Discute-se hoje, dia 20 de janeiro, na Assembleia da República o Projeto de Lei 17/XIII/1 de Os Verdes que impede o cultivo e a libertação deliberada em ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM).
O risco dos transgénicos para a saúde levou já a que muitos países da União Europeia tenham recusado o cultivo de OGM e, com esta iniciativa, o PEV pretende apelar a um olhar sério sobre o assunto, para que Portugal não se converta num "paraíso" da Monsanto, rejeitando, também ele, o cultivo de culturas transgénicas que comportam enormes riscos de contaminação de culturas tradicionais e biológicas.
Os Verdes relembram que esta iniciativa legislativa foi entregue na Assembleia da República em Novembro do ano passado e integrava um conjunto de 10 iniciativas sobre matérias que o PEV considerava de discussão urgentes.
O Grupo Parlamentar Os Verdes
Projeto de Lei nº 17/xiii/1ª impede o cultivo e a libertação deliberada em ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM)
Nota justificativa
A rejeição dos organismos geneticamente modificados (OGM), por parte dos cidadãos dos diversos Estados da União Europeia, tem sido confirmada através de diversos estudos. Esta atitude crítica sustenta-se sobretudo nos riscos que os transgénicos podem representar para a saúde e para o ambiente, designadamente ao nível da perda de biodiversidade e de contaminações acidentais ou deliberadas. Desta forma, mais de 70% dos cidadãos recusam consumir alimentos transgénicos e cerca de 95% não admitem prescindir do direito de poderem rejeitar OGM.
A União Europeia não foi respeitadora da vontade dos cidadãos quando determinou que a informação ao consumidor em geral, e as normas de rotulagem em particular, não teriam que se suportar num esclarecimento cabal sobre a presença de transgénicos nos alimentos. A título exemplificativo, quando um alimento contém matéria transgénica em quantidade inferior a 0,9%, dispensa-se informação ao consumidor; em relação a produtos de origem animal, não se presta informação ao consumidor sobre se os animais foram alimentados com ração transgénica. A União Europeia preferiu deixar a porta aberta à salvaguarda dos interesses das multinacionais do setor agroalimentar.
Já em relação ao cultivo, foi em 1998 que a União Europeia autorizou o cultivo do milho transgénico MON810, no seu espaço geográfico. Esta decisão da União Europeia foi muito contestada, mas, ignorando o sentimento maioritário dos cidadãos, os organismos europeus preferiram ceder aos interesses da Monsanto (com 80% da quota de mercado mundial dos transgénicos) e, assim, dar entrada à realidade transgénica no mundo agrícola da União Europeia.
Em Portugal, o Partido Ecologista Os Verdes empenhou-se de várias formas, incluindo através de iniciativas legislativas, na aplicação de uma moratória relativa ao cultivo e à comercialização de OGM. Considerávamos que não estavam salvaguardados nem os direitos dos agricultores, nem dos cidadãos, nem a salvaguarda dos ecossistemas, e que, não sendo possível garantir a não contaminação entre culturas transgénicas e tradicionais ou biológicas, importava aplicar o princípio da precaução.
Infelizmente, as diferentes maiorias parlamentares assumiram sempre uma postura de aceitação incondicional da autorização europeia, referindo que não era possível proibir o que a União Europeia aceitara. O PEV nunca aceitou esta argumentação e, por isso, insistiu mais do que uma vez na questão da moratória. A verdade é que outros Estados Membro, face às incertezas sobre os efeitos dos OGM na saúde e no ambiente, decidiram proibir o cultivo de OGM no seu território. Assim fizeram a Alemanha, a Áustria, a França, a Polónia, entre outros. Enquanto isso, em Portugal continuou-se a abrir portas ao cultivo de OGM e garantiram-se procedimentos que não permitissem aos cidadãos ter um conhecimento rigoroso sobre a localização de culturas transgénicas, o que é absolutamente inadmissível se tivermos em conta casos como, por exemplo, o de um agricultor que se quer instalar e apostar em culturas biológicas e que, para garantir a segurança da sua produção, quer ter a certeza que não fica aproximado de uma propriedade agrícola que faz cultura OGM. Tratou-se de um profundo desrespeito para com os cidadãos.
