Intimidação de Jornalistas na Bolívia Atinge Pravda.ru

Intimidação de Jornalistas na Bolívia Atinge Pravda.ru

"Eles estão me vigiando", comentou no domingo de madrugada este jornalista com diretor de Pravda Brasil. Ao longo da segunda-feira, constatou-se que ambos os contatos estavam interceptados

Edu Montesanti

  

  

  

Está caótica a situação na Bolívia. O próprio presidente russo, Vladimir Putin,  chegou a comparar na semana passada o cenário boliviano com o líbio após a catastrófica invasão dos Estados Unidos, em 2011.

E os primeiros a sofrer com esta tragédia boliviana, como sempre em investidas anti-populares e corruptas como é o caso do país andino agora, são jornalistas e intelectuais que nao aceitam trilhar o caminho mais fácil, o da grande mídia e suas mentiras em favor das grandes corporações e dos porões do poder político, mas perseveram sobre a verdade através da investigação e insistem nas ideias alternativas.

O novo governo boliviano, ilegítimo já que o Congresso boliviano não se reuniu para aprovar ou rejeitar a renúncia do presidente Evo Morales em 10 de novembro, tem exercido guerra aberta contra jornalistas alternativos e independentes, "sejam bolivianos ou estrangeiros".

Segundo a ministra de Comunicação da presidenta interina Jeanine Áñez, Roxana Lizarraga, jornalistas que incitem a sociedade local serão sumariamente presos. Algo impreciso que, na prática, significa perseguição a comunicadores que denunciem todo a sorte de abuso incluindo graves violações dos direitos fundamentais do ser humano, que seu regime tem cometido especialmente contra os povos originários locais.

Eu Não Sabia com Quem Falava, e Vice-Versa

O jornalista argentino Mariano García da TV argentina Telefe, fez uma pergunta na noite de segunda-feira em La Paz que deixou visivelmente irritado Luis Fernando Camacho, o multimilionário que, apoiado pelos norte-americanos (provas aqui), lidera a promoção do caos em solo boliviano. 

A questão colocada foi como a Bolívia poderia se normalizar daqui em diante, dada a divisão entre os que apoiam o afastamento de Evo Morales (especialmente a grande maioria na branca e elitista Santa Cruz de la Sierra de Camacho), e os que se opõem (a maioria em cidades como La Paz, efervescente desde a renúncia do primeiro mandatário indígena da história do país sul-americano).

"Camacho já mandou vigiar o jornalista da Telefe", disseram a este que escreve três jovens no centro de Santa Cruz de la Sierra, na noite de quarta-feira (13) da semana passada.

Ate então, este repórter não sabia de quem se tratavam os dois rapazes e a moça, e vice-versa: eles não sabiam que o sorridente e questionador brasileiro que parecia não entender absolutamente nada do que estava acontecendo, acompanhado de uma bebê, era jornalista. E que escreve para um meio russo além da teleSUR, que apoia Evo Morales.

Mais adiante, quando os universitários bolivianos se identificaram como pertencentes à fascista Unión Juvenil Crucenista (movimento de extrema-direita reconhecido como extremista até pela Embaixada dos Estados Unidos em território boliviano, além de órgaos internacionais), veio a identificação deste autor junto de um pedido de entrevista. O desconforto teve claro início, então, entre os jovens cruzenhos.

Ficou claro quando, exibindo um dos documentos comprovando o exercício das atividades jornalísticas, um dos rapazes apontou o celular para o papel, permanecendo com o aparelho diante do documento.

Quando já estava evidente que os "promotores da democracia", como eles se auto-denominam, não concederiam entrevista nenhuma, pediram a este jornalista o número de celular.

O ambiente estava tenso. Os olhares entrecortavam-se eram entre os juvenis cruzenhistas unidos, dissimuladamente mas sob a clara percepção deste que escreve, dividindo atenção com a bebê entre tanta gente nas ruas daquela noite de quarta-feira, em Santa Cruz de la Sierra.

Como que para não demonstrar sentimento de intimidação, este autor concedeu-lhes, sem nenhum problema, o contato pedido consciente de que não haveria ligação nenhuma.

"Tudo bem, a gente vai ligar para você, então", disse a menina como que para se despedir. Uma maneira educada de acabar de vez com a conversa que havia se iniciado tão amigavelmente, para terminar (para eles) de modo entendiante para dizer o mínimo.

