Reza pra São Keynes que o velho Marx tava certo! [1]
Estamos vivendo um período de grandes acontecimentos econômicos que marcam pontos de inflexão nos rumos da história. Com a crise hipotecária norte-americana foram postos em xeque as crenças (tanto dos piranhões de Wall Street como dos economistas liberais) no fundamentalismo de mercado: que queria fazer crer que as forças deste seriam capazes de sustentar uma economia mundial baseada em papéis sem lastro e na especulação financeira. A crise iniciou-se há pouco mais de um ano, no setor de empréstimos hipotecários norte-americanos, mas o estrago causado vai muito além do setor imobiliário.
Como escreveu Marx, os grandes fatos históricos do mundo sempre acontecem duas vezes a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa. Cito isto porque dá para ensaiarmos um paralelo entre a grande crise de 1929 e a atual crise financeira, contextualizando, claro, cada uma dentro da realidade de seu tempo. Enquanto a primeira se devia principalmente a superprodução ou a falta de demanda efetiva, a segunda se deve a formação de bolhas especulativas e a paralisação na oferta de crédito. Para a impetuosa economista Maria da Conceição Tavares a questão é que o crédito está congelado: entupiu o sistema circulatório do capitalismo. Sem crédito uma economia capitalista não funciona. Agora é torcer para que o entupimento não se transforme em trombose.
Todavia não ficarei me atendo aos números de quantos bancos e seguradoras mais andaram falindo ou sendo salvas nos últimos dias, ou aos percentuais de queda e reação nas Bolsas de Valores de todo o mundo. Isso podemos facilmente fazer acompanhando os tele-jornais. O que interessa realmente é captar historicamente a essência da atual crise, atentando para os fundamentos do desenvolvimento do capitalismo.
Mesmo os mais brilhantes economistas não sabem prever bem ao certo nem a duração, nem a profundidade e nem a amplitude das conseqüências desta crise. Todavia o que dá para se dizer é, que para explicar o que a provocou, temos que relacionar as principais transformações no padrão de desenvolvimento e do capitalismo depois dos 30 anos gloriosos que o sistema experimentou após a 2º Guerra Mundial. Com o esgotamento do modelo baseado no consumo de massa e na regulação salarial, a partir Consenso de Washington no fim dos anos 80 , a economia mundial tem passado pela ascensão das políticas neoliberais; o que tem provocado fenômenos como a reestruturação produtiva, a automação e desterritorialização das empresas, a informalização e precarização das relações de trabalho e, sobretudo, a desregulamentação e financeirização da economia. Quer dizer, a predominância da especulação sobre a produção.
Esta hegemonia da especulação só se tornou possível com o aumento da divida pública, com a instabilidade cambial e com o aumento da exploração do trabalho, evidenciada na transferência da produção de bens de consumo para a Ásia, especialmente para a China, onde a mão-de-obra é mal remunerada, portanto, os custos de produção mais baixos.
Isso tudo mostra que por mais que os conservadores não aceitem quem estava certo nessa conversa era o bom e velho Marx, quando dizia que todas as nações capitalistas são periodicamente acometidas de um desvario: o de fazer dinheiro sem recorrer ao processo de produção. Ou seja, especulando como parasitas no mercado financeiro. E agora o que resta à estes capitalistas improdutivos é rezar para que São Keynes estenda sua benção sobre o Bush para que o Estado intervenha; como já interviu, injetando 850 bilhões de dólares de dinheiro público na economia, com estatização e concessão de crédito aos bancos e as instituições financeiras. Mesmo que isso incorra em socializar os prejuízos. Ou seja, os bancos se salvam, mas as hipotecas podres dos apartamentos continuam ativas. Afinal, quem paga o pato no fim das contas, como sempre, é o povo.
O que resta é esperar que a crise nos países centrais do capitalismo não nos afete de forma comprometedora. Segundo a já citada Maria da Conceição Tavares, o presidente Lula saberá usar as vantagens de nossa economia: não dependemos exclusivamente da produção de petróleo vendemos, sobretudo, comida e temos três fortes bancos estatais, além do que resta das empresas que não foram privatizadas no auge do neoliberalismo de FHC. O que dá ao governo instrumentos para intervir fortemente no mercado.
[1] Escrito por Fabiano Escher .Economista e estagiário da Cooperiguaçu, em Francisco Beltrão, Paraná. Brasil
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