Deus e o Universo Holográfico
(Parte 1)
“Por certo são maravilhosas as conquistas da ciência moderna.
Contudo a melhor forma de conhecer os segredos da natureza
não é inventar instrumentos, mas, sim, o investigador
aperfeiçoar-se a si mesmo. O homem tem em si faculdades
que eliminam a distância, em grau muito maior do que os mais
potentes telescópios e microscópios podem consegui-lo,
em comparação com o olho nu. Esses sentidos ou faculdades
são os meios de investigação usados pelos ocultistas,
sendo também, por assim dizer, o ‘abre-te Sésamo’
na procura da verdade.”
(Max Heidel, em Conceito Rosacruz do Cosmos
– ou Cristianismo Místico, 1909)
por Fernando Soares Campos
Desde o princípio do processo civilizatório, observamos curiosos as realidades manifestas no universo conhecido, sejam concretas (no âmbito da matéria) ou abstratas (na dimensão das ideias). Nos últimos séculos vimos nos esforçando para compreender a origem do Universo e a constituição de todas as coisas ― os elementos que as compõem ―, enfocando fenômenos inerentes à manutenção da vida e, mais recentemente, nos ocupando da decodificação de teorias científicas cujas propostas, em alguns casos, encerram argumentos meramente especulativos, caracterizados por hipóteses viáveis ou, em alguns casos, de resultados improváveis. Nessas condições, especulamos sobre a origem do Universo, tudo aquilo que está ao alcance de nossas vistas e sentidos em geral, e o fazemos com ou sem a utilização de instrumentos e recursos apropriados.
A abóbada celeste, o céu visto por dentro, com aparência esférica, é tão somente uma ínfima parcela do espaço cósmico conhecido, apenas a parte visível a olho nu e possível de ser explorada de maneira mais profunda utilizando-se de instrumentos e mecanismos adequados, aplicando métodos científicos, de forma que possamos pesquisar, concluir e, daí, argumentar sobre o comportamento deste universo acessível aos nossos sentidos básicos. Tal firmamento, até onde podemos comprovar, concentra trilhões de estrelas que, sistematicamente agrupadas, formam constelações e completas estruturas que denominamos galáxias. Foi assim que descobrimos a influência que os astros mais próximos de nós, como a Lua, o Sol e demais planetas orbitantes ao nosso astro-rei, exercem sobre a vida na Terra.
Além de toda essa grandeza literalmente astronômica, externa ao nosso Planeta, nossos sentidos básicos também são impressionados pelos próprios acidentes geográficos localizados na crosta da Terra: campos e florestas; as águas em suas diversas concentrações, sejam os mares e oceanos, rios e lagos, as nuvens e o fenômeno da chuva; o fogo, as rochas, a imensa variedade de animais e vegetais, tudo isso sempre inquietou a alma humana, despertando em cada um de nós, com variado grau de interesse, o desejo de conhecer o começo e o fim da extensão do universo, a origem e o destino da humanidade. Queremos saber como se processam os nossos pensamentos, o que eles são em suas essências e como se formam os sentimentos e afetividades que geram em nós as emoções e até descontroladas paixões. Quem somos? De onde viemos? Por que estamos aqui? O que queremos deste mundo? Estaríamos submetidos a determinado e irrevogável destino ou poderíamos mudar uma possível rota fatalista? Alguns de nós passamos grande parte de nossas vidas tentando encontrar respostas para essas questões que ocupam nossa mente e nos abandonam na instável dimensão da dúvida.
Em noites de Lua, com o céu desanuviado, temos oportunidade de contemplar as estrelas e tantos outros corpos celestes, luminosos ou iluminados. Também podemos eventualmente assistir a fenômenos naturais, tais como: eclipse, estrela cadente, passagem de um cometa. Quem se posicionar nas proximidades dos polos da Terra pode vir a observar as auroras boreal e austral, deslumbrantes fenômenos ópticos em forma de grande tecido luminoso, multicor, com listas horizontais ou espiraladas se estendendo, em alguns casos, por centenas de quilômetros.
