De uma economia de crescimento fracassado a uma economia de estado estacionário

por Herman E. Daly *

Uma economia de estado estacionário é incompatível com o crescimento contínuo — tanto o crescimento positivo como o negativo. O objectivo de um estado estacionário é manter um stock constante e suficiente de riqueza real e de pessoas por um longo tempo. Uma espiral em declínio de crescimento negativo, uma depressão tal como a que estamos a entrar agora, é uma economia de crescimento fracassado, não uma economia de estado estacionário.

 Travar uma espiral de declínio em aceleração é necessário, mas não é a mesma coisa que retomar crescimento positivo contínuo. O crescimento económico agora falha de dois modos: (1) o crescimento positivo torna-se não económico na nossa economia já plenamente mundial; (2) o crescimento negativo, resultante do estouro de bolhas financeiras infladas para além dos limites físicos, apesar de temporariamente necessário, torna-se a seguir auto-destrutivo.

 Isto é deixar uma economia de não-crescimento, ou de estado estacionário [1] , como a única alternativa a longo prazo. O nível de riqueza física que a biosfera pode manter num estado estacionário pode muito bem estar abaixo do nível actual. O facto de que esforços recentes de crescimento tenham resultado principalmente em bolhas sugere que isto assim é. No entanto, todas as políticas actuais têm como objectivo o pleno restabelecimento do crescimento da economia. Ninguém nega que os nossos problemas seriam mais fáceis de resolver se fossemos mais ricos. A questão é, será que o crescimento nos faz mais ricos? Ou será que nos torna mais pobres?

Vou dispender mais uns poucos minutos a amaldiçoar o negrume do crescimento, mas a seguir tentarei acender dez pequenas velas ao longo do caminho para um estado estacionário. Alguns aconselharam-me a esquecer o negrume e concentrar-me na política das velas. Mas descobri que sem um fundo negro a luz das minha velas não é visível na aurora falsa projectada pelos economistas, cuja propaganda do optimismo jamais dá à esperança uma oportunidade de emergir das sombras.

Temos muitos problemas (pobreza, desemprego, destruição ambiental, défice orçamental, défice comercial, salvamentos, bancarrotas, arrestos, etc), mas aparentemente apenas uma única solução: crescimento económico, ou como os sabichões agora gostam de dizer, "crescer a economia" – como se esta fosse um batateiro com folhas curativas, como aloe vera ou marijuana.

Mas deixem-nos parar aqui e formular duas perguntas que todos os estudantes deveriam apresentar aos seus professores de teoria económica.

Primeiro, há um teorema profundo de matemática que diz que quando algo cresce ele se torna maior! Assim, quando a economia cresce ela também fica maior. Quão grande pode ser a economia, Professor? Quão grande é agora? Quão grande deveria ser? Será que os economistas consideraram estas questões? E mais subtilmente, o que os faz pensar que crescimento (isto é, expansão física do subsistema económico dentro do finito contendo a biosfera) já não está a aumentar os custos ambientais e sociais mais rapidamente do que os benefícios da produção, tornando-se desta forma crescimento não económico, fazendo-nos mais pobres e não mais ricos? Afinal de contas, o PIB real, a medida chamado do crescimento "económico", não separa custos de benefícios, mas amalgama-os como actividade "económica". Como saberíamos quando o crescimento se torna não económico? A actividade correctiva e defensiva torna-se sempre maior quando crescemos de um "mundo vazio" para uma economia "mundo total", caracterizada pela congestão, interferência, deslocação, esgotamento e poluição. As despesas defensivas induzidas por este factos negativos são todas acrescentadas ao PIB, não subtraídas. Estejam preparados, estudantes, para alguns gestos de mão, limpezas de garganta e mudança de assunto. Mas não se deixem enganar.

Segunda questão. Será que o senhor, Professor, vê o crescimento como um processo contínuo e desejável em si mesmo – ou como um processo temporário necessário para alcançar um nível suficiente de riqueza o qual posteriormente seria mantido num estado mais ou menos estacionário? Pelo menos 99% dos modernos economistas neoclássicos mantêm a visão do crescimento para sempre. Temos de remontar a John Stuart Mill e a Economistas Clássicos mais antigos para encontrar tratamento sério da ideia de um não crescimento da economia, o Estado Estacionário. O que é que faz os economistas modernos tão seguros de que os Economistas Clássicos estavam errados? Apenas expurgar a história do pensamento económico do curriculum não é uma refutação.

