É absolutamente dramático o caso do desaparecimento do voo MH370 da Malaysia Airlines com 239 pessoas de 14 nacionalidades a bordo, dos quais 153 eram cidadãos chineses. O moderno Boeing 777-200 decolou da capital malaia Kuala Lampur no início da madrugada de sábado, 08 de março de 2014, com destino a Pequim, na China. Quase uma hora após a decolagem, o avião, em princípio, sumiu sem deixar quaisquer vestígios.
Helder Caldeira*
Desde então, num emaranhado de informações oficias desencontradas e muitas especulações, 25 países somam esforços para tentar descobrir o paradeiro de um gigante com quase 300 toneladas, equipado com o que há de mais moderno em termos de tecnologia de aviação. Para além da provável catástrofe, o acúmulo dos dias de buscas vãs e equivocadas é proporcional à atrocidade protagonizada pelas autoridades que, em última instância, parecem despidas de respeito aos familiares das possíveis vítimas.
Soa inverossímil crer que uma aeronave de tais proporções e com vários sistemas de comunicação que independem da ação humana possa desaparecer sem que os mais incríveis aparatos tecnológicos desenvolvidos nos últimos 50 anos sejam capazes de encontrar alguma pista de sua localização. Sabe-se, por exemplo, que governos e agências oficiais de espionagem são capazes de localizar com precisão um telefone celular, vasculhar seu histórico de navegação e chamadas e até rastrear e ler mensagens enviadas. Como não conseguem encontrar um avião? Inverossímil e bastante improvável.
Algo semelhante aconteceu em 30 de janeiro de 1979 com um Boeing 707 de uma companhia aérea brasileira. O avião cargueiro da antiga Varig deixou Tóquio, no Japão, com destino ao Rio de Janeiro e, concluiu-se naquele tempo, desapareceu misteriosamente no Oceano Pacífico. Nele viajavam seis tripulantes e uma carga de 20 toneladas, destacando-se uma valiosa coleção com 153 trabalhos do artista plástico nipo-brasileiro Manabu Mabe. Seis anos depois, o escritor e poeta baiano Oswaldo Profeta - também ex-rádio-operador da Força Aérea Brasileira (FAB) e amigo do comandante do cargueiro desaparecido - publicou o romance "O Mistério do 707" (Editora Hamburg, 1985, 272 págs.), onde defende a tese de que um erro na rota levou o avião da Varig, em plena vigência da Guerra Fria, a invadir o espaço aéreo da então União Soviética, onde foi abatido por ordem do presidente comunista Leonid Brejnev.
O visível - e não menos bizarro - embaraço de informações e dados da Malaysia Airlines e do governo também suscita o desvelar de teorias e pode colocar em xeque o já tumultuado ambiente do sudeste asiático. Nas primeiras e cruciais 48 horas apontaram que as buscas deveriam concentrar-se no Golfo da Tailândia, nas dimensões do suposto último contato do voo MH370, o que também incluiria domínios marítimos do Vietnã e do Camboja. Naquele momento, hipóteses como sequestro e terrorismo foram descartadas com veemência, apesar da constatação de que dois passageiros iranianos embarcaram com passaportes roubados em território tailandês. Mero acaso?
Logo depois, diante das fortes críticas internacionais, o governo da Malásia afirmou que outros dados indicavam a possibilidade de sequestro da aeronave, já que o Boeing 777-200 teria desviado violentamente à esquerda da rota prevista no plano de voo. Assim, teria cruzado a região sul da tensa República de Myanmar e alcançado o Estreito de Malaca, na Indonésia. Todos os olhos miraram a região e, novamente, nenhum êxito.
Contraditórios e beirando a imoralidade - propositalmente? -, a junta de países envolvidos nas buscas sacou da cartola novas informações. O avião da Malaysia teria deixado o Estreito de Malaca e seguido a noroeste, em direção ao Mar de Andamão, mais de sete horas após o último contato com o controle aéreo malaio, quando o piloto - que, apesar da experiência de quase 20 mil horas de voo, era muçulmano e convenientemente passou a integrar a lista de suspeitos - despediu-se com um singelo "boa noite".
Uma semana depois do sumiço, com a ajuda do Serviço de Inteligência dos EUA, a área de busca foi maciçamente ampliada, tanto em mar - desde a Baía de Bengala até o Oceano Índico -, quanto em terra, incluindo os territórios da Índia, Bangladesh, Sri Lanka, Laos, Nepal e o Paquistão e Cazaquistão, destinos hipotéticos dos supostos sequestradores da aeronave.
Cumpre questionar: diante de tantas contradições, quem tem credibilidade suficiente para garantir que o voo MH370 não invadiu o espaço aéreo de um desses países e, diante da ausência de comunicação e consequente identificação, foi abatido? Para além de constrangedor e criminoso, o desencontro das autoridades permite a existência e força desta teoria.
Resta-nos a esperança de que, algum dia e de alguma forma, as famílias e amigos dos passageiros e tripulantes possam ter algum conforto nesta ausência, neste vazio. E mais: o caso malaio também deixa uma gravíssima e perturbadora advertência. Nunca tantos aviões cruzaram os céus do planeta; nunca antes tantas pessoas utilizaram o avião como meio de transporte; aeroportos lotados e malhas aéreas congestionadas; e países governados por incompetentes falaciosos - como o Brasil! - tratando com enorme desleixo o controle do tráfego aéreo e a aviação civil. Os especialistas insistem garantir que voar ainda é mais seguro que andar de bicicleta. Será mesmo?
O extraordinário jornalista William Waack, em sua habitual elegância na condução e mediação dos debates do programa GloboNews Painel, frequentemente faz uso da seguinte asserção: "é quase um dever do jornalista transformar raciocínios sofisticados em frases brutais". Eia, pois, bruta conclusão: após uma semana de buscas ininterruptas, ninguém consegue encontrar um elefante escondido na garagem. Acredite se quiser!
HELDER CALDEIRA
Escritor, Jornalista Político e Conferencista
www.heldercaldeira.com.br - [email protected]
*Autor dos livros "ÁGUAS TURVAS" e "A 1ª PRESIDENTA".
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