Diante da imensidão do firmamento, apreciando os inúmeros aglomerados estrelares, sentimo-nos competentes para comparar a Terra a um grão de areia no deserto, sugerindo que este nosso planeta é insignificante quando comparado à infinitude do Universo. Entretanto, durante o dia, quando o Sol brilha, provocando a dispersão dos seus raios luminosos, colorindo a atmosfera terrestre, ocultando a visão que à noite tivemos dos distantes corpos celestes, então, nós mesmos, que nos impactamos diante da grandeza e esplendor do universo observável, pasmamo-nos diante da vastidão dos mares, das gigantescas cadeias de montanha, das imensas geleiras nas regiões polares, dos vastos desertos, das intensas florestas e de tantas outras grandiosidades geográficas do nosso “minúsculo” planeta. Encantamo-nos até mesmo com as amplas extensões de algumas obras humanas, tais como as pirâmides egípcias, pontes quilométricas, usinas hidrelétricas, arranha-céus, metrópoles. E, se lá nos confins do Cosmos ocorrem assustadoras colisões de galáxias, choques e explosões de estrelas, aqui na Terra ocorrem fenômenos cataclísmicos aterrorizantes, devastadores: furacão, terremoto, tsunami, nevasca, tempestade, erupção vulcânica... que geralmente ferem, mutilam e matam.
Acontece que à noite, quando nos apequenamos diante da magnitude do firmamento, nos tornamos propensos a negar a nossa responsabilidade sobre a manutenção e o equilíbrio da Natureza. Portanto, em vista da nossa incapacidade de elaborar efetiva representação mental de infinito e eternidade, uma dúvida angustiante assoma à nossa alma, e muitos de nós preferimos acreditar que do Nada viemos e ao Nada retornaremos. Porém cada alvorecer nos revelando a Terra em todo o seu esplendor desperta-nos para a Realidade, que traz em si os princípios da Verdade.
Os diversos credos religiosos fundamentados em confissão de fé cristã (seja católico, batista, luterano, calvinista, ou qualquer outro) diferenciam-se entre si basicamente pelas interpretações que os líderes de cada denominação religiosa dão às escrituras tidas como sagradas. A compreensão e aceitação de tais entendimentos geralmente condicionam-se ao grau de instrução de cada indivíduo e ao desenvolvimento do seu poder de cognição, além de geralmente estarem atreladas aos interesses imediatos de indivíduos ou de castas. Entretanto, se analisadas com o espírito despojado de sentimentos inferiores, como, por exemplo, o orgulho ilusório, e de paixões sem reserva, pode-se perceber que tais interpretações, apesar das aparentes divergências verificadas entre as denominações religiosas, estariam todas manifestando, fundamentalmente, os mesmos conceitos.
“Todos os caminhos levam a Roma”, no entanto existem os mais ou menos curvos, os mais ou menos íngremes, os bem pavimentados e os esburacados, os mais largos e os mais estreitos, enfim, os mais ou menos adequados, os que oferecem maior ou menor risco, maior ou menor esforço para se alcançar uma meta. Também concluímos que, entre os fatores que distinguem as religiões entre si, as versões que elas dispõem sobre a identidade de Deus e o destino das almas após a morte concorrem para as divergências.
“Nem todos os caminhos são para todos os caminhantes”
(Johann Goethe)
O Espiritismo, doutrina fundamentada no conjunto de cinco livros que recebe a denominação de Codificação Kardequiana (de Allan Kardec), trata, na obra intitulada Livro dos Espíritos, da definição daquilo que vem a ser Deus, as provas de sua existência e os atributos da divindade. Também desenvolve temas relacionados com a imortalidade da alma, a natureza dos espíritos e suas relações com o homem, entre outras abordagens. O livro é composto de 1018 perguntas elaboradas por Kardec, e as respostas teriam sido dadas por espíritos que já alcançaram alto grau de evolução moral. A primeira pergunta é: “O que é Deus?”, a qual recebeu a seguinte resposta: “Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”.
– O que não tem começo nem fim; o desconhecido; tudo o que é desconhecido é infinito.
– Definição incompleta. Pobreza da linguagem dos homens, que é insuficiente para definir as coisas que estão acima de sua inteligência.
‒ Num axioma que aplicais às vossas ciências: não há efeito sem causa. Procurai a causa de tudo o que não é obra do homem, e a vossa razão vos responderá”.