Aqui estão algumas razões para pensar que os Economistas Clássicos estavam certos.
Uma norma de crescimento contínuo a longo prazo podia fazer sentido apenas se uma das seguintes três condições fossem verdadeiras:

(a) se a economia não fosse um subsistema aberto de um sistema biofísico finito e não crescente,

(b) se a economia estivesse a crescer numa dimensão não física, ou

c) se as leis da termodinâmica não se mantivessem.

Vamos considerar cada uma destas três alternativas lógicas (se puder pensar numa quarta, deixe-me saber).

a) Alguns economistas pensam acerca da natureza como se fosse de facto o conjunto de subsectoresextractivos da economia (florestas, pescas, minas, poços, pastos e mesmo agricultura...). A economia, não o ecosistema ou a biosfera, é vista como o todo; a natureza é uma colecção de partes. Se a economia é o todo então não é uma parte de alguma coisa ou sistema mais vasto que pode restringir a sua expansão. Se algum subsector extractivo natural se tornar escasso nós apenas substituímos outros sector por ele e o crescimento da economia total continuará, não dentro de qualquer envelope biosférico e sim no espaço sideral presumivelmente cheio de recursos colhidos em asteróides e amistosos extra-terrestres altamente evoluídos ansiosos por nos ensinarem como crescer para sempre no seu território. As fontes e os sumidouros são considerados infinitos.

(b) Alguns economistas dizem que o que está a crescer no crescimento económico é valor, e o valor não é redutível a unidades físicas. Isto é verdade, naturalmente, mas não quer dizer que o valor seja independente da física ! Afinal de contas, valor é preço vezes quantidade, e quantidade é sempre basicamente física. Mesmo serviços são sempre o serviço de alguma coisa ou de alguém por algum período de tempo e as pessoas que prestam serviços têm de comer. O valor unitário de PIB não é dólares e sim o valor do dólar. Um valor de dólar de gasolina é uma quantidade física, actualmente meio galão [1 galão = 3,78 litros]. A agregação de quantias de valor em dólares de muitas mercadorias físicas (PIB) não abole a fisicalidade da medida muito embora o agregado já não possa ser expresso em unidades físicas. Na verdade, $/q x q = $. Mas o facto de q ser matematicamente cancelado não significa que a medida agregada, "valor em dólares", seja apenas uma pilha de dólares. E não ajuda falar ao invés de "valor acrescentado" (pelo trabalho e capital) porque devemos perguntar, o que é valor acrescentado? E a resposta é recursos naturais, matéria/energia de baixa entropia — pó de fadas ou pelo de rã! O desenvolvimento (espremer mais bem estar da mesma produção de recursos) é uma coisa boa. O crescimento (pressionar por mais recursos través de uma economia fisicamente maior) é o problema. Limitar o crescimento quantitativo é o caminho para forçar o desenvolvimento qualitativo.

(c) Se os recursos pudessem ser criados a partir do nada e os resíduos pudessem ser aniquilados no nada, então poderíamos ter uma produção de recursos sempre em crescimento através da qual alimentaríamos o crescimento contínuo da economia. Mas a primeira lei da termodinâmica diz NÃO. Ou se pudéssemos apenas reciclar a mesma matéria e energia através da economia cada vez mais rapidamente poderíamos manter o crescimento em andamento. O diagrama de fluxo circular de todos os textos de iniciação à teoria económica infelizmente aproxima-se muito desta afirmação. Mas a segunda lei da termodinâmica diz NÃO.

Assim — se não conseguirmos arranjar saída para todos os problemas, então talvez devêssemos reconsiderar a lógica e as virtudes do não crescimento, a economia de estado estacionário. Por que esta recusa da parte dos economistas neoclássicos tanto a enfrentar o senso comum como a reconsiderar as ideias dos antigos Economistas Clássicos?
Penso que a resposta é amargamente simples. Sem crescimento, o único meio de curar a pobreza é partilhar. Mas a redistribuição é anátema. Sem crescimento a pressionar o expectável quanto à transição demográfica, o único meio de sanar a superpopulação é através do controle demográfico. Um segundo anátema. Sem crescimento o único meio de aumentar fundos para investir em reparação ambiental é reduzindo o consumo actual. Anátema número três. Três anátemas e vocês estão amaldiçoados — vão para o inferno!

