Fiesp lança campanha em defesa de leilões para escolher quem vai herdar direito de explorar usinas e linhas transmissão hoje com empresas públicas. Movimentos sociais reagem e preparam campanha para que governo prorrogue concessão das estatais. Renovação exige mudar lei, e Senado já vê lobby. Debate iniciado sob Lula mostra Dilma inclinada a evitar leilões.
Najla Passos
BRASÍLIA - A partir de 2015, começa a vencer o prazo legal que garante a uma série de estatais o direito de controlar usinas hidrelétricas, linhas de transmissão e distribuidoras de energia. Pela lei, o governo não pode renovar os contratos. Teria de fazer um leilão - quem pagasse mais ou aceitasse cobrar menos pela energia entregue ao consumidor, levaria a concessão.
Com o Brasil mantendo perspectivas de crescimento econômico no futuro próximo em meio a um mar de incertezas pelo mundo, a hipótese de serem feitos leilões enche os olhos de grandes investidores nacionais e estrangeiros. Quem não gostaria de administrar uma hidrelétrica sabendo que o país vai precisar cada vez mais de energia?
Com o mote de lutar pelo barateamento da conta de luz, uma das mais representativas entidades patronais do país, a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), lançou recentemente a campanha "Energia a Preço Justo", com a qual defende que sejam feitos leilões privatizadores das concessões que vão se encerrar.
O evento atraiu dezenas de deputados, empresários e até dirigentes de dois órgãos reguladores federais. Foi uma demonstração de força que assustou adversários das privatizações. Em resposta, alguns movimentos sociais decidiram lançar, na próxima sexta-feira (18), a campanha "Todos pela energia - Privatização nunca mais, chega de apagão", de apoio à renovação das concessões.
Por trás da iniciativa, estão entidades como Federação Nacional dos Urbanitários (FNU), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e Federação Interestadual de Sindicato de Engenheiros (Fisenge).
O grupo defende que o Congresso mude a atual lei de concessões, sancionada em 1995 pelo então presidente Fernando Henrique, para permitir que as concessões em vigor possam ser renovadas pelo governo sem a necessidade de leilão. Como têm mais dinheiro em caixa, seria grande a chance de empresas privadas vencerem a disputa contra as estatais.
"Realizar novos leilões seria o mesmo que promover uma nova rodada de privatizações trazendo consequências como desemprego, má qualidade dos serviços e preços elevados", diz panfleto da campanha, que recorda o racionamento de energia ocorrido no governo FHC em 2001.
Lobby e governo
No Congresso, o lobby corre a todo vapor. As Comissões de Infra Estrutura e de Assuntos Econômicos do Senado têm feito audiências públicas com uma série de empresários interessados no tema e com autoridades do governo.
Para o coordenador nacional do MAB, Gilberto Cervinski, o empresariado quer a privatização. Entretanto, como sabe que a simples menção do termo provoca reação contrária de setores da sociedade, resolveu falar em abertura de "licitações", o que, na prática, significaria a mesma coisa.
"O Plano B da Fiesp é aprovar a distribuição de energia a preço de custo para as grandes empresas, como a Vale do Rio Doce e a Alcoa, por exemplo. Nós, ao contrário, queremos que a redução no valor da tarifa beneficie o consumidor residencial, que foi quem financiou a modernização do setor, pagando mais caro a sua conta de luz", diz.
Os movimentos esperam reunir cinco mil trabalhadores no lançamento da campanha. O local escolhido é simbólico: a cidade baiana de Paulo Afonso, sede de um conglomerado de usinas hidrelétricas construídas no Rio São Francisco e que estão sob controle estatal.
As duas campanhas - da Fiesp e dos movimentos sociais - tentam influenciar uma decisão que em última instância cabe ao Congresso, como casa legislativa. Mas, como sempre, o governo terá posição determinante. E, embora o problema só se coloque concretamente para o sucessor de Dilma Rousseff, precisa ser resolvido desde já, dadas as consequências potenciais para o país.
O governo começou a estudar o tema ainda na administração Lula. Na época, a agora presidenta, na condição de chefe da Casa Civil, não mostrava simpatia pela realização de leilões. Como ministra de Minas e Energia no primeiro ano da gestão Lula, Dilma concebera um novo marco regulatório para o setor que reforçou o peso estatal.
O problema agora é arrumar bons argumentos jurídicos e políticos para defender a renovação automática das concessão e definir em que condições isso poderia ocorrer. No governo Lula, cogitava-se inclusive mudar a lei por medida provisória. Mas não havia segurança absoluta de que uma alteração na Constituição fosse desnecessária.
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