Segue-se um comentário de Kardec: “Para acreditar em Deus, basta ao homem lançar os olhos sobre as obras da criação. O Universo existe, portanto ele tem uma causa. Duvidar da existência de Deus seria negar que todo efeito tem uma causa e admitir que o Nada pudesse fazer alguma coisa”.
Atributos da Divindade
Ainda extraído do Livro dos Espíritos:
10 – O homem pode compreender a natureza íntima de Deus?
– Não, falta-lhe, para isso, um sentido.
11 – Um dia será permitido ao homem compreender o mistério da Divindade?
– Quando seu Espírito não estiver mais obscurecido pela matéria e, pela sua perfeição, estiver mais próximo de Deus, então o verá e o compreenderá. [Aqui se refere a Deus Personificado, um ser eternizado, que tem começo mas não tem fim, perpétuo; divinizado, em vista do seu alto grau de evolução, aquele a quem se atribui a condição de Deus, por exercer liderança suprema sobre os habitantes de imenso espaço cósmico.]
Comentário de Kardec: “A inferioridade das faculdades do homem não lhe permite compreender a natureza íntima de Deus. Na infância da humanidade, o homem O confunde muitas vezes com a criatura, da qual lhe atribui as imperfeições; mas, à medida que o senso moral nele se desenvolve, seu pensamento compreende melhor o fundo das coisas, e ele faz uma ideia de Deus mais justa e mais conforme ao seu entendimento, embora sempre incompleta”.
12 – Se não podemos compreender a natureza íntima de Deus, podemos ter ideia de algumas de suas perfeições?
– Sim, de algumas. O homem as compreende melhor à medida que se eleva acima da matéria [densa]. Ele as pressente pelo pensamento.
13 – Quando dizemos que Deus é eterno, infinito, imutável, imaterial, único, todo-poderoso, soberanamente justo e bom, não temos uma ideia completa de seus atributos?
– Do vosso ponto de vista, sim, porque acreditais abranger tudo. Mas ficai sabendo bem que há coisas acima da inteligência do homem mais inteligente, e que a vossa linguagem, limitada às vossas ideias e sensações, não tem condições de explicar. A razão vos diz, de fato, que Deus deve ter essas perfeições em grau supremo, porque se tivesse uma só de menos, ou que não fosse de um grau infinito, não seria superior a tudo e, por conseguinte, não seria Deus. Por estar acima de todas as coisas, Ele não pode estar sujeito a qualquer instabilidade e não pode ter nenhuma das imperfeições que a imaginação possa conceber.
Mais uma vez, comenta Kardec: “Deus é eterno. Se Ele tivesse tido um começo teria saído do Nada, ou teria sido criado por um ser anterior [É o caso de Deus Personificado, o Pai, aquele sobre quem Jesus declarou: "Ninguém vai ao Pai senão por mim"]. É assim que, de degrau em degrau, remontamos ao infinito e à eternidade. É imutável; se estivesse sujeito a mudanças, as leis que regem o universo não teriam nenhuma estabilidade. É imaterial, ou seja, sua natureza difere de tudo o que chamamos matéria; de outro modo não seria imutável, porque estaria sujeito às transformações da matéria. É único; se houvesse vários deuses, não haveria unidade de desígnios, nem unidade de poder na ordenação do Universo. É todo-poderoso, porque é único. Se não tivesse o soberano poder, haveria alguma coisa mais ou tão poderosa quanto Ele; não teria feito todas as coisas e as que não tivesse feito seriam obras de um outro Deus”. [Aqui, Kardec trata de Deus Impessoal, inteligência suprema, causa primária de todas as coisas.]
Personificação de Deus
Inspirado pelos espíritos evoluídos que o acompanharam nos trabalhos da Codificação, Allan Kardec formulou perguntas e teceu comentários às respostas. Observe que Kardec não perguntou “quem é Deus”, mas sim “o que é Deus”. Ambas as partes concordam que “a pobreza da linguagem dos homens é insuficiente para definir as coisas que estão acima de sua inteligência”, conforme afirmaram os espíritos.
