Nuland vai à Europa: fim das 'concessões'

 

Victoria Nuland, secretária-assistente de Estado dos EUA para Assuntos Europeus e Eurasianos, acaba de voltar de seu tour por satélites dos EUA no leste do velho continente: Croácia, Macedônia, Sérvia e Ucrânia. Falou mais como vice-rei britânico distribuindo ordens a súditos nas colônias que como funcionária de escalão médio, de estado estrangeiro e distante, que tem obrigação de tratar aliados dos EUA com o respeito devido a nações soberanas. 

Usei propositalmente o termo "satélites", não aliados, no caso de Croácia e Ucrânia (menos, no caso de Sérvia e Macedônia). Esses países não são exatamente aliados dos EUA. Aliado é associado por desejo próprio e de boa vontade, por relacionamento mútuo. Ser aliado pressupõe prontidão para apoiar outro país como livre escolha de um governo que corresponda ao desejo geral da nação.

Nada disso tem a ver com a Ucrânia, onde o regime pró-EUA só está onde está por efeito do "mais escancarado golpe de toda a história", segundo George Friedman, de Stratfor. A aproximação intensiva com EUA e União Europeia levou à guerra civil naquele país. Ainda mais difícil considerar Sérvia ou Macedônia como aliados dos EUA. Em 1999, aviões dos EUA atacaram a Sérvia. Por causa de pressões dos EUA, a Macedônia acabou impedida de participar no lucrativo projeto do Ramo Turco, gasoduto pelo qual o gás russo atravessaria território macedônio. Governo e povo desses países ouviram sermões da Sra. Nuland. E então, por estranho que pareça, tudo que elas lhes disse, rapidamente virou realidade. A Macedônia é o exemplo mais recente. 

Em Dubrovnik, na Croácia, dia 10 de julho, Victoria Nuland disse "Nossa mensagem para a Macedônia é igualmente firme: as maiores oportunidades para unidade e prosperidade estão ao alcance de vocês; podem ser membros da OTAN e da UE. Mas as principais forças políticas têm de pôr fim às querelas e tomar o caminho das reformas democráticas planejadas pelo Comissário da UE Johannes Hahn com apoio dos EUA; e, na sequência, tratar de resolver com a Grécia a questão do nome.Repito: não desperdicem o momento."

São palavras do dia 10 de julho. Repentinamente, os líderes dos quatro principais partidos e dois grupos que representam a minoria albanesa na Macedônia entraram em acordo para resolver a crise política. O que foi formalizado dia 15 de julho. Que coisa! Que feliz evento! E quem teria operado como intermediários? Ninguém menos que o Comissário Europeu para as Políticas de Vizinhança e Promoção Johannes Hahn e o embaixador dos EUA Jess Baily. A crise política já se arrastava há alguns meses. Começou com a divulgação de conversas gravadas do primeiro-ministro Nikola Gruevski e outros líderes macedônios. Só serviços especiais das grandes potências poderiam ter gravado e divulgado as tais conversas. A imprensa-empresa nos EUA e na Europa pintou Gruevski como político pró-Rússia corrupto, que se serviria de métodos autoritários para governar o país.

Zoran Zaev, líder político da União Social-Democrata da Macedônia (SDSM) e líder da oposição no país, que combina considerável fortuna pessoal e defesa empenhada de valores social-democratas, organizou "protestos pacíficos" em frente ao prédio do governo. Fez lembrar os eventos na Ucrânia. Zaev fez de tudo para aparecer como réplica de Poroshenko ou Yatsenyuk, o que conseguiu (comparação que ele com certeza considerará elogiosa).

A Sra. Nuland encerrou o sermão, os protestos acabaram repentinamente e surgiu o documento com notícias de que a oposição seria representada no Gabinete a partir de outubro, depois do que haveria novas eleições previstas para abril de 2016 (100 dias depois de a oposição passar a integrar o governo). Tudo feito em estrita concordância com o que Victoria Nuland ordenara em Dubrovnik, Croácia.

Martin Sieff, ex-diretor da sucursal do Washington Times no Leste da Europa, disse que não conseguia acreditar nos próprios olhos. Nuland falou como se fosse o imperador Trajano de Roma, impondo novas leis nas províncias do império. Os dois discursos foram proferidos praticamente na mesma locação geográfica. Foi como se tudo que aquela neo-Trajano dissesse, logo virasse realidade. Gruevski aceitou até que representantes da oposição fossem admitidos como parte do governo, 100 dias antes das novas eleições. E também se recusou a fazer parte do Ramo Turco até que União Europeia e Rússia acertem as diferenças. 

O sermão da neo-Imperador-Trajano pode levar a maus resultados.

Vejam como a União Europeia trata a Grécia ou a atitude adotada pelos EUA  nos contatos com Rússia e Ucrânia. Imperadores ocidentais contemporâneos sabem como dividir e querem muito governar, mas perderam a habilidade para fazer concessões - habilidade muito necessária para quem queira governar.

O partido grego Syriza tentou alcançar um compromisso com o ocidente (União Europeia, Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional). A Grécia usou meios democráticos para enfrentar o problema: organizou um referendum. Queria receber concessões em troca das concessões feitas (o colapso da Grécia será situação de perde-perde, todos perdem). A primeira coisa que a União Europeia fez foi ameaçar a Grécia; em seguida ofereceu um plano de arrocho com imposições ainda mais duras que antes.

É mau sinal para todos que sempre advogaram a política de compromissos com concessões dos dois lados: os social-democratas europeus. O especialista grego Kostas Pliakos lembra que Syriza é hoje a coalizão da esquerda radical com sociais-democratas. Por mais de um século a social-democracia europeia vem procurando uma solução de compromisso com o capitalismo (hoje representado pelo ocidente unificado), com concessões de lado a lado. Isso, precisamente, os diferenciou dos bolcheviques na União Soviética. 

Funcionou nos anos 1960s e 1970s. Depois da 2ª Guerra Mundial, o ocidente tornou-se razoável, humano e flexível - assustado pela Revolução Russa e pela reação contra ela, o nazismo alemão, que levou a terror ainda mais horrível.

Hoje, tudo isso mudou. O ocidente não busca mais nenhum compromisso e, portanto, já não faz qualquer concessão; a tática dos sociais-democratas tantas vezes tentada já não tem qualquer utilidade. Só há uma saída.

Gregos e macedônios que se opõem à política da UE têm de unir-se a aliados de melhor qualidade, como a Rússia e, talvez, com outros dos países BRICS. Parece que, até agora, nem a Grécia nem o leste da Europa conseguiram entender isso. *****

 Nuland vai à Europa: fim das 'concessões' 18/7/2015, Dmitry BABICH, Strategic Culture  

18/7/2015, Dmitry BABICH, Strategic Culture  

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey