Por Alessandro Lyra Braga
Dizem que gosto não se discute, será verdade? E mau gosto, podemos discutir? Sim, podemos e devemos. Até porque sempre questionamos o gosto alheio e as aberrações da natureza que nos cerca. Afinal, será que alguém realmente gosta de ganhar pouco ou namorar gente feia? Duvido. Como também duvido que não discutamos o gosto alheio. É algo inerente à nossa condição humana.
Quando resolvemos analisar o gosto dos outros, um dos primeiros tópicos que tentamos entender e criticar é o gosto amoroso dos outros. Quem nunca pensou "puxa vida, uma mulher tão bonita com um cara tão feio! O que será que ela viu nele?". Até eu, admito, já pensei isto várias vezes em minha vida. Inclusive, já cheguei à conclusão de que as mulheres gostam é de casar, não importando com quem. Comecei a observar que aquelas moças que na juventude queriam namorar apenas os rapazes mais bonitos, acabaram por se casar com verdadeiros monstrinhos. Conheci uma que dizia que só se casaria com um rapaz que fosse bonito, loiro, alto, diplomata e de família rica. Coitada, só conseguiu enlaçar um sujeitinho feio, sem graça e pobre ainda por cima. O pior é que se antes ela era linda, hoje a lei da gravidade se fez atuante. Deu para entender o que aconteceu, não deu?
Ainda quanto aos tipos humanos, aqueles que estão nos padrões ditos corretos, ou seja, os "sarados", ricos e bonitões são sempre considerados como sendo "mais gente", do que os que estão fora desses conceitos. Gordos, carecas, gagos, dentuços, magricelos e até deficientes físicos sofrem por serem diferentes. Há quem diga, numa total prova de estupidez, que "gente assim só se casa com quem sobrar".
Outro ponto que sempre tomamos por base para discutir o gosto alheio é quanto ao modo de se vestir. Quem sair da moda, por pior que ela seja, corre o risco de ser exilado do convívio social. Nos anos sessenta e setenta do século passado todo mundo usava roupas com estamparias coloridíssimas que chegavam a doer os olhos da gente. Já nos anos oitenta, procurou-se uma certa discrição. Em dado momento, lá pelos anos noventa, as calças de cintura baixa, que outrora haviam sido moda, voltaram, revelando para o mundo parte das bundas que as vestem, os chamados "cofrinhos". Talvez daí tenha surgido o encolhimento do crédito no mercado, pois devem estar armazenando muitas moedinhas nestes cofrinhos....
Também sempre questionamos o gosto alheio quanto à comida. Eu não consigo aceitar nem entender que alguém goste de mortadela e dobradinha, por exemplo. Eu tenho horror só do cheiro dessas "coisas", que representam o mais profundo mau gosto popular. Também detesto aqueles churrascos com muita cerveja e pagode. Muitos deles até terminam em briga e sempre tem um bêbado chato, suado e com um insuportável bafo de cerveja, que resolve falar com todo mundo nos abraçando e assim nos encharcando de suor ou então fica brincando maliciosamente com uma linguiça, como se esta fosse a brincadeira mais original do mundo. É um verdadeiro horror. Uma sucursal do inferno!
Já que toquei no assunto, entendo muito pouco de música. Nem sei se posso me considerar um verdadeiro amante da música, pois adoro o silêncio, que acaba por se tornar música para meus ouvidos. Mas, na verdade, sou muito eclético para músicas em geral, embora seja muito preconceituoso para as novas músicas que estão por aí. Considero a maior parte delas apenas um barulho e de muito mau gosto! Muita gente diz adorar o rock e os Beatles. Eu não ligo muito para eles, embora entenda que este gênero musical (na verdade foi mais um movimento cultural do que apenas um gênero musical) e o citado conjunto tiveram importância fundamental na modelagem da sociedade moderna. Mas não consigo aceitar o que veio após estes adventos, como o heavy metal, que considero como sendo um barulho infernal e de mau gosto feito para momentos de delírios psicóticos. Também detesto o funk e estes pagodinhos safados que fazem para aí e que servem para alegrar shows de público questionável, pelo menos do ponto de vista da agressividade. Duvido que alguém brigue depois de ouvir "Chega de saudade" ou "Garota de Ipanema".
Também no cinema o mau gosto pode se fazer presente de forma avassaladora. Aquelas idiotas comédias norte-americanas com adolescentes estúpidos que só pensam em sexo é uma das maiores provas da estupidez humana. Tem um filme da série "American Pie" que um dos personagens, por sinal o mais idiota de todos, acaba tendo que comer um cocô de cachorro afirmando que é chocolate. É uma cena lamentável, que justifica a pena de morte ao roteirista do filme. No entanto, filmes como "Sociedade dos Poetas Mortos" e "Simplesmente amor" são verdadeiras obras de arte atemporais, essenciais para quem quer se desenvolver humanisticamente.
Também o gosto literário pode ser discutido. Particularmente, detesto livros de auto-ajuda e aqueles que se apresentam como místicos, falando milhares de baboseiras e frases já batidas sobre o poder mental ou outra forma barata de magia. Os verdadeiros livros neste sentido acabam nem sendo conhecidos pelo grande público, pois estão restritos a um círculo de estudo bem fechado. Também não me agrada a leitura de certos autores, como Paulo Coelho, mas entendo sua importância, pois muita gente começou a gostar de ler a partir de suas obras.
Um dos bastiões do gosto duvidoso são as famosas viagens nos feriados. Geralmente é um império de desconforto, a começar pelo trânsito engarrafado na ida e na volta e os locais onde se dorme, geralmente infestados de mosquitos e outros insetos e, se for verão, com o calor amenizado apenas por ventiladores pequenos, para ocupar menos espaço no carro. Colchonetes, roupas e mochilas para todos os lados, macarronada ou churrasco de almoço e um festival de barulhos ditos musicais durante o dia e outros barulhos fétidos à noite na hora de dormir, acompanhado pela sinfonia dos roncos. Como é possível que alguém goste disso? Como?
Um dos pontos que hoje quase todo mundo concorda é quanto à política, pois todos gostam quando um desses malditos espécimes, "políticos", vai preso. Pena que isto é difícil de acontecer! Antigamente, as pessoas gostavam e defendiam seus políticos de predileção. Quem era Brizola, seria brizolista até a morte. Hoje, tentamos sobreviver às roubalheiras que estes cretinos (com pouquíssimas exceções) impõem ao país. Prova da consciência deles quanto ao mal que fazem à sociedade foram as doenças da Dilma e do Lula. Quando adoeceram, eles foram procurar tratamento no Hospital Sírio e Libanês de São Paulo, quando deveriam ter ido ao SUS, entrado numa fila ainda de madrugada para pegar senha e se tratar por lá mesmo, já que eles tanto afirmaram em suas campanhas políticas que melhoraram estas instituições. Confesso que lamentei muito ao saber que estes dois estão curados. Não fariam nenhuma falta ao país.
Admito que meus artigos são muito psicanalíticos. Na verdade, estou me auto dissecando neles. Prefiro me expor a ter que escrever o que não acredito. Por isso acredito que posso gerar alguma controvérsia quanto ao meu gosto em geral. Mas não há outra solução, já que este é o meu jeitinho estúpido de ser...
*Alessandro Lyra Braga é carioca, por engano. De formação é historiador e publicitário, radialista por acidente e jornalista por necessidade de informação. Vive vários dilemas religiosos, filosóficos e sociológicos. Ama o questionamento.
http://www.debatesculturais.com.br/gosto-se-discute/
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