Operação Dropshot pressupunha o lançamento de 300 bombas nucleares e outras 29 mil bombas convencionais sobre 200 alvos e cerca de 100 cidades e vilas na URSS. O objetivo era acabar com 85% do potencial industrial soviético com um só golpe.
Após a Segunda Guerra Mundial, os EUA, os únicos que então possuíam armas nucleares, avaliaram a possibilidade de lançar "um ataque preventivo" contra a União Soviética. Eles temiam uma invasão à Europa Ocidental, Oriente Médio e Japão.
Em setembro de 1948, o presidente americano Harry S. Truman aprovou um documento do Conselho Nacional de Segurança (intitulado NSC 30) sobre "Política da Guerra Atômica", segundo o qual os Estados Unidos deveriam estar preparados para "utilizar de forma rápida e eficaz todos os recursos apropriados disponíveis, incluindo armas nucleares, no interesse da segurança nacional".
A fama de LeMay
O general LeMay era famoso por ter liderado a campanha de ataques estratégicos contra o Japão, encerrada com o bombardeio nuclear de Hiroshima e Nagasaki. Isso lhe rendeu títulos e distinções em diversas universidades norte-americanas.
LeMay organizou o Comando Aéreo Estratégico (SAC, ou Strategic Air Command, que é a instância suprema do comando aéreo estratégico das forças dos EUA) como uma agência capaz de administrar uma possível guerra nuclear durante a Guerra Fria. Obviamente, contra a URSS. Antes que essa organização entrasse plenamente em operação, em 1949, o general propôs lançar o inventário nuclear completo dos EUA (isto é, 133 bombas) contra 70 cidades soviéticas e capitais da Europa Oriental em um período de 30 dias. Sua estratégia se baseava na suposição de que os soviéticos não possuíam nenhuma força equiparável ao SAC na época.
Washington ataca
Em 1949 surgiu o plano Dropshot. A ideia era que os EUA atacassem a União Soviética e lançassem mais de 300 bombas nucleares e 20 mil toneladas de dispositivos convencionais contra 200 alvos situados em 100 áreas urbanas, incluindo Moscou e Leningrado (atual São Petersburgo).
Para tanto, foi produzida uma lista de alvos para ataques nucleares nos territórios da União Soviética e seus aliados. A relação continha - nada menos que - 1.200 cidades desde a Alemanha Oriental, no Ocidente, até a China, no Oriente.
Moscou encabeçava a lista, com 179 "alvos designados" (incluindo a própria Praça Vermelho), contra 145 em Leningrado. A potência das armas nucleares empregadas oscilaria entre 1,7 e 9 megatons (a da bomba atômica Little Boy, lançada em Hiroshima em agosto de 1945, era de 0,013 a 0,018 megatons).
Berlim Oriental, assim como Varsóvia (Polônia) e Budapeste (Hungria), estava listada (com 91 alvos) juntamente com outras cidades situadas além das fronteiras soviéticas.
Entre 75 a 100 dos 300 dispositivos nucleares teriam a missão de destruir em solo a aviação de combate soviética. Entre os objetivos listados, e que podem ser observados no Arquivo de Segurança Nacional, desde que deixaram de ser segredo de Estado em 2015, há uma "Categoria 275", ou de "metas populacionais". Estima-se que o ataque dos Estados Unidos poderia ter causado a morte de quase 60 milhões de pessoas.
Caso a URSS não se rendesse após os ataques, Washington continuaria bombardeando regularmente áreas urbanas e industriais até sua destruição total.
Além disso, os idealizadores ponderavam iniciar uma campanha terrestre contra os soviéticos para obter uma "vitória completa" com os aliados europeus.
E os planos dos EUA iam muito além da Rússia e entornos. Pequim figurava em 13º lugar em número de bombardeiros, com 23 áreas destinadas à destruição.
De acordo com documentos desclassificados em 2015, as ogivas seriam lançadas a partir de aviões baseados no Reino Unido, no Marrocos e na Espanha. Também empregariam bombardeiros intercontinentais B-52, que, no momento do planejamento, estavam começando a ser distribuídos para a Força Aérea nacional.
Surpresa soviética
Segundo o livro "Operação Guerra Mundial 3: O Plano Secreto Americano ("Dropshot") para a guerra contra a União Soviética", de Anthony Cave Brown, durante um longo período, o único obstáculo que existia para iniciar o ataque nuclear maciço era o fato de o Pentágono não possuir bombas atômicas suficientes (em 1948, Washington possuía um arsenal com 50 bombas desse tipo) nem aviões que pudessem conduzir o ataque. A Força Aérea dos Estados Unidos contava então com apenas 32 bombardeiros B-29 atualizados para lançar as bombas radioativas.
Em 1949, o arsenal nuclear americano atingiu a marca de 250 bombas atômicas, e o Pentágono chegou a conclusão de que uma vitória sobre a União Soviética já era "possível". Mas o teste da bomba atômica soviética, realizado naquele verão, foi um balde de água fria nos planos militares dos Estados Unidos.
"O teste da bomba atômica soviética, em 29 de agosto de 1949, mexeu profundamente com os americanos, que acreditavam que seu monopólio atômico duraria muito mais tempo. Mas isso não alterou de imediato o planejamento da guerra. A questão-chave era saber o nível de dano necessário para obrigar a URSS a se render", descreve o professor Donald Angus MacKenzie, da Universidade de Edimburgo, em seu ensaio "Planejamento da Guerra Nuclear e Estratégias de Coerção Nuclear".
O herói esquecido
Em janeiro de 1950, o cientista Klaus Fuchs - físico teórico nascido na Alemanha e membro da equipe do Projeto Manhattan, que construiu a primeira bomba atômica nos Estados Unidos - foi preso, julgado e (depois de reconhecer sua culpa) condenado a 14 anos de prisão por repassar segredos militares a uma nação aliada (embora prestes a ser atacada, a URSS ainda era classificada como Estado aliado).
Fuchs havia fornecido dados relevantes do Projeto Manhattan para a União Soviética de forma absolutamente desinteressada, baseando-se em suas convicções políticas e na certeza do perigo representado pelo monopólio nuclear dos Estados Unidos. Esse foi um fator decisivo para os soviéticos desenvolverem sua própria bomba nuclear.
Fuchs
O Estado soviético agradeceu Fuchs por seus atos condecorando-o com a Ordem da Amizade dos Povos, um dos maiores prêmios no regime. O físico foi solto em 23 de junho de 1959, e depois emigrou para a Alemanha Oriental, onde deu sequência a sua carreira científica. Fuchs faleceu em 1988.
ÍGOR RÔZIN, GAZETA RUSSAPUBLICADO EM 13.07.2017
Foto http://mckeesart.deviantart.com/art/Nuclear-war-394987358
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