1 - O Aniversário Passou no dia 25 de Fevereiro cinquenta anos sobre a apresentação por Khruchtchev, durante o XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PCUS), do "Relatório Secreto" sobre os crimes de Staline.
Esta efeméride foi recordada pela imprensa "burguesa" de referência. O "Público", de 25/2/06, assinala aquela data com um editorial de José Manuel Fernandes, onde este lamenta que "o movimento comunista sobrevivesse, sem abanos de maior ... mais trinta anos" e um artigo de Anne Apllebaum, de quem recentemente foi traduzido um livro sobre o GULAG, que pode ser caracterizado por esta pérola de pensamento: "estamos ... perante outro importante momento histórico", semelhante ao do XX Congresso, pois "Condoleezza Rice ... acaba de anunciar que vamos gastar 75 milhões de dólares para promover a democracia e combater um regime totalitário no Irão". No mesmo dia o "Diário de Notícias" refere-se àquela data com um artigo anódino, que termina afirmando "para salvar o regime, havia que condenar Staline".
A imprensa "operária", e referimo-me especificamente ao "Avante", nada assinala. No entanto, a página electrónica, desse mesmo dia, do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), "Vermelho", publica um artigo de opinião em que se considera, a dado passo, "as resoluções aprovadas" no XX Congresso como "uma guinada à direita na política que vinha sendo adoptada pelo PCUS e que contribuíram para colocar o movimento comunista internacional no campo do reformismo" (Buonicore, A., 2006). No entanto, o autor do artigo, Augusto Buonicore, é actualmente membro suplente do Comité Central do PcdoB, que integra o Governo do Lula. São as especificidades da América Latina.
2 - Os Acontecimentos Mas passemos aos factos, principalmente tracemos a história deste Congresso.
O XX Congresso do PCUS decorre entre os dias 14 e 25 de Fevereiro de 1956, na presença de 55 delegações de partidos comunistas e de trabalhadores, onde não constava o nome do Partido Comunista Português (PCP) (Costa, R., 1985). No primeiro dia, Khruchtchev ao ler o relatório das actividades do Comité Central só pronuncia o nome de Staline uma única vez, ao passar em revista os nomes de dirigentes do movimento comunista falecidos após o XIX Congresso e mesmo assim citando-os por ordem alfabética. Staline surge a seguir a um apagado dirigente do PC Japonês. O tom estava dado. "Um delegado italiano murmura "patifes". A partir desse momento, os mais argutos sabem que o vento mudou" (Desanti, D., 1976). Nesse discurso inaugural ao Congresso, para além da análise de aspectos importantes de política económica da URSS, são formulados dois princípios, que iriam mais tarde estar na origem do diferendo sino-soviético e das divisões no movimento comunista internacional, e que são a possibilidade de evitar as guerras, ou seja, a defesa da coexistência pacífica entre Estados com sistemas económico e sociais diferentes e a diversidade de vias de passagem ao socialismo, entre elas a da "possibilidade real" da passagem ao socialismo por via pacífica (Boffa, G., 1960 e Costa, R., 1985). Defende-se ainda a necessidade de reforçar a legalidade socialista, atribuindo "ao bando de Béria", que tinha sido executado, depois de um processo sumário, a 23 de Dezembro de 1953, todas as ilegalidades anteriormente cometidas.
Vários oradores, nos dias seguintes, formularam críticas a algumas das últimas obras teóricas de Staline (Mikoyan) e falaram do "culto da personalidade", mas nada permitiria concluir sobre o que se iria passar a seguir.
Por essa mesma altura é divulgado aquilo que hoje se conhece como o "testamento político" de Lenine, em que este, numa "Carta ao Congresso", já muito doente, pedia a demissão de Staline de Secretário-Geral do PCUS (Buonicore, A., 2006). Esta carta lida no XIII Congresso do Partido, realizado em 1924, já depois da morte de Lenine, nunca tinha sido publicada, apesar dos apelos outrora feitos pela oposição anti-estalinista para a sua divulgação e cumprimento (Deutscher, I., 1968).
