A extrema direita conseguiu pautar as manifestações de vinte e quatro de julho, não por méritos próprios, mas pela precipitação de um ato realizado fora de tempo e lugar, embora estivesse dentro do contexto macro dos tópicos das manifestações. Estar fora da sintonia temporal não significa que o ato foi um erro, mas que foi cronologicamente equivocado.
Os protestos eram contra o governo genocida de Jair Bolsonaro, a favor da vacina e pelo auxílio emergencial de R$600, porém um grupo de militantes da periferia, que traz reivindicações pertinentes sobre a prevaricação do trabalho, ateou fogo a uma estátua que serviu para que o ato fosse subitamente desqualificado.
Muitos vão dizer, acertadamente, que a estátua representa um caçador de indígenas, estuprador, genocida, como apontou Darcy Ribeiro em sua obra O Povo brasileiro. Por conta disso, se faz necessário passar um pente fino nas biografias de personagens históricos, para que sejam debatidos em uma discussão ampla.
Qualquer ato contra símbolos burgueses repressores, escravocratas, e de seguimento capitalista que oprimiu povos originários e negros é legítimo, devem sair das ruas e entrar nas salas de aula, porém temos que combater seus herdeiros vivos que continuam praticando as mesmas atrocidades, por isso os movimentos não podem acontecer no mesmo dia, porque um serve de nuvem de fumaça para o outro.
As praças das cidades brasileiras são poluídas com estátuas de heróis inventados, patronos assassinos, criminosos condecorados, reis bufões, príncipes covardes, patriarcados misóginos, que inspiram aberrações como a da secretaria de comunicação do governo, que homenageou o Dia do Agricultor, com a gravura de um jagunço com uma espingarda sobre o ombro.
O questionamento sobre a ação contra a estátua é de caráter estratégico, não de legitimidade. Será que o vinte e quatro de julho era o momento adequado para incendiá-la? A massa está preparada para entender essa ação específica contra a estátua, que ela normaliza desde 1963? Questionar o valor histórico da estátua, diante da tragédia social de uma fila de pessoas com fome e frio, sem poder de reação, não seria mais revolucionário?
Um dos organizadores do ato foi detido preventivamente pela polícia, o que foi visto como um aviso do Estado burguês contra a militância popular, embora a justiça não tenha a mesma pressa e peso com envolvidos não periféricos, como o empresário que teve queixa-crime negada depois de ameaçar o ex-presidente Lula de morte. Deixo aqui minha solidariedade aos companheiros militantes de todas as causas populares.
Ricardo Mezavila
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