A reunião de um grupo de fanáticos e puritanos, os Procuradores da República no Paraná, com um Juiz sedento de fama, criou a 'República de Curitiba' e dela nasceu esse monstrengo jurídico chamado Operação Lava Jato, alimentado pelas delações premiadas de corruptos assumidos e promovido por uma imprensa pouco ética.
O problema é que depois que soltaram os demônios, eles não querem mais voltar para o seu antigo inferno. Os golpistas, que estimularam suas primeiras denúncias, estão vendo agora elas se voltarem contra o seu centro de decisão, hoje encastelado no governo de Temer.
Mas quem são esses grandes atores que mantém aceso o fogo destruidor da Lava Jato, os Procuradores da República?
Nascidos de uma decisão política, tomada na Constituição de 1998 de garantir a independência dos Procuradoria da República na fiscalização dos atos do Executivo, eles abominam a política e se regem por seus próprios códigos, onde a lei é vista como algo imutável e eterno.
Seu Alcorão é composto pelos códigos civil e criminal. Sonham com uma versão ocidental da "sharia", esquecidos que vivem numa sociedade capitalista movida pela busca do lucro a qualquer custo e onde a política se mistura perigosamente com os negócios.
Em vez de usar seus poderes para buscar uma depuração desse processo, usando os mecanismos da lei para punir os infratores, sem por em risco as instituições, eles preferem histericamente destruir o nosso tênue sistema democrático, ao disseminar a ideia de que todos os políticos são corruptos e que o Brasil pode viver sem eles.
O lema que eles defendem e que segmentos alienados da população repetem, de que é preciso passar o País a limpo, tem uma inequívoca conotação fascista, na medida que pretende por na lata do lixo todos os avanços democráticos penosamente conquistados nos últimos anos.
Ao mirar no PT como seu alvo principal, eles não estão fazendo apenas uma opção ideológica, eles estão dando um recado preconceituoso de que, um partido que pretende representar os trabalhadores, não pode ser valer, dentro de uma sociedade burguesa, dos mesmos instrumentos que durante décadas permitiram aos outros partidos chegarem ao poder.
O jogo de influências numa sociedade capitalista não prescinde do dinheiro. Na forma direta do papel moeda passado de mão em mão, das transferências eletrônicas para bancos suíços ou de oferta de posições de poder que vão gerar vantagens logo adiante, é o dinheiro que rege todas as relações que movem um país para frente.
E não é apenas no Brasil. Nos Estados Unidos, que alguns ainda apelidam de "A Grande Democracia do Norte" vimos na recente disputa Hillary Clinton X Donald Trump, uma pública e contabilizada conta de chegar, entre as duas candidaturas, para ver quem arrecadava mais dinheiro dos grandes empresários. Obviamente, lá como aqui, não será um dinheiro dado, mas um dinheiro emprestado que deve voltar com juros e correção aos seus donos.
Todo mundo está cansado de saber que nem os empresários, nem a maioria dos políticos, nem os partidos, querem acabar com esse sistema, aprovando, por exemplo, o financiamento estatal das campanhas políticas.
Assim como está, todos têm chances de ganhar.
Diante desse quadro, quem são os moralistas de cuecas? São os procuradores, com o seu jacobinismo fora de época, que agem como analfabetos políticos, no dizer de Bertold Brecht; são os empresários sonegadores que financiam as campanhas dos alienados que repetem nas ruas os slogans fascistas de passar o País à limpo e são, ainda, os veículos da imprensa venal que transforma tudo isso em grandes manchetes.
Quando concorreu pela quarta vez à Presidência, Lula deixou bem claro que, dessa vez, iria à disputa para ganhar. Isso significou um grande acordo com partidos de centro e com empresários e obviamente, significou também a necessidade de abrir mão, pelo menos durante algum tempo, das bandeiras mais radicais do PT.
Lula cumpriu o trato, ao mesmo tempo, que conseguiu realizar algumas das promessas que fez aos seus eleitores. Foi reeleito e elegeu Dilma duas vezes. Foram campanhas milionárias (como também foram as dos demais partidos) e ninguém é ingênuo para supor que elas pudessem ser possíveis sem grandes verbas, sem o investimento de muito dinheiro.
Como ocorreu com todos os principais candidatos (aqueles com chances de ganhar), foi um dinheiro que entrou por vias legais e também por outras nem tanto. Até mesmo a campanha do falecido Eduardo Campos e da vestal Marina Silva, foi turbinada com dinheiro desviado de órgãos públicos.
Errado?
Claro.
Mas como mudar esse quadro?
Talvez começando por fechar a torneira maior que irriga a famosa Caixa 2: o financiamento empresarial.
Ocorre que nos 14 anos de governo do PT, como na Rússia stalinista, criou-se também uma "nomenklatura", que não resistiu à tentação de por no bolso uma parte de tanto dinheiro que circulava nos negócios, teoricamente destinados a apoiar o partido.
E não foi apenas o PT e seus políticos que se beneficiaram. Todos os demais partidos que se integraram às campanhas de Lula e Dilma, disputaram com unhas e dentes uma parte nesse butim. Como disse o Ministro Barroso do Supremo, ninguém é ingênuo para supor que os cargos de mando nos órgãos públicos eram disputados por pessoas que queriam apenas servir o País.
Muitos dos nomes, que participaram dos governos do PT, como Padilha, Geddel, Jucá e Moreira Franco, sempre vistos como suspeitos de negócios pouco éticos, estão ou estiveram no governo de Temer, comprovando que, nesse jogo, existe pouca fidelidade ideológica.
Independentemente de que muitas das acusações que estão sendo feitas a políticos do PT, possam não ser verdadeiras, parece pouco provável que todas sejam falsas.
O mais provável é que esses longos anos junto às fontes do poder na República criaram uma banda podre no PT, que agora permite que uma boa parte da opinião pública, insuflada por uma mídia interessada em destruir o partido, enxergue nesse fato o fim de qualquer possibilidade de, através de um partido de inspiração popular, mudar o centenário quadro de dominação das elites brasileiras sobre todo o País.
Marino Boeira é jornalista, formado em História pela UFRGS
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