Considerando a pobreza da linguagem humana e a nossa inferioridade intelectual, Jesus, quando entre nós encarnado, utilizou-se, em diversas ocasiões, de prático método de comunicação que nos facilitaria a compreensão das mensagens divinas: a parábola, narrativa alegórica capaz de estabelecer uma comparação entre o comportamento humano e os preceitos morais assentados na nossa consciência, muito disso ainda em estado latente, sem uma definição precisa, em vista da densa materialidade a que estamos submetidos.
Jesus, no entanto, não se expressou apenas por figuras de linguagem, ele também empregou o discurso direto, mesmo sabendo que somente muito adiante, quando avançássemos no campo científico e, principalmente, em elevação moral, poderíamos melhor entender suas declarações, como, por exemplo, quando afirmou: “Vós sois deuses”. E acrescentou: “Podeis fazer tudo que faço e muito mais”. Com isso, o Mestre de Nazaré evidenciou que aquilo que nos distingue uns dos outros, inclusive dele próprio, é o grau de evolução que cada indivíduo tenha conquistado.
Também o Pai a quem Jesus tantas vezes se referiu não é “a causa primária de todas as coisas”, mas, sim, a personificação de Deus, uma entidade em altíssimo grau de evolução, da qual Jesus é assessor direto para as questões referentes à humanidade terrena. “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém pode ir ao Pai senão por mim.” João, 14 – 6.
Quando Jesus declarou “Eu e o Pai somos um”, ele fazia referência à união entre as criaturas e o Criador, a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas, Deus Impessoal, por meio daquela união entre “Eu e o Pai” (Jesus Cristo e Deus Personalizado). Deus Impessoal, eterno e infinito, uma entidade, ou instituição, sobre quem (ou o que) jamais desvendaremos o mistério de sua natureza íntima em toda sua extensão; do contrário, não seria eterno, infinito.
Voltemos à pergunta número onze do Livro dos Espíritos:
– Um dia será permitido ao homem compreender o mistério da Divindade?
Resposta: – Quando seu Espírito não estiver mais obscurecido pela matéria [de alta densidade, do tipo em que encarnamos] e, pela sua perfeição, estiver mais próximo de Deus, então o verá e o compreenderá.
Veremos Deus Personificado, o Pai, a quem Jesus se reporta, uma entidade perpétua, como cada um de nós. Perpétuo porque tem um começo, portanto, criatura eternizada, imortal, não tem fim. Uma entidade que alcançou a condição de supra humano e se encontra sob o mais elevado grau de evolução entre os humanos que estejam vivendo encarnados no orbe terrestre, ou viventes em espírito, habitando as dimensões periféricas ao nosso Planeta, condição conquistada no transcorrer de muitos milênios e sucessivas reencarnações ocorridas em diversos orbes. Assim, diante dele, compreenderemos, com relativa clareza, “o que é Deus”, a Lei Divina que rege o Universo, eterna, imutável, imaterial e única, a “Inteligência Suprema, Causa Primária de Todas as Coisas”.
Hierarquia Universal
“Rezam as tradições do mundo espiritual que,
na direção de todos os fenômenos do nosso Sistema,
existe uma comunidade de espíritos puros e eleitos pelo Senhor Supremo do Universo,
em cujas mãos se conservam as rédeas diretoras da vida de todas as coletividades planetárias.”
(Do livro "A Caminho da Luz", ditado pelo espírito Emmanuel, psicografado por Francisco Cândido Xavier.)
Os sistemas hierárquicos piramidais que se verificam nas organizações das sociedades terrenas são reproduções experimentais baseadas num sistema hierárquico universal. As famílias, as comunidades, as empresas, as cidades, as províncias ou estados e as nações são exemplos de organizações terrenas ordenadas através de sistemas hierárquicos, cada qual sob o regime que lhe parecer mais adequado.
Cada átomo tem um núcleo, cada organismo vivo tem um comando, cada organização social tem um dirigente, toda nação tem um governante. No Universo em geral não é diferente. Os planetas, as estrelas, as constelações, as galáxias, os grupos de galáxias, tudo tem governos definidos, subordinados entre si, hierarquicamente organizados. Até onde sabemos, Jesus governa o planeta Terra e está subordinado diretamente ao Pai, a quem ele tanto se referiu, que por sua vez governa o Sistema Solar e se reporta ao governador da constelação a que o nosso sistema pertence. Segue a organização hierárquica até o comando galáctico e daí em infinita ascendência.
