RIO DE JANEIRO/BRASIL - Uma longa calçada com curvas que simulam o balanço das ondas. O hotel mais célebre do Brasil. A mais conhecida festa de ano novo do mundo. Apenas com esses três relatos já é possível saber que se trata de Copacabana, o mais famoso dos bairros brasileiros. Mesmo em uma cidade maravilhosa, conhecida como a Paris das Américas, o Rio de Janeiro, que ainda tem locais como Ipanema e Leblon para rivalizar na fama.
Por ANTONIO CARLOS LACERDA
Copacabana é a referência nacional no exterior, povoando o imaginário daqueles que sonham em conhecer nossas terras. Os simbolismos de Copacabana são muitos e há espaço para uma peculiaridade: é o bairro que concentra maior número de idosos do país.
Moradores com 60 anos ou mais somam um terço da população do bairro, segundo censo do IBGE.
Também é uma das maiores taxas de idosos em uma mesma localidade em todo o mundo. Da população de cerca de 140 mil pessoas que vivem em Copacabana, aproximadamente 43 mil estão na terceira idade.
A região nobre da zona sul do Rio de Janeiro tem uma dicotomia interessante. A fama atraí turistas jovens de todas as partes em busca da efervescência cultural. É um local para quem busca agito.
Imagine um pequeno bairro, com área de 7,84 km2, com quase 100 hotéis para abrigar esses ávidos turistas. Apelidado de "a princesinha do mar", é o destino que todos querem conhecer. Mas é, também, o reduto sagrado de uma população idosa onipresente. Conflito aparente? Não quando se mergulha no "jeito carioca de ser", como opina o jornalista Mauro Franco, que dirige o Jornal do bairro, o Posto Seis, com tiragem de 40 mil exemplares.
"O jeito carioca de ser, despojado, de chinelo de dedo, sem se importar com o pensamento alheio permite uma aproximação que só acontece no Rio. Idosos, jovens e crianças fazem do espaço público do bairro seus quintais. Em Copacabana, o idoso é que chama seus netos para praticarem um Stand Up Surf ou nadarem no Posto 6, e que comentam os últimos lançamentos cinematográficos. A terceira idade está sempre antenada no momento", diz Mauro, que não somente é morador, como nasceu em Copacabana.
Em visita à cidade, a redação fez uma dessas constatações. Num agitado e quente sábado à tarde de fevereiro, no tradicional Cine Roxy, no coração do bairro, a sessão lotada do filme "Ela", com temática futurista sobre as relações humanas e a tecnologia, tinha um público majoritariamente idoso. Enquanto aguardavam o início, muitos debatiam outras produções do jovem diretor Spike Jonze, aclamado por filmes considerados alternativos no circuito cinematográfico mundial.
Copacabana realmente fervilha. Enquanto é simples entender a atração dos turistas pelo bairro, basicamente por conta da extensa praia e pontos emblemáticos do Rio Janeiro, como o nobre Hotel Copacabana Palace, pergunta-se, contudo, quais os atrativos do bairro para esta imensa população com mais de 60 anos?
"Copacabana possui um "algo a mais" que vai além das inúmeras ofertas de serviços e comércios, vizinhos a cada residência. Apesar de ser um bairro cidade, as pessoas se conhecem, frequentam os mesmos eventos sociais e, além de tudo isso, ainda tem a praia, local de aproximação e democrático que aceita todas as camadas sociais sem discriminação", afirma Mauro Franco.
Paulista, Ruby D'Olne Soares de Barros explica as razões que o fizeram deixar sua terra natal e se mudar para Copacabana há 40 anos. "É mais ou menos como uma cachaça", brinca. "Quem vem para cá não quer mais sair. Para o idoso tem muitas vantagens, pois você encontra tudo à mão. Em um raio de 500 metros eu tenho todos os estabelecimentos que preciso no dia a dia. E você pode fazer tudo a pé, é um local extremamente adequado aos idosos, com exceção das calçadas", reflete.
Aos 88 anos, Ruby ganhou recentemente do filho um triciclo motorizado para andar com mais facilidade pelas ruas do bairro.
O acesso aos serviços pode ser um dos pontos de fácil compreensão, porém, superficiais quando se tenta explicar mais profundamente os atrativos de Copacabana. O que mais Copacabana oferece? Sincero, o jornalista Mauro Franco diz que esta é uma pergunta difícil de ser respondida. Porém, dá pistas.
"Para os que acordam cedo e vão caminhar no calçadão temos como presente o lindo e sempre avermelhado nascer do sol sobre as águas plácidas do mar. Depois, sentar em algum quiosque e beber uma água de coco para se refrescar, jogando conversa fora com amigos, ou não, pois carioca faz amizade em meio segundo. Conversa vai, conversa vem, uma chegadinha na Colônia dos Pescadores para ver como foi o pescado do dia sem ter o menor compromisso de comprar nada. Se estiver com disposição ainda, pode dar uma nadada ou mesmo ficar contemplando os esportes náuticos que acontecem diariamente ali. Bem, como já está quase na hora do almoço, uma paradinha é bom. De tarde, ir na Confeitaria Colombo do Forte de Copacabana, com o incrível visual de toda a orla, ou ir no tradicional restaurante Cirandinha comer aquela banana split são apenas dois bons programas. Já no finzinho da tarde, dar aquela voltinha até o Arpoador para assistir o pôr-do-sol, com todo mundo aplaudindo em uníssono é impagável. Como por aqui ninguém é de ferro, o início da noite acontece sempre em um boteco para beber aquela 'gelada'". São os encantos sutis.
Ciente da sua vocação de abrigar uma terceira idade ativa, Copacabana tem respondido com melhorias na sua estrutura para este público. "Tenho observado que os idosos têm conseguido uma melhora significativa na qualidade de vida. As Academias da Terceira Idade, com aulas gratuitas, espalhadas por vários pontos do bairro, têm ajudado muito tanto na questão física quanto na social.
A atividade física cria a independência e autonomia, além de valorizar a autoestima do praticante. Com essa atitude todos nós temos a ganhar, pois os idosos passam a frequentar mais as lojas, cinemas, restaurantes do bairro o que gera mais mão-de-obra e melhora da economia local", opina Mauro.
Se há boas iniciativas também há a conhecida letargia do poder público em focar investimentos para áreas importantes, o que é uma realidade nacional, claro, mas que encabeça as listas de queixas dos moradores da região. "Apesar de termos um envelhecimento ativo e o bairro concentrar o maior número de idosos na América Latina, percebemos que o governo não acompanha esse fenômeno. As calçadas de Copacabana são desniveladas e esburacadas, o transporte público é inadequado e despreparado, a insegurança gerada por menores infratores e a falta de profissionais da área de gerontologia na área da saúde são as principais reclamações", diz o jornalista.
Contudo, para os fiéis moradores da terceira idade, e os visitantes que tentam desbravar os segredos de Copacabana, os encantos fascinam. "Acredito que o maior segredo de Copacabana é o elixir da felicidade na terceira idade. São diversos fatores gerados pelo bairro que atuam no processo do envelhecimento saudável. A felicidade gerada pelo sol, o calor humano dos amigos espalhados em cada esquina, as portas das oportunidades de lazer e a cultura exalada pelos "poros" de Copacabana são os curativos secretos da princesinha do mar", conclui Mauro. Como bem definiu esse copacabanense da gema, "Copacabana é um local único, diferente, contagiante. Um bairro positivo".
ANTONIO CARLOS LACERDA é Correspondente Internacional do PRAVDA.RU
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