E sem crescimento como acumularemos arsenais para proteger a democracia (e as reservas de petróleo remanescentes)? Como iremos a Marte e Saturno e "conquistar" o espaço? De onde pode vir o progresso técnico se não das decorrências inesperadas da investigação militar e espacial? Tecno-fantasias gnósticas de escapar da terra para o espaço exterior, e de abolir a doença e a própria morte, alimentadas no mito do crescimento perpétuo sem limites. Maníacos da técnica com cérebro digital, que nunca ouviram do problema do mal, vêem o céu sobre a terra (o crescimento eterno) bem ali ao virar da esquina. Sem crescimento devemos enfrentar a difícil tarefa religiosa de descobrir um deus diferente para adorar. Demasiado assustador, dizemos, vamos tentar crescer um pouco mais em vez disso! Vamos dar a partida no carro do PIB e do Dow-Jones com um "encosto" na bateria! Vamos construir uma outra torre de Babel com palavras técnicas ofuscantes como hipotecas sub-prime, derivativos, veículos de investimento titularizado, obrigação de dívida colaterizada, credit default swap, activos "tóxicos" e jargão de iniciados como o "dead cat bounce" [2] . (Se você cair de uma torre de Babel bastante alta mesmo um gato morto saltará o suficiente para fazer algum lucro.)
Bem, não vamos fazer isso. Vamos ignorar os anátemas e, ao invés, pensar acerca de que políticas seriam necessárias para nos movermos para uma economia de estado estacionário. Elas são um bocado radicais pelos padrões actuais, mas não insanamente irrealistas como qualquer das três alternativas para validar o crescimento contínuo, acima discutidas.

DEZ PROPOSTAS POLÍTICAS

Vamos examinar brevemente dez propostas específicas de políticas para nos movermos para uma economia de estado estacionária, isto é, uma economia que assegure um fluxo metabólico constante de recursos desde o esgotamento até a poluição — um fluxo de materiais que esteja dentro das capacidades assimilativas e regenerativas do ecosistema.

1. Sistemas de comércio por leilão com tecto (Cap-auction-trade systems) para os recursos básicos. Os tectos limitam a escala biofísica por quotas sobre o esgotamento ou a poluição, não importa qual seja mais limitante. O comércio permite a distribuição eficiente às melhores utilizações. Esta política tem a vantagem da transparência. Há um limite para a quantidade e a taxa de esgotamento e poluição que a economia pode permitir-se impor ao ecosistema. Os tectos são quotas, limites ao fluxo de recursos básicos, especialmente combustíveis fósseis. A quota habitualmente deveria ser aplicada ao input final porque o esgotamento está mais espacialmente concentrado do que a poluição e portanto é mais fácil de monitorar. O preço mais elevado de recursos básicos também induzirá à sua utilização mais económica em cada etapa a montante da produção. Pode acontecer que o limite efectivo na utilização de um recurso provenha da poluição que ele provoca ao invés do esgotamento — não importa, nós indirectamente limitamos a poluição ao restringir o esgotamento do recurso que acaba por ser convertido em resíduo. A limitação a barris, toneladas e pés cúbicos de carbono de combustíveis extraídos limitará as toneladas de CO2 emitidas [3] . Este limite de escala atende o objectivo da sustentabilidade biofísica. A propriedade das quota inicialmente é pública — o governo leiloa-as a indivíduos e firmas. Os rendimentos vão para o tesouro e são utilizados para substituir impostos regressivos, tais como impostos sobre folhas de pagamentos, e reduzir o imposto sobre os rendimentos mais baixos. Uma vez compradas em leilão as quotas podem ser compradas e vendidas livremente por terceiros, assim como o podem os recursos cuja taxa de esgotamento eles limitam. O comércio permite a atribuição eficiente dos recursos; o leilão serve apenas para a distribuição e o tecto serve o objectivo da escala sustentável. A mesma lógica pode ser aplicada à limitação de capturas de bancos pesqueiros e à extracção florestal.
2. Imposto ecológico de reforma — comutar a base fiscal do valor acrescentados (trabalho e capital) e sobre "o que o referido valor é acrescentado", nomeadamente o fluxo entrópico de recursos extraídos da natureza (esgotamento) e devolvidos à natureza (poluição). Isto internaliza custos externos bem como eleva o rendimento mais equitativamente. Dá um preço à escassa, mas anteriormente sem preço, contribuição da natureza. Valor acrescentado é algo que encorajamos, assim cessemos de tributá-lo. Esgotamento e poluição são coisas que queremos desencorajar, assim tributemo-los. O imposto ecológico de reforma pode ser uma alternativa ou um suplemento aos sistemas de comércio por leilão com tecto.