Na Terra, tais organizações funcionam sob caráter experimental, comparando-se ao que ocorre em todo o universo, onde a hierarquia acontece de forma inalterável, eterna e infinita. Inalterável no sentido de que sempre ocorrerá a hierarquização, estabelecida em conformidade com a ordem de elevação espiritual das entidades membros da Suprema Corte Regente. Contudo, em função do continuamente eterno processo evolutivo dos elementos “em cujas mãos se conservam as rédeas diretoras da vida de todas as coletividades planetárias”, tais elementos podem ser promovidos, assumindo postos cada vez mais elevados, fato que ocorre sob efeito dominó: aquele que hoje é responsável pela governança de um planeta poderá vir a assumir o comando do sistema planetário ao qual seu orbe esteja vinculado. Da mesma forma, aquele que presidia tal sistema planetário pode passar ao comando de uma constelação, e assim sucessivamente. Certamente tal exemplo é apenas ilustrativo, a síntese de um processo muito mais complexo, em que se pode observar fatores sutis que determinam a progressiva gradação do processo evolutivo do ser humano em eterno continuum.
Deus crê em Deus que crê em Deus que crê em Deus...
Na Oração da Ave Maria, os católicos referem-se à mãe de Jesus na Terra atribuindo-lhe elevada santidade, ao ponto de reverenciá-la como sendo a “Mãe de Deus”. Não estarão errados se considerarmos que Jesus é o Regente do nosso planeta e que, estimando-se a sua escalada evolutiva, baseado na análise de suas obras, pregações e comportamento evangelizante, pode-se reconhecer que Ele está acima, muito além, de todos nós, habitantes do orbe terrestre. Jesus é Deus Personificado para a humanidade terrena, como o Pai o é para todo o Sistema Solar.
“Vós sois deuses”, disse Jesus e concluiu: “Podeis fazer o que faço e muito mais”.
Portanto Deus crê em Deus que crê em Deus que crê em Deus... ao infinito, eternamente.
O crente, o fanático e o ateu
O sentimento da existência de Deus é universal. Em toda a face da Terra, desde tempos remotos, o ser humano professa a crença num criador de todas as coisas. Fala-se de Deus, descreve-se Deus, acredita-se em Deus, sempre a partir da consciência de nossa própria existência, comparando-a ao grau de evolução que esse Deus alcançou dentro de nós. As definições sobre quem ou o que venha a ser Deus variam conforme a época, o lugar, o governo, a ideologia dominante, entre outros fatores, como, por exemplo, os valores morais cultivados.
Os diversos conceitos e pareceres que definem a existência de Deus possuem, em comum, a crença de que se trata de um ser regente universal, justo, perfeito, infinito, eterno, onipresente, onisciente e onipotente, criador de todas as coisas, um ser supremo, único, uma divindade superior a qualquer das formas de vida existentes no Universo, a quem devemos incondicional obediência.
Há também os que definem Deus como um ser dotado das possíveis virtudes e imperfeições humanas. Um deus capaz de amar e, eventualmente, odiar; um deus que abençoa ou amaldiçoa, absolve ou condena, conforme o comportamento de suas criaturas. Quem de nós não ouviu pregações sobre um deus capaz de se irar? Falam de um deus que lançaria maldições sobre indivíduos ou coletividades humanas. Os que assim se manifestam são tidos, em geral, como fanáticos.
Fanáticos, pessoas que demonstram excessiva exaltação pelas qualidades de alguém ou de alguma coisa, expressam cega devoção por entidades religiosas; creem num deus que ama apenas os tidos como bons, os obedientes aos ditames da empresa divina, e condena a penas eternas, sem o direito de se redimirem de suas faltas, aqueles que são identificados como maus, indisciplinados, rebeldes. Diante de tal doutrina e em vista da impossibilidade de se identificar signos de lógica que alimente tal raciocínio, surgem os ateus, aqueles que optam por não acreditar em nada que se reporte a um ser tido como supremo, divino, “infinito, eterno, sobrenatural e existente por si só; causa necessária e fim último de tudo que existe” (Houaiss), cujos princípios e regras ditadas por nós, humanos, equiparam-no a reles tiranete.
