O Bloco de Esquerda, pela voz do seu deputado António Chora, operário e dirigente da Comissão de Trabalhadores de uma fábrica de automóveis, apresentou à Assembleia da República, na passada semana, um projecto de lei que propõe "modernizar e dignificar o exercício da actividade das comissões de trabalhadores para permitir a democracia nas empresas".
Esta proposta tem em conta que "a economia e a organização da produção evoluiram profundamente. A economia globalizaou-se, trazendo novos problemas como a deslocalização das empresas e da produção, a transformação da organização da produção com a subcontractação e (...) o recurso massivo ao trabalho temporário e precário".
Não se trata de uma proposta revolucionário ou sequer radical: basicamente, visa repor legislação destruída pelos recentes governos de direita PSD+CDS/PP. É por isso um desafio ao PS que agora governa com maioria absoluta no parlamento: "quer a lei com a qual governou anteriormente ou quer manter a lei de Bagão Félix?"
Pravda.Ru apresenta aqui o essencial da fundamentação desta proposta do Bloco de Esquerda:
1 As grandes empresas dividiram-se e organizaram-se em grupos, a subcontractação e a precariedade generalizaram-se e muitas vezes a maioria dos trabalhadores, afectos a um determinado estabelecimento, são subcontractados. Os trabalhadores permanentes são, cada vez mais, uma minoria. Considera o BE que esta realidade impõe duas soluções novas, democráticas e modernas:
- a primeira é assegurar a protecção e a representação de todos os trabalhadores e não só dos permanentes, de modo a abranger os trabalhadores das empresas subcontractadas e precários, alargando os direitos de participação e a representação da CT a todos eles.
- A segunda é possibilitar a criação de CT's por grupo de empresas, sem ser necessário criar uma CT por cada empresa (desse grupo).
2 A precariedade, a prepotência e o medo do despedimento generalizaram-se, o trabalhador está mais desprotegido. Em muitas empresas é reprimido o exercício democrático e constitucional do direito à greve. (...) Num regime democrático a greve não deve ser só decidida pelos sindicatos mas também pelos trabalhadores dentro das empresas. Assim, deve ser atribuída também à Comissão de Trabalhadores a possibilidade de convocar o plenário que decidirá ou não a convocação da greve, independentemente do número de filiados sindicais na empresa. Inclusivamente como forma de obstar ao facto de, com o aumento da repressão, muitos sindicalizados e muitos sindicatos não transmitem a sindicalização à empresa para que o trabalhador não seja despedido e, portanto, não se sabe quem é e quem não é sindicalizado.
3 A protecção legal aos trabalhadores que exercem os cargos de membros das CT's, para que foram eleitos, tal como acontece com os delegados sindicais, foi retirada pelo Código do Trabalho (aprovado pela anterior maioria de direita PSD+CDS/PP) mas será reposta com este projecto de lei. È de elementar justiça democrática proteger a parte mais fraca da relação de trabalho, em particular os representantes dos trabalhadores que são alvo muitas vezes de perseguição patronal. Por outro lado, propõe-se eliminar o artigo 470.º do Código ("exercício abusivo"), pela simples razão que este artigo tem como finalidade criminalizar a actividade daqueles que são mais firmes e activos na defesa dos direitos legais dos trabalhadores.
4 Outro aspecto é a possibilidade das CT's obterem financiamento para o exercício das suas actividades, nomeadamente para poderem recorrer a apoio jurídico, pois a complexidade das actuais relações de trabalho, da economia e das leis que a regulam, não é compatível com uma actividade menos responsável de defesa dos trabalhadores. Muitos dos pareceres pedidos às CT's exigem conhecimentos jurídicos, domínio de legislação e de noções de economia, pelo que é fundamnetal obter apoio especializado. Também acontece que muitas entidades patronais, quantas e quantas vezes violando as leis, não cumprem com os apoios já hoje determinados, obrigando à paralisia da actividade das CT's. Assim é necessário que estas possuam meios financeiros mínimos para a resolução dos problemas mais urgentes da sua actividade de defesa dos trabalhadores. Nesta perspectiva, propõe-se como solução que as CT's possam propor à decisão dos trabalhadores a criação de um financiamento até 1% do salário base, no mês de pagamento do subsídio de férias, descontado aos trabalhadores que a ele voluntariamente aderirem. Uma proposta que até já é prática de algumas CT's.
5 Para o cabal exercício da actividade das comissões de trabalhadores há que estabelecer precisamente os seus direitos legais. Recorda-se aqui, que numa empresa do sector rodoviário a entidade patronal se recusava a fornecer qualquer apoio por mínimo que fosse à CT. A situação só ficou minimamente resolvida quando a CT deu um parecer, obrigatório por lei, escrito em papel de saca de cimento.
Assim, estabelecem-se precisamente os direitos legais e clarificam-se os meios que a empresa é obrigada a pôr ao serviço da CT, aumenta-se o crédito de horas, alarga-se a obrigatoriedade de parecer prévio à deslocalização e subcontractação de produção, e aos regulamentos internos, repõe-se o exercício do controlode gestão em vez do empenhamento responsável dos trabalhadores na vida da empresa, desjudicializa-se e desburocratiza-se o início de actividade da CTE, deixando de depender da publicação em BTE.
Com esta proposta o Bloco de Esquerda lança ao PS um desafio simples: "tem que fazer escolhas: quer retomar condições mínimas para a existência de democracia dentro das empresas ou quer manter as opções do código Bagão Félix e manter as normas mais conservadoras?"
Luís Carvalho
PRAVDA.Ru
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