Sexta-feira, dia 24 de Fevereiro, depois da sessão da manhã anuncia-se que os trabalhos da tarde iriam decorrer à porta fechada. Ninguém ficou surpreendido, dado que era normal que a eleição do novo Comité Central se realizasse unicamente na presença dos delegados ao Congresso. Dia 25 de manhã, o Congresso continua sem a presença dos delegados estrangeiros, soube-se depois que Khruchtchev tinha pedido a palavra novamente e tinha apresentado o seu famoso "Relatório Secreto" onde são denunciados os crimes de Staline e as perversões da legalidade praticada por aquele. Nos dias seguintes, este Relatório foi lido por responsáveis políticos aos militantes do Partido e depois foi levado ao conhecimento de todos, em leituras públicas, em que participaram tanto elementos da Juventude Comunista (Konsomol) como sem-partido (Boffa, G., 1960). No entanto, na União Soviética este texto nunca foi editado ou vendido em livrarias (Elleinstein, J., 1992).
A decisão de apresentar o "Relatório Secreto" foi uma "iniciativa pessoal" de Khruchtchev, que "fez da sua exposição uma questão fundamental e que se sobrepôs à oposição dos seus colegas mais recalcitrantes, sem olhar às aparências nem às consequências" (Lewin, M., 2004). Depois da morte de Staline, ocorrida a 6 de Março de 1953, o Presidium do PCUS, baseando-se numa decisão do Comité Central de 31 de Dezembro de 1953, constituiu uma comissão, presidida Pospelov, secretário do Comité Central e de 1940-49 director do "Pravda" (Khruchtchev, N., 1990), para realizar um inquérito às actividades de Staline, principalmente ao "modo como a repressão de massa atingira membros e membros-candidatos do Comité Central eleitos pelo XVIIº Congresso do Partido, em 1934" (Lewin, M., 2004). Foi este trabalho que serviu de base ao Relatório lido a 25 de Fevereiro por Khruchtchev. As peripécias relacionadas com a apresentação deste texto no último dia do Congresso são várias, podemo-nos ficar com esta descrição: "era já perto da meia-noite" (24 de Fevereiro), "quando Khruchtchev arrancou dos seus colegas a apresentação do relatório aos congressistas, mas Khruchtchev não queria esperar pela manhã. O primeiro secretário enviou mensageiros especiais aos hotéis em que os congressistas tinham ficado. A sessão secreta começou à meia-noite" (Costa, R., 1985).
Simultaneamente à sua apresentação no Congresso foi permitida a leitura, mas não foi entregue, aos chefes de delegação dos partidos comunistas estrangeiros, entre eles Thorez, Secretário-Geral do PC Francês, e Togliati, do PC Italiano. Estes dois dirigentes não revelaram o seu conteúdo junto dos seus partidos (Desanti, D., 1976). No entanto, a 4 de Junho de 1956 o Relatório é mesmo divulgado na sua totalidade pelo "New York Times", com origem no Departamento de Estado norte-americano, que parece que o obteve de uma fonte polaca, e a 6 de Junho pelo "Le Monde". Nos países do "campo socialista" o primeiro em que foi feita referência, com amplos pormenores, ao "Relatório Secreto" foi na ex-Jugoslávia, dado que nele se procedia à reabilitação de Tito, que como veremos tinha sido tão duramente vilipendiado por Staline (Fejtö, F., 1975).
3 - O "Relatório Secreto" de Khruchtchev O "Relatório Secreto" de Khruchtchev demorou cerca de três horas a ler. "O seu estilo ... é inculto, impulsivo, discursivo, quase caótico; entretanto é, ao mesmo tempo, peculiarmente dinâmico e terra a terra. Não se trata de um teórico ou de um historiador a produzir uma explicação marxista da era estalinista ou a oferecer ideias e generalizações analíticas. A este respeito Khruchtchev é incomensuravelmente inferior aos grandes críticos bolcheviques que, antes dele, já expuseram Staline, inferior a Trotski, Bukharine ou Rakovski. Apesar disso ele fornece, de longe, a mais vívida imagem da era de Staline ou, pelo menos, da sua fase final e, incidentalmente, também do próprio Staline. Conduz-nos pelos escuros corredores e galerias do passado recente da Rússia como um mineiro nos levaria (Khruchtchev tinha sido mineiro na sua juventude, JNF), de lâmpada na mão, por uma mina de carvão abaixo e, com um punho rude de um mineiro, coloca dinamite bem abaixo das rochas do estalinismo" (Deutscher, I., 1968). Cito este longo e belo texto de Isaac Deutscher (1907-1976), um grande historiador que durante toda a sua vida se manteve fiel à esquerda, porque me parece que caracteriza bem o que foi o estilo do "Relatório Secreto" de Khruchtchev.
O Relatório enumera uma série infindável de violações e de crimes cometidos por Staline e de como o culto da sua pessoa "se tornou, num momento preciso, a fonte de toda uma série de perversões graves e cada vez mais sérias dos princípios do Partido, da democracia do Partido, da legalidade revolucionária" ("Relatório Secreto", in Costa, R., 1985).
