Milton Lourenço (*)
A levar-se conta os resultados das últimas negociações realizadas na Organização Mundial do Comércio (OMC), não são muito animadoras as perspectivas para uma maior aproximação comercial com os EUA. E culpa não cabe só ao governo brasileiro.
Não vamos voltar à retórica esquerdista dos anos 60, que atribuía todos os males do mundo ao imperialismo norte-americano, mas é preciso reconhecer que os EUA têm se recusado, sistematicamente, a abrir um diálogo mais intenso com o Brasil na medida em que não abre mão de determinadas pretensões.
É verdade que o governo brasileiro não teve sequer a preocupação de disfarçar a sua posição contrária à formação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), mas os EUA, em compensação, não precisavam rejeitar in limine a idéia de um acordo com o Mercosul, como foi proposto há dois anos. O que restou foi a possibilidade de um tratado semelhante ao que assinaram EUA e Chile, mas de difícil execução, já que, como sócio do Mercosul, o Brasil não poderia negociar sozinho um acordo de livre comércio.
Além disso, o acordo EUA-Chile envolve mais que acesso a mercados, incluindo, além de regras de investimento, medidas de proteção à propriedade intelectual definidas de acordo com as pretensões norte-americanas, o que poderia dificultar, por exemplo, a produção de medicamentos genéricos ou estimular retaliações comerciais. É com isto que o governo brasileiro não concorda. E não deixa de ter razão.
Com o fracasso das negociações no âmbito da OMC, ficou mais distante o dia em que o Brasil poderá ampliar o seu acesso ao mercado norte-americano. Diante disso, só resta insistir na redução de barreiras técnicas ao comércio de produtos farmacêuticos, siderúrgicos e de carnes, entre outros. Embora especialistas dos dois países tenham discutido medidas para a facilitação do comércio, normas técnicas e concessão de marcas e patentes, o esforço não tem sido suficiente para ampliar o acesso aos respectivos mercados.
O resultado é que as exportações do Brasil para EUA não têm crescido tanto quanto deveriam. De 1999 a 2005, o Brasil exportou para os EUA por ano, em média, US$ 26,2 bilhões, cifra que se torna ridícula se lembrarmos que aquele país importa US$ 2 trilhões anualmente. É claro que as nossas dificuldades crescem à medida que a China avança no mercado norte-americano, ocupando o lugar de produtos brasileiros, como calçados, têxteis, veículos, ferro, máquinas, aço, equipamentos de transporte e outros.
Levantamento da MB Associados mostrou que o Brasil só vem ganhando espaço em mercadorias como algodão, carne e tabaco. Mesmo assim, a perspectivas são sombrias porque a tendência do Congresso, agora sob maioria democrata, é criar ainda mais dificuldades para aprovar propostas comerciais encaminhadas pelo presidente Bush, em razão do forte lobby exercido pelos produtores agrícolas.
Para piorar, a União Européia já anunciou que dará prioridade em 2007 aos países asiáticos, o que significa que não pretende perder tempo com negociações com o Mercosul. Como os europeus já deixaram claro que só admitem cortar suas tarifas agrícolas de importação em 50% se os EUA aceitarem cortar seus subsídios, o que não tem a menor possibilidade de acontecer, não há nenhuma perspectiva de medidas que possam favorecer a entrada na Europa de produtos agropecuários do Mercosul.
Hoje, na ótica do governo, os maiores parceiros comerciais do Brasil não são nem os EUA nem a União Européia, mas sim os demais países em desenvolvimento, como os da América Latina, Caribe, África, Ásia, Europa Oriental e os países árabes, que, juntos, respondem por mais de 50% do nosso comércio exterior. Só que esses países também vêm negociando de maneira intensa com a China, um gigante que resolveu vincular o seu crescimento interno à exportação.
Segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), o superávit comercial que o Brasil tinha com a China em 2005 de US$ 1,5 bilhão caiu para US$ 400 milhões em 2006. E seguirá despencando em 2007. Tal como ocorre aqui, produtos chineses continuam a expulsar os concorrentes nos demais países em desenvolvimento. Logo, teremos de fazer novos malabarismos com os números para justificar a perda de mercados.
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(*) Milton Lourenço é diretor-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP (www.fiorde.com.br). E-mail: [email protected]
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