O fanatismo religioso é, por via de regra, o resultado de uma formação ou orientação religiosa distorcida, como acontece com aqueles que pregam sobre Deus como modelo do ser humano, para que a criatura seja apresentada como semelhante ao seu criador. Isso tem certo fundamento se considerarmos que estamos tratando de Deus Personificado (o Pai) e que não nos referimos a Deus na condição de Inteligência Suprema, Causa Primária de Todas as Coisas.
O ateu que não se dá ao trabalho de analisar a possibilidade de sobrevivência da alma após o falecimento do seu corpo material denso, organizado e sistematizado, fica também com o seu dogma sobre a não-sobrevivência de vida consciente de sua própria existência, em forma de alma, espírito, fantasma, espectro, marmota, assombração... Para o ateu, a evolução humana é atributo exclusivo da matéria, e a alma (ou espírito), na condição de entidade autônoma, não passaria de uma abstração, resultado de processos mentais impulsionados por funções orgânicas, nada mais que reflexos de um fenômeno puramente material, atividade individual que cessaria após a morte do corpo físico.
A matéria é divina, como tudo na composição do Universo
Há quem creia que Deus, Inteligência Suprema, Causa Primária de Todas as Coisas, é simplesmente uma psique ultrassublime, um ser pensante dotado das mesmas funções psicológicas humanas. Tais pessoas acreditam que os processos cognitivos que mobilizamos com o propósito de compreender, por exemplo, a própria Divindade Suprema, assim como as manifestações afetivas e volitivas que externamos, tudo teria a mesma natureza dos métodos empregados por Deus. Ele, porém, os usaria aplicando recursos tidos como “sobrenaturais”, que, em alguns casos, ocorreria pela anulação momentânea das leis da natureza, a fim de realizar um desses eventos milagrosos. Esta é, na verdade, a maneira como personificamos Deus e nos colocamos na condição de seus semelhantes.
Para muitos religiosos, essa psique ultrassublime, Deus Personificado, viria a ser, equivocadamente, o criador de todas as coisas, inclusive das psiques (almas), que seriam dotadas de corpos materiais para se locomover e se comunicar entre si, mas apenas enquanto habitassem o planeta Terra, durante um relativamente curto período. Em seguida, com a morte do corpo somático, as psiques sobreviveriam independentes, totalmente livres dos corpos densos, tangíveis por qualquer vivente ao seu alcance. Nessas condições, o criador-fabricante separaria as almas que funcionaram bem, obedecendo às regras de sua empresa, das que se comportaram mal, aquelas que infringiram os regulamentos divinos. As primeiras permaneceriam sob seus eternos cuidados, usufruindo as benesses de um ambiente paradisíaco, uma recompensa por terem seguido corretamente os preceitos divinos, que, desde o momento da criação, estariam registrados em suas consciências. As demais sofreriam eternamente as consequências de não haverem se comportado bem, ou expurgariam, por um longo período, suas infrações menores e, assim, passariam a habitar entre as almas imaculadas, obedientes às regras da empresa divina. É como se as psiques fabricadas em série pelo seu criador, dotadas de máquinas, conforme modelos disponíveis (as etnias), fossem submetidas a determinado período de teste, em que seriam avaliados seus comportamentos éticos. Porém, no processo de reprodução do modelo criado pela divindade suprema, as máquinas dotadas de psiques literalmente etéreas poderiam sofrer acidentais falhas, vindo a apresentar eventuais defeitos de fabricação: membros atrofiados, órgãos debilitados, ou a falta de algumas dessas peças, obrigando as criaturas nessas condições a utilizarem suas máquinas deficientes, ou desistirem da prova ali mesmo, no final da linha de produção. Outras, durante a fase de prova, sofreriam acidentes que poderiam deixá-las fisicamente deformadas, ou com insuficiência de alguma função orgânica, ou mesmo mentalmente fragilizadas. Em casos de eventos sinistros ainda mais graves, poderiam encerrar seus períodos de teste muito antes de esgotar o prazo de validade da máquina.