Entretanto, a União Europeia determinou que a decisão de proibição do cultivo de OGM nos respetivos países passará a competir a cada Estado Membro. Nestas circunstâncias, um dos argumentos usados pelas consecutivas maiorias parlamentares e pelos consecutivos Governos, que consistia numa desresponsabilização própria, para se assumirem submetidos ao que a União Europeia autorizasse, deixa de poder ser usado. É tempo, portanto, de Portugal se desvincular da profunda leviandade com que tem permitido a presença de OGM nos nossos campos agrícolas e seguir o exemplo de uma grande parte de países da União Europeia (como Alemanha, Áustria, Bulgária, Chipre, Croácia, Dinamarca, Eslovénia, Grécia, Holanda, Hungria, Itália, Letónia, Lituânia, Polónia, entre outros) que proibiram o cultivo de OGM, por aplicação direta do princípio da precaução.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Lei que toma como objetivo a proibição de produção e cultivo de OGM:
Artigo 1º
Objeto
Em conformidade com o princípio da precaução e tendo em vista a proteção da saúde humana e do ambiente, o presente diploma proíbe o cultivo de organismos geneticamente modificados, ou que por eles sejam constituídos, assim como a libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados para qualquer fim.
Artigo 2º
Proibição de cultivo de OGM
A proibição de cultivo de organismos geneticamente modificados, ou que por eles sejam constituídos, inclui a aquisição e a receção na exploração agrícola das sementes de variedades geneticamente modificadas, bem como as operações do processo de produção e armazenamento na exploração agrícola, e ainda a entrega, pelo agricultor, dos produtos vegetais produzidos nas instalações de comercialização ou transformação.
Artigo 3º
Proibição da libertação deliberada em ambiente de OGM
A libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados refere-se a qualquer introdução intencional no ambiente de um organismo geneticamente modificado ou de uma sua combinação, independentemente de intenção ou tentativas de limitar o contacto com a população e com o ambiente.
Artigo 4º
Exclusão do âmbito de aplicação
A presente lei não se aplica às ações controladas com fins de investigação científica ou com fins medicinais.
Artigo 5º
Regime aplicável às autorizações já existentes
1.Para efeitos do cumprimento dos números anteriores, são revogadas todas as autorizações já existentes e ficam sem efeitos as notificações rececionadas relativas à libertação deliberada no ambiente para fim diferente da colocação em mercado, bem como da colocação em mercado de organismos geneticamente modificados.
2.É estabelecido um período transitório, a regular por portaria, com vista à reconversão de culturas, para o caso em que os pequenos agricultores utilizem organismos geneticamente modificados.
Artigo 6º
Contraordenações
1.Constitui contraordenação punível com coima de € 15.000 a € 150.000,00, no caso de pessoas singulares, e de € 35.000,00 a € 350.000,00, no caso de pessoas coletivas, a violação do disposto no artigo 1º do presente diploma.
2.Constitui contraordenação punível com coima de € 10.000 a € 100.000,00, no caso de pessoas singulares, e de € 30.000,00 a € 300.000,00, no caso de pessoas coletivas, a violação do disposto no artigo 2º do presente diploma.
3.A tentativa e a negligência são sempre puníveis.
Artigo 7º
Sanções acessórias
Consoante a gravidade da contraordenação e a culpa do agente, podem ser aplicadas, simultaneamente com a coima, nos termos da lei geral, as seguintes sanções acessórias:
a) Interdição do exercício da atividade;
b) Privação do direito a subsídios ou benefícios outorgados por entidades ou serviços públicos;
c) Privação do direito de participar em concursos públicos que tenham por objeto o fornecimento de bens e serviços e a concessão de serviços públicos;
d) Encerramento do estabelecimento e destruição das culturas.
Artigo 8º
Regulamentação
O Governo regulamenta a presente lei no prazo máximo de 180 dias, a contar da data de publicação.
Artigo 9º
Norma revogatória
São revogadas todas as disposições legais que contrariem o disposto na presente lei, designadamente o Decreto-Lei nº 72/2003, de 10 de abril e o Decreto-Lei nº 160/2005, de 21 de setembro.
Artigo 10º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 3 de novembro de 2015
Os Deputados
Heloísa Apolónia José Luís Ferreira
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