A parte mais dramática teve lugar quando foi afirmado que "dos 139 membros suplentes do Comité Central do partido que foram eleitos no XVII Congresso (1934), 98 tinham sido presos e fuzilados, quer dizer 70%, a maior parte entre 1937-38. A mesma sorte foi reservada à maioria dos delegados ao XVII Congresso: dos mil novecentos e setenta delegados, seja com direito a voto, seja como voz consultiva, mil cento e oito pessoas, quer dizer mais do que a maioria, foram detidas sob a acusação de crimes contra-revolucionários" ("Relatório Secreto", in Costa, R., 1985). O XVII Congresso do PCUS foi denominado o Congresso dos "Vencedores", isto porque celebrava o triunfo final do grupo estalinista sobre todos os adversários políticos, trotskistas e bukharinistas. Daí a importância que é atribuída por Khruchtchev ao desaparecimento e assassinato da maioria dos seus participantes, dado que integravam a sua linha política. Trotski e Bukharine, a esquerda e a direita bolchevique, não foram reabilitados nessa altura.
Foi também revelado as relações difíceis entre Lenine e Staline, no fim da vida daquele, e que transparecem no já referido "testamento de Lenine". Mas foi igualmente insinuado que Kirov, um importante dirigente do PCUS, tenha sido assassinado, em 1934, por ordem de Staline. Este crime teve enorme significado porque a sua execução foi atribuída por Staline aos seus opositores e serviu de base para os grandes processos de Moscovo (1936-38). Foi também denunciado o papel de Staline no início da II Guerra Mundial, ao ter decapitado a maioria da oficialidade soviética nos anos anteriores à sua eclosão, e ainda a denúncia de genocídios e deportações sucessivas de povos inteiros, que não eram justificadas por nenhumas considerações militares. Foi igualmente referido o tratamento infligido à Jugoslávia no pós-guerra, em que o regime de Tito foi acusado de ser pró-fascista, e a última abencerragem que foi "a conspiração das batas brancas", em que um conjunto de médicos do hospital do Kremlin, na maioria judeus, foi acusado de terem assassinado dirigentes do Partido. Esta caso só não teve consequências mais graves, mesmo assim três médicos morreram devido à tortura, porque Staline entretanto faleceu.
O Relatório não denunciou só os crimes de Staline, traçou igualmente o esboço do caracter do "Pai dos Povos", "enclausurado dentro Kremlin, recusando-se nos últimos 25 anos da sua vida, a dar uma olhada por uma aldeia soviética ...; recusando-se a descer até uma fábrica e a enfrentar os operários; recusando-se até mesmo a dar uma vista de olhos ao Exército do qual era Generalíssimo, quanto mais visitar a frente de batalha; passando a vida num mundo semi-real e semifictício de estatísticas e falsos filmes de propaganda; planejando impostos incobráveis, traçando linhas de frente e linhas ofensivas sobre um globo terrestre na sua escrivaninha; vendo inimigos à sua espreita em cada recanto ou sombra; tratando os membros do Presidium como desprezíveis lacaios; ... puxando os cordões por trás dos grandes julgamentos; pessoalmente conferindo e assinando 383 listas negras com o nome de milhares de membros condenados do partido; ordenando aos juizes e aos homens da NKVD (polícia política, JNF) para torturar as vítimas das depurações e delas extrair confissões; ... cercado por densas nuvens de incenso e, como fumador de ópio, ansiando por mais; inserindo pelo próprio punho passagens de louvor ao próprio "génio" - e à própria modéstia - na sua biografia oficial e nos compêndios de história ... e escrevendo o próprio nome no novo hino nacional, que deveria substituir a Internacional" (Deutscher, I., 1968) No entanto, o Relatório é omisso sobre o anti-semitismo que caracterizava a política de Staline no final dos anos 40 e início dos 50, de que a "conspiração das batas brancas" foi um afloramento. Nada é dito igualmente sobre os grandes processos de Moscovo, que permitiram a execução dos principais companheiros de Lenine, tais como Bukharine, Kamenev, Piatakov, Radek ou Zinoviev, nem da ordem para assassinar Trotski dada por Staline e Béria. Não dá senão uma pálida ideia dos campos de trabalho forçado, o GULAG, ou sobre todas as limitações que pendiam sobre o trabalho intelectual. No fundo, as causas do problema não são analisadas, limita-se a afirmar que tudo era devido a Staline (Elleinstein, J., 1992).
