A paixão perdulária dos EUA por Israel

Como o presidente eleito Barack Obama (na foto, em visita ao AIPAC, o lobby de Israel) vai receber, com a herança desastrosa de George W. Bush, déficit orçamentário acima de US$1,3 trilhão, e como seu pacote de estímulo maciço à economia eleva-se a quase US$ 800 bilhões (para criar empregos e tirar o pais da recessão), supõe-se que gastos perdulários no atual quadro de dificuldades do país terão de ser revistos - ou repensados.


Nesse caso, pode ter chegado a hora de, digamos, pensar o impensável - e reexaminar a generosidade insólita (ou leviana) com que, nos últimos 60 anos, transferiu-se à responsabilidade do contribuinte americano o ônus de sustentar o estado de Israel e sua devastadora máquina de guerra. Dados conservadores da Washington Report On Middle East Affairs (WRMEA - saiba mais sobre ela AQUI) sobre o período 1949-1997 são assustadores.


É a seguinte a lista dos benefícios em ajuda recebidos por Israel: em concessões e empréstimos, US$74,1 bilhões; outras, US$9,05 bi; juros para Israel de pagamentos adiantados, US$1,65 bi. Total: US$84,9 bi (US$14,6 mil por israelense). E eis aqui o custo para o contribuinte: Grande Total, US$84,9 bi; custo para os americanos dos juros, US$49,9 bi (custo de cada israelense para o contribuinte nos EUA: US$23,2 mil). (Confira os números AQUI)


Não se faz paz indo à guerra
Fiquei intrigado e saí à procura desses dados depois de ler o comentário de um leitor à última coluna (“Why Israel Fights”) do neoconservador bushista Bill Kristol no New York Times (leia a coluna AQUI e a reação dos leitores AQUI). Na sua carta (na verdade, email) o leitor acha absurdo Israel ser na prática subsidiado com dinheiro do contribuinte em percentagem desproporcional do programa de ajuda externa. Até porque Israel é um aliado estranho, que usa seus agentes para espionar os EUA.


“Por que rotulamos de ‘terrorista’ a resistência palestina a uma ocupação opressiva, ao mesmo tempo em que perdoamos os abusos de Israel?” - pergunta. “Afinal, aqueles que alguns rotulam de ‘terroristas’, outros consideram ‘combatentes da liberdade’. E a melhor maneira de melhorar a situação no Oriente Médio e nossa própria segurança nacional é ficarmos neutros entre os dois lados, nunca dar apoio automático a Israel”.


O que escreveu aquele leitor (Patrick, da cidade novaiorquina de Ithaca), é sensato. Daí seu email ter ficado entre os cinco selecionados pelos editores e recebido o voto de 371 leitores (até a hora de meu acesso). A edição online do Times faz isso: publica todas as cartas, faz sua própria seleção (dos editores) e mostra as mais votadas pelos próprios leitores. É transparência imposta pela nova mídia, a que me referi no último post.


Dois comentários de leitores na seleção dos editores entre os mais votados foram de Jeannie (603 votos), da cidade de Nova York, e Dan B. (398), de Washington. “Não importa como você separe as coisas, não importa as maneiras usadas para justificar e explicar as ‘virtudes’ ou a aparente necessidade, a guerra é a rota fácil e estreita. Mas para ter paz, é preciso buscar a paz. Não se tem paz indo à guerra”, escreveu Jeannie.


As inúteis vitórias militares
“Se os EUA tivessem apoiado lideres moderados e ajudassem a estabelecer a paz, a dar moradia a pessoas, a alimentá-las e vesti-las, garantindo direitos humanos e educação para as crianças, muita violência seria evitada. Ódio pode ser ensinado mas em toda parte as pessoas querem a mesma coisa: atendidas as necessidades básicas do dia a dia, liberdade, dignidade e educação, os problemas são superados”.


E se agora Israel tiver sucesso e “ganhar”, o que vai acontecer? - perguntou Jeannie. “Vai ser melhor de alguma forma, ou simplesmente voltará tudo para outro, e depois mais outro status quo de animosidade mútua e ódio entre árabes e judeus, até que se chegue a mais uma guerra?”


Para Dan, “vitórias militares não favorecem a longo prazo os interesses de Israel. O povo palestino paga pelas ações de uma minoria. Gaza, até no cessar-fogo, estava sob sitio econômico. Mas Israel, como nação-estado, não paga pelas políticas oficiais, de governo, que levam à morte de civis”.


Dan conclamou seus amigos que gritam “Israel quer paz, o Hamas quer guerra” a pensar se aceitariam a situação dos palestinos, muitos cercados e além da muralha israelense, muitos mais sob ocupação desde 1948. “É fácil querer paz quando se tem tudo menos segurança. Aos palestinos falta, no dia a dia, muito mais que segurança, ainda que neste momento esta esteja em primeiro plano”.


Por trás de tudo, o lobby de Israel
São emails moderados, daí a escolha dos editores. No preferido pelos leitores (748 votos), o conservador Thomas (de Nova York) revolta-se por terem os americanos de pagar mais impostos para dar “apoio cego e incondicional a Israel”, que “não é uma democracia liberal e sim um apartheid religioso - democracia para os judeus mas não para os palestinos ali nascidos, hoje controlados militarmente e economicamente”.


Minha conclusão é de que a opção do apoio a Israel, adotada pelos governantes do país desde Harry Truman, resulta menos da tendência geral da população do que do trabalho liderado pelo milionário lobby israelense - o American Israel Public Affairs Committee (AIPAC - saiba mais sobre ele AQUI e veja acima a capa do livro que devassou toda a operação lobista, The Israel Lobby and U.S. Foreign Policy). De quatro em quatro anos todo candidato presidencial submete-se no AIPAC a ritual de purificação e declara seu apoio formal a Israel.


Quem ousa depois rever a posição - caso de Jimmy Carter, cujo livro Palestine: Peace Not Apartheid (capa acima) foi recebido em Israel com indignação - passa a ser rotulado publicamente como anti-semita. Mas Steven J. Rosen (foto ao lado), que em 23 anos transformou o AIPAC no que é hoje, uma organização dedicada a corromper políticos para servir aos interesses de Israel, está indiciado na justiça por espionagem, junto com Keith Weissman, outro operador lobista. E a testemunha é Larry Franklin, aliciado no Pentágono para espionar.


Rosen, afastado do AIPAC em 2005 para defender-se da acusação de espionagem, não perde a pose. Agora criou o blog “Obama Mideast Monitor” (veja-o AQUI) para monitorar nomeações do presidente eleito. Ali já vetou John Brennan, encarado por muita gente como a melhor opção para diretor da CIA (como Israel o acha contrário à guerra com o Irã, o cargo vai para Leon Panetta) e tenta emplacar o general James Jones para assessor de Segurança Nacional, por ser “amigo de Israel”.

http://www.patrialatina.com.br/editorias.php?idprog=c5c1cb0bebd56ae38817b251ad72bedb&cod=2991

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey