A construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Brasil, foi denunciada na Organização das Nações Unidas (ONU) por 100 entidades civis e 40 comunidades de 11 municípios do Estado do Pará, no Norte do país, onde a obra deve ser realizada.
Projetada para ser construída no Rio Xingú, na Região Amazônica, a Belo Monte será a maior hidrelétrica do Brasil e a terceira do mundo, com capacidade para gerar 11 mil megawatts através de dois reservatórios de 516 quilômetros quadrados, tamanho semelhante ao do Canal do Panamá, e vai impactar toda a bacia do Xingu, além de quatro reservas extrativistas e oito unidades de conservação ambiental.
O leilão para a construção da hidrelétrica está previsto para o próximo dia 20 de abril, e, segundo a denúncia, os lagos da represa inundarão uma área com 30 reservas indígenas legais e afetará um terço do município de Altamira, no Pará, onde vivem 20 mil pessoas.
Segundo a diretora da organização não governamental Justiça Global, Andressa Caldas, o licenciamento ambiental da hidrelétrica sofreu pressão política e fere a Convenção sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2004.
De acordo com o Artigo 15 da convenção, os governos deverão estabelecer ou manter procedimentos com vistas a consultar os povos interessados, a fim de se determinar se os interesses desses povos seriam prejudicados, e em que medida, antes de se empreender ou autorizar qualquer programa de prospecção ou exploração dos recursos existentes em suas terras.
O Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) realizou quatro audiências públicas com a participação de índios, e o presidente do instituto, Roberto Messias, se reuniu em Brasília com lideranças dos povos indígenas. Mas, segundo os movimentos sociais, o número de audiências foi insuficiente e por isso reivindicam a realização de mais 13 encontros.
O juiz federal de Altamira, Antônio Campelo, reconheceu a validade das audiências realizadas pelo Ibama e apontou no despacho que não vislumbrava necessidade de realização de audiências em todas as comunidades atingidas.
A denúncia na ONU ocorre após as entidades civis não terem conseguido suspender a licença prévia concedida pelo Ibama. À época, o bispo de Altamira, dom Erwin Krautler, disse que a licença não era oportuna, pois o projeto arrasa toda a região.
Segundo o bispo, esse projeto não vai ser o único, vai ser seguido por outros projetos. A organização não governamental Internacional Rivers afirma que há mais de cem grandes barragens planejadas para serem construídas nos rios da região Amazônica, considerada a maior reserva florestal da Terra e tida como o pulmão da humanidade.
O Ibama diz que a licença prévia só saiu após o instituto receber parecer favorável da Fundação Nacional do Índio (Funai), mas ela não autoriza o início da obra, apenas o leilão, e tem 40 condicionantes, entre elas uma que exige a criação de novas unidades de conservação na região.
As 100 entidades civis e as 40 comunidades locais que ofereceram denúncia à ONU contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte alegam que as falhas no licenciamento teriam sido ignoradas por pressão política e que opositores à construção da usina foram até ameaçados de morte.
As entidades alegam a existência de ilegalidades e arbitrariedades no processo de licenciamento da Belo Monte, com iminentes violações de direitos humanos que a hidrelétrica acarretará, bem como as ameaças e intimidações sofridas por aqueles que questionam as irregularidades do licenciamento.
O documento enviado à ONU denuncia irregularidades que foram ignoradas pela diretoria do Ibama, como a falta de consulta prévia às comunidades atingidas e as fragilidades dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA-Rima) do empreendimento.
Segundo a denúncia, apenas dois dias antes da concessão da licença prévia a equipe técnica do Ibama havia assinado uma nota que afirma expressamente que "não há elementos suficientes para atestar a viabilidade ambiental do projeto".
Dois dias depois, a Advocacia Geral da União ameaçou processar procuradores federais do Pará que questionassem a licença na Justiça, em uma atitude considerada arbitrária e intimidadora pela cúpula do Ministério Público Federal.
"Para nós está claro que interesses de governo e de grandes grupos econômicos estão se sobrepondo ao que dizem a lei e os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário", afirma Antonia Melo, uma das lideranças do Movimento Xingu Vivo Para Sempre, que reúne mais de 150 organizações, movimentos sociais e associações da região.
Antonia é uma das pessoas ameaçadas em função da oposição à construção da usina. "Já não saio de casa, mal ando com meus filhos pelas ruas", afirma. Por trás das ameaças a Antonia e a outros ativistas, entre eles arcebispo do Xingu, dom Erwin, estariam funcionários da empresa Camargo Correa, além de fazendeiros e políticos que controlam os meios de comunicação da região.
Segundo Antonia Melo, em 2008, até funcionários da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) tentaram me intimidar, mas denunciamos a atuação dos agentes ao Ministério Público Federal".
As organizações signatárias da denúncia pedem que a ONU solicite informações ao governo brasileiro sobre o empreendimento, que envie representantes para uma vistoria in loco, e que o Brasil reconsidere a construção da usina.
Se a obra for iniciada, várias entidades nacionais e internacionais irão responsabilizar o Brasil internacionalmente por crime contra a humanidade, além de crimes ambientais e de violações de direitos humanos causadas pela hidrelétrica.
ANTONIO CARLOS LACERDA
PRAVDA Ru BRASIL
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