4 - As Consequências O choque provocado pelo Relatório de Khruchtchev foi terrível, primeiramente entre os delegados ao Congresso, depois, em geral, na população da URSS. Chegou a haver na Geórgia manifestações favoráveis a Staline, que era natural daquela República, e que foram severamente reprimidas, tendo havido vítimas (Elleinstein, J., 1992). No entanto, as suas principais repercussões verificaram-se entre os intelectuais (Fadeev, um escritor importante do regime, suicida-se) e no próprio Partido e na sua Direcção, dado que esta tinham colaborado activamente com Staline.
Foi, contudo, na Europa de Leste que o Congresso teve maior repercussão. As direcções dos partidos comunistas e operários que dirigiam aqueles países, e que tinham passado por depurações recentes, com julgamentos e condenações à morte, por imposição de Staline, foram completamente apanhadas de surpresa por estas revelações. Foi o caso de Ràkosi, na Hungria, e de Bierut, na Polónia.
Bierut morre logo a seguir ao XX Congresso (12/3/56). Consta "que o seu coração não resistiu" à revelação "de que os membros do Comité Central do seu Partido, exilados na URSS, tinham sido executados, clandestinamente e sem processo, no final da década de 30. Ele próprio e Gomulka haviam escapado, por estarem presos na Polónia e não se terem podido refugiar na URSS" (Buonicore, A., 2006). Em consequência do seu falecimento é eleita (20/3/56) uma figura de compromisso, Eduardo Ochab, para a direcção do Partido Operário Unificado Polaco (POUP). Gomulka, que tinha sido Secretário-Geral do Partido no pós-guerra (1945-48) e que esteve preso desde 1951 até ter sido libertado discretamente em 1954, é reabilitado e são libertados mais de 30 000 prisioneiros (Fejtö, F., 1975). A situação, no entanto, agrava-se e em Poznan, a 28 de Junho de 1956, têm lugar acontecimentos sangrentos. Os operários manifestam a sua cólera contra o aumento das normas de produção. Gomulka é proposto e é eleito, em 20 de Outubro, Secretário-Geral do POUP. Finalmente, a crise tinha sido, por agora, vencida.
Na Hungria o processo de destalinização evolui de forma muito mais dramática e violenta. Enquanto na Polónia a subida ao poder de Gomulka, que tinha sido vítima do estalinismo, permite uma solução, senão pacífica, pelo menos sem a intervenção directa do exército soviético, na Hungria a situação é diferente. Ràkosi, Secretário-Geral do Partido Comunista Húngaro, resiste o maior tempo possível, mas, por pressão de Moscovo, é substituído, em Julho de 1956, por Erno Gerö, fortemente ligado ao velho aparelho estalinista. A situação vai-se degradando. A 23 de Outubro realizam-se manifestações em Budapeste de solidariedade com a Polónia, que nessa altura estava em grande efervescência. Rapidamente, são gritadas nas manifestações palavras de ordem anticomunistas e antisoviéticas. Imre Nagy, que tinha sido Presidente do Conselho de 1953-55, e opunha-se ao anterior Secretário-Geral, é nomeado novamente Presidente do Conselho e Erno Gerö continua à frente do Partido. A 24 desse mês a insurreição propaga-se a todo o país. Verdadeiros bandos fascistas começam a assassinar comunistas (Elleinstein, J., 1992). Gerö é substituído por Kàdar. A 3 de Novembro Kàdar forma um novo partido comunista, rompe com o Governo de Nagy e constitui um Governo paralelo que apela à intervenção soviética. A 4 de Novembro as forças armadas soviéticas entram em Budapeste e Nagy refugia-se na Embaixada da Jugoslávia. A 9 de Novembro a luta armada cessa no país. Em Junho de 1958 Nagy será executado. Estes acontecimentos mostram os limites da destalinização. A revolta húngara abalou para sempre a confiança ilimitada que muitos intelectuais comunistas dos países capitalistas depositavam na União Soviética. Foi um duro golpe na sua imagem.
