu passado", ressaltou.
ANTONIO CARLOS LACERDA
PRAVDA R U BRASIL
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