3. Limitar a amplitude da desigualdade na distribuição do rendimento — um rendimento mínimo e um rendimento máximo. Sem crescimento agregado a redução da pobreza exige redistribuição. A igualdade completa é injusta, a desigualdade ilimitada é injusta. Procurar limites razoáveis para a amplitude de desigualdade. A função pública, os militares e a universidade são administradas com uma amplitude de desigualdade com factor de 15 ou 20. A América corporativa tem uma amplitude de 500 ou mais. Muitos países industriais estão abaixo dos 25. Não poderíamos limitar a amplitude a, digamos, 100, e verificar como isto funciona? As pessoas que atingiram o limite podiam tanto trabalhar por nada à margem se elas gostam do seu trabalho, ou dedicar o seu tempo extra a hobbies ou serviço público. A procura deixada por satisfazer por aqueles no topo será satisfeita por aqueles que estão abaixo do máximo. Um sentido de comunidade, necessário para a democracia, é difícil de manter em meio às vastas diferenças de rendimento actuais nos EUA. Ricos e pobre separados por um factor de 500 tornam-se quase espécies diferentes. A principal justificação para tais diferenças tem sido de que elas estimulam o crescimento, o qual um dia fará toda a gente rica. Isto pode ter tido plausibilidade superficial num mundo vazio, mas no nosso mundo cheio é um conto de fadas.

4. Liberalizar a extensão do dia, semana e ano de trabalho — permitir maior opção para trabalho em tempo parcial ou pessoal. O emprego externo a tempo inteiro para todos é difícil de proporcionar sem crescimento. Outros países industriais têm férias muito maiores e licenças pós parto do que os EUA. Para os Economistas Clássicos a extensão da jornada diária era uma variável chave pela qual o trabalhador (auto-empregado ou artesão) equilibrava a desutilidade marginal do trabalho com a utilidade marginal do rendimento e do lazer de modo a maximizar o gozo da vida. Sob o industrialismo a extensão da jornada diária tornou-se um parâmetro ao invés de uma variável (e para Karl Marx era o determinante chave da taxa de exploração). Precisamos torná-la mais uma variável sujeita à escolha do trabalhador. E deveríamos cessar de enviesar a escolha entre trabalho e lazer através de anúncios para estimular mais consumo e mais trabalho para pagar por ele. A publicidade não deveria mais ser tratada como uma despesa comum da produção fiscalmente dedutível.

5. Re-regulamentar o comércio internacional — afastar o livre comércio, a livre mobilidade de capital e a globalização, adoptar tarifas compensatórias para proteger, não firmas ineficientes e sim políticas nacionais eficientes de internalização de custos da competição com padrões rebaixados. Não podemos integrar-nos com a economia global e ao mesmo tempo ter melhores salários, padrões ambientais e redes de segurança social do que o resto do mundo. A mobilidade do comércio e do capital deve ser equilibrada e justa, não desregulamentada ou "livre". As tarifas também são uma boa fonte de receitas que poderiam substituir outros impostos.