Iguais repercussões se verificam nos Partidos Comunistas dos países capitalistas. Thorez, em França, recusa-se a falar do Relatório, negando a sua existência e falando sempre "do relatório atribuído a Khruchtchev". Aragon, na sua "História da URSS", que foi publicada em França, em 1962, diz textualmente: "Segundo uma tradição que remonta a Lenine, os assunto dos debates à porta fechada não se tornam públicos; aconteceu assim com o segundo relatório de Khruchtchev (o Relatório Secreto, JNF). Como o texto que se publicou no estrangeiro não tem qualquer caracter oficial, não poderemos referir-nos a ele" (Aragon, L, 1969). Só em Janeiro de 1977 é que o Bureau Político do PCF decide revelar que a delegação francesa tinha tido conhecimento do Relatório durante o XX Congresso (Costa, R., 1985).
Repercussões iguais, incluindo no Partido Comunista Português (num segundo trabalho iremos abordar a sua influência no PCP), verificam-se noutros partidos comunistas.
Apesar das razões serem várias e complexas, podemos também considerar o XX Congresso como estando na origem do diferendo sino-soviético. A verdade é que o papel de Staline foi motivo de profundas divergências entre comunistas pró-soviéticos e maoistas. Como se verifica, tanto o "campo socialista" como o movimento comunista internacional foram apanhado de chofre pelas revelações do "Relatório Secreto". Pelo próprio desenrolar dos acontecimentos na URSS não houve tempo de preparar todos aqueles que durante anos tinham acreditado que Staline era o "Pai dos Povos " e o génio incontestado que conduzia o movimento comunista. Nesse sentido, muitas críticas foram dirigidas ao modo como o Relatório foi divulgado e mesmo à oportunidade da sua apresentação. Hoje, podemos considerar que ele era indispensável e que não haveria outro modo de o levar ao conhecimento do seu principal destinatário, o PCUS.
6 - Conclusões Ao fazer esta resenha histórica do que foi o XX Congresso do PCUS e do "Relatório Secreto" de Khruchtchev, não quero deixar por mãos alheias a comemoração de uma data tão importante para todos aqueles que acreditam que a renovação da ideia comunista é possível. A imprensa burguesa e os seus ideólogos ao relembrar esta data têm unicamente em vista dizer que, apesar destes esforços louváveis, o comunismo é uma impossibilidade. Os continuadores do estalinismo, mesmo que envergonhados, ou esquecem a data ou consideram que ela representou um passo à retaguarda.
Para nós, e como ficou explícito ao longo do texto, o relatório de Khruchtchev apesar de não ser uma análise marxista e muito menos desinteressada do que foi o estalinismo, foi a denúncia possível e a defesa de uma nova legalidade, que hoje se sabe ser manifestamente insuficiente. Passados cinquenta anos sobre esse evento, precisamos de um aparato conceptual que faça análise do que foi o "socialismo real" e o que ele representou na história contemporânea, de modo a nos podermos apetrechar teoricamente para a defesa de uma sociedade de outro tipo. No entanto, a denúncia e a análise deste período é indispensável para todos aqueles que, reivindicando-se do comunismo, não podem ficar nas águas mornas dos aspectos positivos e negativos da época de Staline, atribuindo a este todos os males e ao povo soviético e ao seu Partido todos os êxitos.
Por isso, mais do que nunca é necessário assumirmos o nosso passado, analisá-lo com a mesmo rigor com Marx descrevia a sociedade capitalista, de modo a propormos um comunismo para o nosso tempo, que tenha em conta as conquistas democráticas e civilizacionais e o imenso desenvolvimento das forças produtivas.
Bibliografia Aragon, L, 1969. "História da URSS". Publicações Europa-América, Lisboa. Boffa, G., 1960. "Le Grand Tournant, de Staline à Khrouchtchev". François Maspero, Paris. Buonicore, A., 2006. "Há 50 anos, o 20ª Congresso do PCUS marcou a grande cisão do movimento comunista". http://www.vermelho.org.br/diario . Costa, R., 1985. "O XX Congresso do PCUS e o PCP" in "Estudos sobre o Comunismo", n.º 3/4:1-15. Desanti, D., 1976. "Os Estalinistas (II)". Iniciativas Editoriais, Lisboa Deutscher, I., 1968. "Ironias da História. Ensaios sobre o Comunismo Contemporâneo". Civilização Brasileira, Rio de Janeiro. Elleinstein, J., 1992. "D'une Russie a l'autre. Vie et mort de l'URSS". Messidor, Éditions Sociales, Paris. Fejtö, F., 1975. "As Democracias Populares. 2. Depois de Estaline". Publicações Europa-América, Lisboa. Khruchtchev, N., 1990. "Memórias de Khruchtchev. As Gravações da Glasnost". Editorial Inquérito, Lisboa. Lewin, M., 2004. "O Século Soviético". Campo da Comunicação, Lisboa.
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