Atrasado no tempo como os conservadores em geral, FMI admite que neoliberalismo é um fracasso em termos de distribuição de riqueza
Contudo, à reprodução tupiniquim e piorada de McCarthy, pautada pela mídia oligárquica e seus subprodutos políticos, de nada adiantará
Edu Montesanti
Em sua revista deste mês de junho, o próprio Fundo Monetário Internacional criticou, não tão abertamente, as políticas neoliberais através de alguns de seus principais economistas, Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani e Davide Furceri. "Ao invés de produzir crescimento, algumas políticas neoliberais têm aumentado a desigualdade, por sua vez colocando em risco a expansão duradoura", observam eles.
É interessante notar que o propalado neoliberalismo foi aplicado exatamente por governos autoritários e profundamente corruptos - casos de América Latina sob ditadura militar, Estados Unidos sob os Bush e Reagan, e Reino Unido nos anos de Margaret Tatcher, conhecida como Dama de Ferro. Tal fato pode causar surpresa inicial, mas não nenhuma contradição dada a natureza excludente do modelo econômico em questão.
Nas palavras da jornalista canadense Naomi Klein, "se olharmos para a história dos primeiros lugares onde o neoliberalismo foi imposto, ele foi imposto exatamente no oposto [do que nos é dito]: foi necessária uma derrubada da democracia para que ele se desenvolvesse".
Pois os três economistas do FMI também mencionaram contradições e fragilidades do modelo neoliberal, cujos defensores o alardeiam como essencialmente democrático: "[Maurice] Obstfeld [1998] apontou para os 'perigos genuínos' de abertura aos fluxos financeiros estrangeiros, e concluiu que 'esta dualidade de benefícios e riscos é inevitável no mundo real'". Mais adiante, eles observam: "Embora os benefícios do crescimento [econômico no modelo neoliberal] sejam incertos, os custos em termos de aumento da volatilidade econômica e a frequência de crises parecem mais evidentes".
Eles apontam ainda que enquanto "o crescimento é o único ou o principal objetivo da agenda neoliberal, seus defensores deveriam dar mais atenção aos seus efeitos distributivos [de riqueza]", e que o FMI "também reconhece que a liberalização total do fluxo de capital não é sempre uma meta final apropriada".
Por outro lado, políticas sociais são aplicadas exatamente como socorro às crises profundas geradas pela maximização do livre-mercado. Casos emblemáticos são o New Deal norte-americano do presidente Franklin Delano Roosevelt e os Estados de Bem-Estar Social europeus, pós-Grande Depressão iniciada pela quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque em 1929.
Os países nórdicos, berço da social-democracia, sempre foram exemplos neste sentido, nos dias de hoje abrindo-se ao Consenso de Washington formulado em 1989, diminuindo a influência estatal e assim, como sempre ocorreu na história, tornar as economias nacionais mais vulneráveis.
Enquanto tal modelo gera horror em setores reacionários pautados pela mídia predominante defensora dos interesses das grandes corporações que a sustentam, que chegam a ponto (não raras vezes) de qualificá-lo de "comunismo diabólico", por outro lado a intervenção estatal de Bush filho em 208, maior da história destinada ao socorro aos bancos criminosos, exatamente os geradores da depressão econômica de então (não sanada até hoje), o qual ultrapassou 1,8 trilhão de dólares, e dois anos depois o plano de salvação de Barack Obama à indústria automobilística acima da casa dos 60 bilhões de dólares, acomodam os espíritos mais conservadores das sociedades.
Da parte do FMI, contudo, não se deve esperar que esta tímida mea culpa seja fruto de uma sincera conversão econômica de sua cúpula, e que venha a trazer consigo alguma mudança na imposição do Consenso de Washington aos Estados nacionais e de crises internacionais a fim de pavimentar a estrada ao domínio dos Estados Unidos.
Pelo contrário: a análise dos economistas Ostry, Loungani e Furceri contém a velha didática imperialista de sempre, que move a instituição com sede na capital norte-americana de Washington: aprofundar as próprias práticas neoliberais vindo a alegar, em um futuro próximo, que as crises se devem ao fato de que tal política econômica não tem obtido o êxito esperado dado que muitos Estados ainda interferem, em maior ou menor grau dependendo do caso, nas economias locais - o que, aliás, é vez ou outra comentado por "analistas" da mídia predominante internacional, como ocorreu há algum tempo na própria CNN.
No caso do Brasil, vale apontar que no atual festival da despolitização tupiniquim que tirou da Presidência uma das únicas políticas sem acusação nem sequer sendo investigada por corrupção, para colocar no poder, nas palavras de Noam Chomsky (intelectual mais respeitado do mundo) "uma corja de ladrões" sob forte influência e aplausos midiáticos, as classes média e alta brasileiras têm apoiado agora e historicamente o model neoliberal, com a típica raiva caçadoras de bruxas anti-comunistas presente na ridícula votação pelo impedimento da presidente Dilma Rousseff (assim observado por todos os meios de comunicação mundiais), e nestas semanas subsequentes.
Apontado neste sentido, da excessiva ignorância baseada na ditadura do mercado que relega todo o aparato do Estado e a própria sociedade à lógica do lucro (que é ilógica) e da profunda despolitização, baseadas em desenfreada competitividade, no ódio às diferenças e nos preconceitos étnicos, regionais, sociais, sexistas e de gênero, é a cara perfeita da sociedade brasileira, de seu estilo e de sua estatura moral e intelectual, este público ataque gospel-reacionário da jurista Janaína Paschoal na Faculdade de Direito da USP, no início de abril capaz de gerar desconforto até entre colegas e alunos reacionários - portanto, nada dotados de grande senso do ridículo e de consideráveis capacidades intelectuais.
Famosas internacionalmente pela essência corrupta, pela fortíssima discriminação, pela agressividade e pela incapacidade organizacional que, no país do carnaval e do futebol decadente, dia a dia se superam, que se creem sábias ao mesmo tempo que, na ausência de autonomia reflexiva, são capazes de caírem no engodo de personagens como Temer, Sarney, Calheiros, Eduardo Cunha e da mesma mídia sabidamente manipuladora e historicamente golpista, bem como devota das própria retórica de "liberdade" baseada na lei do mercado, as mentalidades elitistas brasileiras (que não escolhem classe social) podem ter a condição de prostração intelectual e de falência moral refletida com perfeição nas palavras de Johann Wolfgang von Goethe: "Ninguém está mais desesperadamente escravizado, que aquele que falsamente acredita ser livre".
E em não raros casos, certamente, é ainda mais sofrível ter-se consciência da escravidão econômica, social e política passivamente por medo, por interesse ou por uma patética combinação de ambos. Para os setores reacionários nacionais, imbecilizados pela grande mídia oligárquica pertencente a cinco famílias e financiada diretamente por Washington (fato comprovado documentalmente por WikiLeaks), pode o FMI e todas as evidências, atuais e históricas, apontar contrariamente a suas ideias pré-concebidas que tudo será em vão e seguirá como está, com um presidente interino (corrupto) prometendo aprofundamento das políticas neoliberais através de mais privatizações e desregulação estatal sob alegres aplausos da sociedade de um lado, e silêncio de outro. A história e o presente apontam para isso, e quanto ao futuro é esperar para ver o mesmo filme, de novo, entre as reproduções tupiniquins e pioradas de Joseph McCarthy.
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