Pois o jornalista em questão entendeu bem a mensagem e, fazendo que não a entendeu, "pulou fora" daquela pequena reunião que já estava insuportável cheio de agradecimentos, e supostas expectativas pela entrevista que nunca viria a ser concedida.

Atmosfera Altamente Tensa

Entre sexta (15) e sábado (16), nove civis foram assassinados por forças policiais e militares: todos indígenas, apoiantes de Evo Morales. Desde a renúncia deste, contabilizam-se 23 mortos pelas forças do Estado golpista liderado pela fantoche Jeanine, ex-suplente de senador da oposição ao Movimento ao Socialismo (MAS) de Evo, ilustre desconhecida de todos os bolivianos até assumir a patética Presidência boliviana desde 12 de novembro.

"A lei será totalmente aplicada contra jornalistas, ou pseudo-jornalistas que são sediciosos. Sejam eles nacionais ou estrangeiros", disse Roxana Lizarraga na última quinta-feira (14). 

Os jornalistas estão na mira implacável dos violentos golpistas da elite boliviana, conforme confidenciaram os integrantes da UJC a este repórter no dia 13.

A propria Russia tem sido tragicomicamente mencionada pelos golpistas da vez, como inimiga a ser combatida. Chegou-se a dizer, no inicio dos violentos protestos, que "Putin ja mandou seus homens matar todo mundo na Bolívia". 

Anda-se criando fabulas e mais fabulas sobre a Russia entre os bolivianos mais abastados. No domingo (17), a socióloga boliviana Silvia Rivera Cusicanqui disse que existe uma mafia em seu pais "que inclue capitais chineses, russos [grandes temidos dos EUA por razoes economicas e militares] e venezuelanos [outros inimigos declarados do regime de Washington, por terem nacionaloizado as maiores reservas petroliferas do mundo, que estao em seu subsolo], que está vivinha, que contnua armando as pessoas e que continua armando mentalidades [grifo nosso]".

Liberdade e Democracia segundo os Velhos Fantoches de Tio Sam

Percebendo algumas movimentações um tanto exóticas nos últimos dias, este autor contou por correio eletrônico a Timothy Bancroft-Hinchey, diretor de Pravda Brasil e co-editor de Pravda.ru em inglês, no início da madrugada de domingo (17), horário de La Paz: "eles estão me vigiando".

Para receber a pronta resposta e total apoio pessoal, e de Pravda.ru no início da manhã de domingo, hora de La Paz: 

"Bom, se eles estão vigiando você, estão sendo vigiados por Pravda de maneira que qualquer abuso de direitos humanos será denunciado, eles serão denunciados, e seus líderes serão igualmente denunciados.

"Você tem o direito à liberdade de expressão em qualquer lugar do mundo, por lei. Se eles não puderem respeitar esse direito, serão criminosos e deverão ser responsabilizados pelos abusos."

Na noite daquele mesmo domingo, este jornalista enviou uma reportagem em inglês por correio eletrônico a Timothy "Timi" Hinchey, e um pouco depois em português sobre as comprovadas mentiras da Organização dos Estados Americanos (OEA) e do atual regime insturado na Bolívia envolvendo a suposta fraude eleitoral de 20 de outubro, com depoimentos de entrevistados civis bolivianos com exclusividade.

Com um detalhe: a conta utilizada para os envios da reportagem em dois idiomas é a mesma vinculada ao número de celular do autor, fornecido aos mencionados jovens da extrema-direita boliviana dias antes.

O diretor de Pravda Brasil afirmou, na noite de segunda-feira (18), hora de La Paz, não ter recebido nada. Enviadas através de outras contas, este jornalista em meio à guerra civil instalada há quase um mês no país andino não obtem resposta do diretor de jornalismo russo.

O jeito será, de agora em diante, buscar outros meios para contactar Timi, e ter as reportagens publicadas.

Tudo isso, subproduto do que os golpistas bolivianos de turno andam chamando de defesa da democracia e da liberdade.

Inversamente proporcional ao escandaloso volume que apita a panela de pressao boliviana, é o ensurdecedor silêncio da OEA e dos Estados Unidos diante deste caos com uma diariamente cavalar dose de violação dos direitos fundamentais do ser humano em uma país que esteve, nos últimos 13 anos e meio, relativamente establizado política e economicamente.

Velho filme que a América Latina, desgraçadamente, conhece muito bem. O que o Império mais terrorista da história em parceria com as elites latino-americanas historicamente catadoras de migalhas de Tio Sam, melhor sabe fazer


Author`s name
Timothy Bancroft-Hinchey