A santidade do apedeutismo

HELDER CALDEIRA*

A ignorância é a mãe de todas as mazelas. Engessa pessoas e aniquila populações. Fideliza eleitores e endossa governos. Por séculos a fio, a regra número um dos mandatários era manter seus povos no mais absoluto desconhecimento. Era a ignorância das massas o fator preponderante da santidade de alguns supostos líderes. O tempo passou, a informação horizontalizou e o mundo mudou. Mas não para todos.

 

Vejamos um belíssimo exemplar em curso. O julgamento do Mensalão e a condenação maciça dos réus deste monumental escândalo de corrupção é motivo de farta festa e comemoração nas redes sociais, com direito a levante virtual a clamar por uma insana candidatura do ministro-relator no STF, Joaquim Barbosa, à Presidência da República em 2014. Cada voto de Barbosa é comemorado como um gol da seleção brasileira em final de Copa do Mundo. Cada contestação do relator leva a plateia ao delírio e faz o ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, sentir-se a mãe do juiz.

 

Ao contrário do que pregava o ex-presidente Lula da Silva, apaniguador dos larápios, o Supremo Tribunal Federal atestou a existência de um esquema milionário articulado pelo PT na cúpula do Poder Executivo para comprar a fidelidade e a dignidade de alguns lambões nauseabundos do Poder Legislativo. Com argumentos incontestes, estão saindo condenações tão duras quanto profiláticas, restando apenas o julgamento do crime de formação de quadrilha e a tão aguardada definição de quais serão as penas imputadas a essas figuras espúrias do cenário político brasileiro.

 

Ainda assim, não é preciso um olhar mais apurado para concluir que o julgamento do Mensalão no governo Lula não exerceu influência no resultado das eleições municipais que correram paralelamente. A tangência só foi observada nas tratativas entre partidos políticos e os famigerados doadores de campanha, agora mais cautelosos ao colocar a mão no bolso para financiar essa turma e os milhões colocados em jogo para tentar garantir-lhes alguma vitória. Já o grande eleitorado, sustentáculo do ambiente democrático, não consegue enxergar relação entre o lé da eleição e o cré da corrupção.

 

O que se confirma é que ficha limpa, tribunais de conta, responsabilidade fiscal, controladorias, fiscalização e afins são palavras que escapam ao vocabulário político da maioria dos brasileiros. Distante léguas dos cidadãos comuns, o latinório de missa dos ministros do STF sequer é compreendido. Ademais, nem à tecla verde das urnas eletrônicas é reservada deferência por ser chancela de uma democracia, ainda que entrecortada por arremedos. Ao contrário, o voto tem servido às questões paroquiais, imediatistas, quase invariavelmente umbilicais.

 

Ao que tudo indica, o investimento na santidade do apedeutismo surtiu grandiosos efeitos para a politicagem brasileira. Consagrados a ignorância, o populismo apequenado e o assistencialismo maquiavélico, qual será a utilidade do conhecimento, do saber? Noves fora, restam as constatações tétricas. Oh, São Lula das Massas Apedêuticas, rogai por nós... ainda que não recorramos a vós! Amém.

 

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Escritor, Jornalista a Apresentador de TV

www.ipolitica.com.br - [email protected]

*Autor do best-seller "A 1ª PRESIDENTA" (Editora Faces, 2011, 240 páginas) e Jornalista e Comentarista Político da REDE RECORD, onde apresenta o "iPOLÍTICA". Acaba de lançar seu primeiro romance de ficção: "ÁGUAS TURVAS" (Editora Faces, 2012, 278 páginas).

 

 

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