Vem daí a ideia de que o nosso corpo físico é tão somente o veículo de um ser etéreo que, com a morte (desagregação) deste corpo material, poderia existir totalmente desvinculado de qualquer matéria. É como se o psiquismo fosse um ente imaterial cuja dependência do uso de um corpo físico, para se comunicar entre seus pares, ocorresse apenas durante a fase de teste (a existência encarnada). Quem assim pensa acredita que a alma do corpo material vem a ser alguma coisa que possa, em outra dimensão cósmica, manifestar-se independente, livre, dissociada de qualquer tipo de matéria. Isso provavelmente decorre do fato de que consideramos a matéria bruta um elemento inferior, um objeto identificável pelos sentidos básicos da máquina humana, visível, tangível e sensível através de todos os canais de comunicação do corpo físico com o meio ambiente em que se encontra. Enquanto a alma (a psique, ou psiquismo), por ser imaterial, representaria o verdadeiro ente sublime, sagrado, venerável. Para muitos de nós, a alma seria a mais importante manifestação de Deus na formação do ser humano, aquilo que sobreviveria eternamente, em vista de sua semelhança com o Criador. Entretanto este ser composto de elementos de natureza etérea (a psique pura) e material denso (o corpo somático) está evoluindo e alcançará estágios em que identificará a matéria em seus múltiplos estados e inúmeras funções. Então, perceberá como alcançou autoconsciência e como ocorreu o seu processo evolutivo. Assim, perderá o preconceito sobre a matéria densa e passará a considerá-la como principal parceria do ente etéreo, este envolvido em matéria sutil, energética, provavelmente constituída de partículas subatômicas e elementos quânticos sob interações eletromagnéticas que lhes dão coesão. As obras da criação existem e existirão eternamente sob transformação (o material) e evolução (o etéreo).
A matéria, como a conhecemos, é a concentração de elementos do universo conhecido
"Então, Deus modelou o homem com a argila do solo, insuflou em suas narinas um hálito de vida e o homem se tornou um ser vivente" (Gênesis 2:7).
O ente psíquico (a alma) é aquilo que proporciona e controla o estímulo vital na matéria, absorvendo, do conjunto que forma o universo material, o princípio energético que costumamos chamar de “sopro da vida”. E não há razão para o ente psíquico se manifestar sem a concorrência da matéria, mesmo porque não há como nem por que isolar um do outro.
Não há razão para dizer que somos simplesmente, como muitos pretendem, um espírito puro (alma, elemento imaterial) que habita, temporariamente, um corpo material. Menos ainda, acreditar que somos um corpo material, estruturado por um arranjo orgânico, complexo e sistemático, que possui um espírito, como se estivéssemos tratando de elementos, além de distintos, incompatíveis entre si. Até aqui, entendemos que somos a composição de ambos e que assim seremos por toda a eternidade. Para isso devemos apenas considerar o fato de que ainda não conhecemos todos os tipos de matéria existentes no universo.
Assim sendo, podemos acreditar que, enquanto for necessário ao nosso progresso moral e científico neste nosso planeta, continuaremos reencarnando aqui na Terra, o que consiste no processo em que o espírito, indivíduo etéreo, revestido de matéria sutil, imponderável, depois da morte do corpo somático e de temporária permanência numa outra dimensão cósmica, pode voltar a viver sobre o orbe terrestre, novamente veiculado por um corpo de matéria densa, magnetizada por uma camada de matéria sutil. A maneira como viverá, os ambientes onde reencarnarão e os intervalos de tempo entre reencarnações dependem do estado evolutivo do reencarnando. Ao completar o ciclo de nascimento, vida e morte do corpo material, o espírito (a parte etérea do ser vivente) volta à sua verdadeira condição de existência, agora revestido de matéria sutil, ou seja, matéria que se encontra numa dimensão elevada à “quintessência”, o elemento aristotélico sobre o qual podemos, hoje, entender como sendo da mesma natureza do tecido quântico que compõe o espaço cósmico, evitando que os corpos celestes se choquem uns com os outros.
Fernando Soares Campos é autor de "Saudades do Apocalipse - 8 contos e um esquete", CBJE, Câmara Brasileira de Jovens Escritores, Rio de Janeiro, 2003; "Fronteiras da Realidade - contos para meditar e rir... ou chorar", Chiado Editora, Portugal, 2018; e "Adeildo Nepomuceno Marques: um carismático líder sertanejo", Grafmarques, Maceió, AL, 2022.
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