Em seu novo artigo, intitulado 'Caso Colbert, algumas reflexões', o jornalista político Levi Vasconcelos, colunista do Bahia 247, faz sua análise sobre os excessos da Polícia Federal na Operação Voucher, que levou à prisão do secretário baiano do MTur, Colbert Martins Filho
16 do 08 de 2011 às 11:09
Por Levi Vasconcelos_247
Andando pelos corredores da Câmara semana passada, o jornalista Walter Xéu encontrou colegas que atuam em Brasília:
- Walter, me diga uma coisa: esse Colbert é santo?
- Não. Quando está invocado passa e não fala com ninguém, não é de dar tapinhas nas costas e nem de sair distribuindo beijinhos com o povão. Politicamente é pé duro, mas não é ladrão.
O episódio reflete o misto de perplexidade (e incredulidade) que invadiu os que conhecem Colbert Martins, preso e algemado pela Polícia Federal pouco mais de três meses depois de assumir o cargo de secretário Nacional de Programas de Desenvolvimento do Turismo do Ministério do Turismo.
Teria Colbert Martins, pessoa que pautou toda a vida pela seriedade no que contrata ou combina, virado corrupto nesse curto espaço de tempo?
Quando a Polícia Federal apareceu na frente dos jornalistas, em Brasília, a pergunta (cada jornalista tem direito a uma) saiu de bate pronto: como é que a investigação vem desde 2009 e Colbert, que tem apenas três meses no cargo, pode estar envolvido?
Resposta do porta voz da PF:
- Não vou falar sobre isso porque o processo corre em segredo de justiça.
Em suma, só havia um caminho, acreditar nele. Não deu. Em Feira, terra de Colbert, a mídia e o mundo político afiançaram pela honradez do acusado. Em Brasília, líderes de todos os partidos no mínimo manifestaram solidariedade, às vezes criticando a ação da PF, outras duvidando da veracidade dos fatos expostos na mídia.
Em qualquer caso, o consenso sobre um velho debate que voltou à tona: o exagero. Exibir para a mídia um Colbert algemado indignou a própria presidenta Dilma, que qualificou o episódio de 'um acinte'.
Se Dilma ficou indignada, por que não evita tais situações? Presidente só prende gente em ditaduras. Num regime democrático, quem prende é a polícia. Ela fez o que julgou que podia, mandou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que é quem comanda a PF, falar para 'conter os excessos'.
A indignação presidencial de nada adiantou, ao que parece. Na sequência, a PF deixou vazar fotos de Colbert e outros implicados nus, ostentando no peito aqueles números que os carimbam com o fichário de bandidos.
O episódio suscita algumas reflexões.
Não que se queira preservar autores de crimes de colarinho branco, mas cabe perguntar: é preciso algemar pessoas que nunca usaram um alfinete como arma, gente que não ofereceria resistência a uma ordem de prisão, e exibi-las para os fotógrafos?
Partindo-se da presunção de que a ação foi absolutamente correta, dentro dos rigores da boa prática policial, em tais casos, impõe-se a execração pública. Talvez por ser o Brasil como é - um país em que a Justiça, com o seu emaranhado de possibilidades processuais, parece extremamente generosa com acusados de crimes de colarinho branco (quase sempre resultam em impunidade) -, seja esta a única punição efetiva.
VAZAMENTO QUE CONVÉM
A polícia aí estaria aí acusando e punindo. Satisfaz a alguns. Todavia, como é que fica quando a polícia, por imperícia ou seja lá o que for, está errada? Quando humilha, execra, bota o carimbo de bandido, mas não prova o que diz?
No caso Colbert, ante o clamor geral, a PF usou uma estratégia também conhecida. Driblou o tal segredo de justiça deixando vazar algumas informações na tentativa de incriminá-lo midiaticamente. Só a título de ressalva, bom lembrar que tais vazamentos são por si duvidosos. Não se dá acesso à plenitude do inquérito e sim apenas ao que convém ao 'vazador'.
Veja o trecho do que vazou do relatório:
"Abadia, assessora de Colbert, fala sobre o cancelamento de convênios (com dinheiro de restos a pagar) de 2007, 2008 e 2009 que ainda não iniciaram. Colbert afirma que precisa analisar os de 2009 para decidir quais serão realmente cancelados, citando alguns exemplos, entre eles o Amapá 2, dizendo que seria problemático cancelar, pois seria do interesse de Sarney. Conclui-se, assim, que o período analisado ajudou a desvelar os motivos pelos quais os funcionários do Ministério do Turismo não acompanharam devidamente a execução do convênio sob investigação, deixando ocorrer várias irregularidades em sua execução".
Em termos políticos, mostra um Colbert preocupado em preservar os interesses de Sarney, presidente do Senado e senador pelo Amapá, o Estado dos implicados. Em termos criminais, não diz nada.
O próprio Sarney, ao ser abordado, disse que o problema não era político e sim de polícia. Não é só. Agora é de justiça também. E aí se desnuda outra situação: o procurador da República, Celso Leal, admitiu não incluir na sua denúncia Colbert e o ex-presidente da Embratur, Mário Moysés: 'Não haveria provas robustas'.
Como já indagado acima, e agora, como fica? Colbert e o Mário ficam com o prejuízo moral e ponto? A regra tem sido essa, o humilhado fica com a sua humilhação.
ESTRAGO RECONHECIDO
A PF já tem no seu currículo um largo cabedal de operações que renderam mais holofotes do que resultados práticos. E em muitas, fez vítimas inocentes. Em abril último, o juiz federal Nelson Gustavo Mesquita Ribeiro Alves, de Santa Catarina, condenou a União a pagar R$ 50 mil de indenização por danos morais ao empresário Roberto Carlos Castagnaro, preso e acusado de lavagem de dinheiro e associação para o tráfico de drogas em 2006.
Na sentença, o magistrado diz: "Apesar de toda a exposição midiática negativa sofrida pelo autor, o Ministério Público Federal não encontrou elementos probatórios da prática do crime de lavagem de dinheiro e pugnou pela sua absolvição".
Claro que R$ 50 mil não pagam o estrago moral. Mas é o primeiro caso de reconhecimento judicial dos excessos da PF, o que deveria servir de lição para uma instituição tão acreditada, que desserve a si e à sociedade quando comete erros a esse ponto.
Da PF espera-se, como polícia de escol, que uma acusação seja robusta o suficiente para gerar ação judicial de densidade induscutível. A própria Operação Voucher virou um exemplo maldito. Havia falcatruas no Ministério do Turismo? Pelo que diz a PF, e disso não se pode duvidar, claro que sim. Os responsáveis devem ser responsabilizados e punidos? Também é óbvio. Mas na Bahia, o que dominou as atenções foi o caso Colbert, com fortes indicativos de ter sido vítima de mais uma injustiça. Ou seja, só foi apanhado, preso e algemado porque estava lá no cargo.
Faltaram investigações específicas que o incriminassem ou não. Passou o que passou apenas por assinar papéis de processos de pagamento que já estavam em andamento desde muito antes dele estar lá. Os bandidos de fato e de direito acabam se beneficiando com os injustiçados.
Da mesma forma que a PF bota todos no mesmo balaio, a sociedade dá a recíproca à altura. Passa a duvidar de tudo
http://www.patrialatina.com.br/editorias.php?idprog=4ef42b32bccc9485b10b8183507e5d82&cod=8497
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