6. Reduzir o FMI-BM-OMC a algo como o plano original de Keynes para uma câmara de compensação multilateral de pagamentos, cobrando taxas penalizadoras sobre excedentes bem como sobre défices de balanças — buscar o equilíbrio em conta corrente e portanto evitar grandes dívidas externas e transferências em conta capital. Por exemplo: sob o plano de Keynes os EUA pagariam um encargo penalizador à câmara de compensação pelo seu grande défice para com o resto do mundo e a China também pagaria uma penalidade semelhante pelo seu excedente. Ambos os lados em desequilíbrio seriam pressionados a equilibrar as suas contas correntes através de penalidades financeiras, e se necessário fosse por ajustamentos na taxa de câmbio em relação à unidade da câmara de compensação, chamada de bancor por Keynes. O bancor serviria como divisa de reserva mundial, um privilégio que não deveria ser desfrutado por qualquer divisa nacional. O FMI prega o livre comercio com base na vantagem comparativa e assim fez por longo tempo. Mais recentemente o FMI-BM-OMC começaram a pregar o evangelho da globalização, o qual, em acréscimo ao livre comércio, significa a livre mobilidade internacional do capital. Contudo, o argumento clássico da vantagem comparativa assume explicitamente a imobilidade internacional do capital! Quando confrontado com esta contradição o FMI agita as mãos, sugere que você pode ser um xenófobo e muda de assunto. O FMI-BM-OMC contradizem-se ao serviço dos interesses das corporações transnacionais. A mobilidade internacional do capital, a par do livre comércio, permite às corporações escaparam à regulamentação nacional de interesse público, jogando um país contra o outro. Uma vez que não há governo global elas estão de facto sem controle. A coisa mais próxima que temos de um governo global (FMI-BM-OMC) não mostrou interesse em regulamentar o capital transnacional em prol do bem comum.

7. Afastar-se da reserva fraccionária da banca rumo a um sistema com exigências de reserva de 100%. Isto colocaria o controle da oferta monetária e da seigniorage [4] nas mãos do governo ao invés de estar nas mãos de bancos privados, os quais não poderiam mais criar moeda a partir do nada e emprestá-la a juros. Todas as instituições financeiras quase-bancárias deveriam ficar sob esta regra, regulamentadas como bancos comerciais sujeitas a exigências de reservas de 100%. Os bancos ganhariam o seu lucro apenas com a intermediação financeira, a emprestar o dinheiro de poupadores a eles próprios (cobrando uma taxa de empréstimos mais alta do que a taxa paga a depositantes em contas de poupança) e proporcionando controle, guarda e outros serviços. Com reservas de 100% todo dólar emprestado seria um dólar previamente poupado, restabelecendo o equilíbrio clássico entre abstinência e investimento. O governo pode pagar as suas despesas emitindo mais moeda fiduciária não sujeita a juros para compensar a moeda eliminada criada por bancos e sujeita a juros. Contudo, ele pode fazer isto até o limite estrito imposto pela inflação. Se o governo emitir mais dinheiro do que o público quer manter, o público o comercializará em troca de bens, conduzindo os preços a um nível mais alto. Tão logo o índice de preços comece a elevar-se o governo deve imprimir menos e tributar mais. Portanto uma política de manter um índice de preços constante governaria o valor interno do dólar. O valor externo do dólar poderia ser deixado às taxas de câmbio a flutuarem livremente (ou preferivelmente à taxa contra o bancor na câmara de compensação de Keynes).


8. Cessar de tratar a escassez como se fosse não-escassez, mas cessar também de tratar a não-escassez como se fosse escassez. Confinar os bens comuns remanescentes de capital natural (exemplo: atmosfera, espectro electromagnético, terras públicas) em trusts públicos e atribuir-lhes preço através de um sistema de comércio por leilões com tecto, ou de impostos, ao mesmo tempo que libertar de confinamentos privados e de preços a comunidade não rival do conhecimento e da informação. O conhecimento, ao contrário da produção material, não é dividido com a partilha e sim multiplicado. Uma vez que exista conhecimento, o custo de oportunidade de partilhá-lo e o seu preço de distribuição deveriam ser zero. A ajuda internacional ao desenvolvimento deveria cada vez mais tomar a forma de conhecimento livre e activamente partilhado, juntamente com pequenas doações, e cada vez menos a forma de grandes empréstimos sujeitos a juros. Partilhar conhecimento custa pouca, não cria dívidas não reembolsáveis e aumenta a produtividade dos factores de produção realmente rivais e dos factores escassos. O conhecimento existente é o mais importante input à produção de novo conhecimento e mantê-lo artificialmente escassoe caro é perverso. Os monopólios de patente (também conhecidos como "direitos de propriedade intelectual" deveriam ser dados a cada vez menos "invenções" e durante cada vez menos anos. Os custos de produção de novo conhecimento deveriam, cada vez mais, ser financiados publicamente e a seguir o conhecimento ser livremente partilhado.

