À espera dos meganavios
O porto de Santos vive uma permanente corrida contra o tempo. Quem tiver dúvida que acompanhe os números de movimentação de cargas dos últimos anos que logo vai descobrir que, na última década, o porto cresceu mais que a economia do País e mais ainda que o seu comércio exterior.
Milton Lourenço (*)
O porto de Santos vive uma permanente corrida contra o tempo. Quem tiver dúvida que acompanhe os números de movimentação de cargas dos últimos anos que logo vai descobrir que, na última década, o porto cresceu mais que a economia do País e mais ainda que o seu comércio exterior.
Se assim não fosse, não teria suportado tanta demanda, que o levou de 70º lugar em 2000 entre os portos do mundo em movimentação de contêineres para 39º em 2006. A continuar nessa trajetória, não será necessário aguardar outros seis anos para vê-lo entre os 20 primeiros.
Outros números mostram como tem sido acelerado esse crescimento: de 60 milhões de toneladas movimentadas em 2003, chegou a 76 milhões em 2006, com previsão de movimentar 81 milhões em 2007. Em teus (twenty-feet equivalent unity, unidade-padrão referente ao contêiner de 20 pés de comprimento), esse crescimento foi ainda mais brutal: saiu de 946 mil em 2001 para 2,446 milhões em 2006.
É um avanço que, nos últimos tempos, passou a registrar taxas anuais de incremento além de 10% em média. Como se sabe, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, apesar da boa fase atual da economia, cresceu menos de 3% em 2006. Há um flagrante descompasso que só não é mais evidente porque o País não vive, por exemplo, a fase de milagre econômico por que passam China e Índia.
De qualquer modo, o comércio exterior do País saltou de US$ 110 bilhões em 2002 para US$ 233 bilhões em 2006, ou seja, mais que dobrou suas trocas comerciais nos últimos quatro anos. E o porto de Santos tem sido responsável por 26% da balança comercial brasileira. Não é pouco.
Atrás de Santos nessas estatísticas vem o porto de Vitória-ES, com apenas 8% de toda a movimentação, seguido pelo Aeroporto de Viracopos, em Campinas, com 6%, e o porto de Paranaguá-PR, com 5%. A distância de Santos em relação aos demais portos é ainda maior, quando fazemos outras projeções. Por exemplo: 29% do comércio com os EUA passam por Santos. E não só 58% do comércio exterior paulista como também 56% do comércio exterior de Goiás passam pelo porto santista.
Diante desses números, não se pode dizer que o porto de Santos não se tem adequado aos desafios. Ainda há poucos dias, passaram por Santos alguns meganavios porta-contêineres com quase 300 metros de comprimento. Um deles, o Maersk Dartford, com 292 metros e capacidade para 4.230 teus, foi o maior a fazer escala em Santos. Antes dele, já estiveram outros porta-contêineres, além de bulk-carriers (graneleiros) como o Kitsa, de 273 metros de comprimento, e grandes navios especializados em transportar veículos (roll-on-roll-off).
Até agora, a infra-estrutura do porto de Santos tem sido suficiente para suportar a entrada desses meganavios, mas quem vive o dia-a-dia das questões portuárias não pode deixar de sentir uma certa inquietação quanto ao futuro. Até porque, em razão das deficiências, esses grandes navios gastam muitas horas para atracar.
Como se sabe, já está em operação o Emma Maersk, com 397 metros de comprimento e 13 mil teus de capacidade, considerado o maior do mundo, e não se sabe se o porto de Santos teria estrutura para recebê-lo. Para se ter uma idéia do seu gigantismo, basta saber que 13 mil teus equivalem à superfície de quatro campos de futebol.
Parece fora de dúvida que o futuro dos mares pertence a esses meganavios que são projetados para longas distâncias e com grande capacidade de armazenagem, com escalas rápidas em portos específicos, que tornam suas operações comercialmente viáveis. Por isso, é de grande importância o trabalho de dragagem que vem sendo feito para adequar o estuário santista minimamente às condições exigidas para que esses meganavios atraquem e entrem em operação. São investimentos a longo prazo que prevêem a aplicação de US$ 25 milhões durante 15 ou 20 anos. Tudo para aprofundar o leito do canal do estuário dos atuais 12 ou 13 metros para 17 metros de calado.
Se esse desafio será superado, só o tempo dirá, pois, como se sabe, a velocidade dos investimentos estatais é sempre muito inferior à dos investimentos privados. De qualquer modo, parece inevitável que o porto de Santos deverá passar os próximos anos superando sucessivos recordes. Até porque a iniciativa privada cansou de esperar pelo poder público e resolveu tomar à frente de muitas decisões, construindo vários terminais privados que vão ampliar a capacidade de transporte do País e diminuir o chamado custo Brasil.
Só na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) existem mais de 25 solicitações para a construção de terminais de uso privativo e misto. Ou seja, muitas empresas estão criando seus próprios portos para escapar das dificuldades que encontram nos portos públicos e suas infra-estruturas saturadas. É o caso do porto de Navegantes-SC.
Talvez a saída seja mesmo uma divisão mais equânime da capacidade de carga dos portos brasileiros. De consolo fica a conclusão de que esses problemas só existem por que o País vive a chamada crise do crescimento. Ainda bem.
(*) Milton Lourenço é diretor-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP (www.fiorde.com.br). E-mail: [email protected]
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