9. Estabilizar a população. Trabalhar para um equilíbrio no qual nascimentos mais imigrantes equalize mortes mais emigrantes. Isto é controverso e difícil, mas para começar a contracepção deveria ser tornada disponível para utilização voluntária por toda a gente. E se bem que cada país possa debater se deveria aceitar muitos ou poucos imigrantes, tal debate é tornado controverso se não forem aplicadas leis de imigração. Apoiar o planeamento familiar voluntário, e a aplicação de leis de imigração razoáveis, aprovadas democraticamente apesar do lobby do trabalho barato.

10. Reformar a contabilidade nacional — separar o PIB numa conta de custo e numa conta de benefício. Compará-los na margem, cessar o crescimento da produção quando os custos marginais equalizam os benefícios marginais. Além desta abordagem objectiva, reconhecer a importância dos estudos subjectivos que mostram que, para além de um patamar, o crescimento ulterior do PIB não aumenta a felicidade sentida. Para além de um nível já alcançado em muitos países o crescimento do PIB não proporciona mais felicidade, mas continua a gerar esgotamento e poluição. No mínimo não devemos simplesmente assumir que crescimento do PIB é "crescimento económico", mas demonstrá-lo. E começar por tentar refutar a montanha de evidências em contrário.

Se bem que estas políticas parecerão radicais a muitos, vale recordar que elas são tratáveis através de aplicação gradual. Cem por cento de reservas pode ser atingido gradualmente, a amplitude da distribuição pode ser restringida gradualmente, os tectos podem ser ajustados gradualmente, etc. Estas medidas também são baseadas sobre as instituições conservadoras da propriedade privada e da distribuição de mercado descentralizada. Elas simplesmente reconhecem que a propriedade privada perde a sua legitimidade se demasiado desigualmente distribuída e que os mercados perdem a sua legitimidade se os preços não contarem toda a verdade acerca dos custos de oportunidade. Além disso, a macroeconomia torna-se um absurdo se à sua escala for exigido que cresça para além dos limites biofísicos da Terra. E bem antes de atingir aquele limite físico radical estamos a deparar-nos com o limite económico conservador no qual os custos extras de crescimento tornam-se maiores do que os benefícios extras, introduzindo-nos solenemente na era do crescimento não económico, até agora não reconhecida.

01/Junho/2009

NT:
[1] Historicamente já houve economias estacionárias (ou de reprodução simples) como a dos incas antes de serem conquistados pelos espanhóis, o modo de produção asiático, a tradicional cultura de subsistência africana, o comunismo primitivo, algumas sociedades polinésias (ver Collapse , de Jared Diamond), etc. Mas o modo de produção capitalista caracteriza-se precisamente pela reprodução ampliada. Uma economia estacionária será portanto incompatível com o capitalismo. Ao defender o crescimento estacionário o autor põe em causa (e bem) o crescimento canceroso da actual economia capitalista. Contudo, abstém-se de dar o passo lógico seguinte, ou seja, explicitar que isto não poderia ocorrer no âmbito das actuais relações de produção e que portanto estas teriam de ser transcendidas. Esta omissão diante da conclusão necessária pode ser verificada nos dez paliativos progressistas que preconiza a seguir.

[2] Dead cat bounce: Forte subida nas cotações depois de uma queda abrupta. Normalmente, esta recuperação resulta do facto de existirem vendedores a descoberto (short sellers) que estão a fechar posições no mercado, comprando as acções e encaixando as respectivas mais-valias.

[3] O exemplo é mau. As emissões de CO 2 de origem antropogénica são irrelevantes em termos climatológicos, como já foi demonstrado pelo Prof. Marcel Leroux. Ver Aquecimento global: uma impostura científica . O CO 2 não é um poluente e é errado confundir problemas climatológicos com problemas ambientais.

[4] Seigniorage: lucros sobre a cunhagem de moedas (na Idade Média).

[*] Da Escola de Política Publica da Universidade de Maryland,

http://en.wikipedia.org/wiki/Herman_Daly
O original encontra-se em http://www.theoildrum.com/node/5464#more . Tradução de JF.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info (Portugal)

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey