Quando foi da Europa Connosco, a saída política do processo revolucionário que fundou o actual regime político, opunha-se-lhe o que os vencedores chamaram o miserabilismo, isto é a defesa de um leque de rendimentos mais apertado e uma apostar nas solidariedades e cumplicidades próprias das consanguinidades culturais lusas com países do Terceiro Mundo. Escolhemos ser ricos. E aqui estamos.
Se fosse rico, com 54 anos deveria estar a planear como ocupar os anos de reforma, merecida pelos 30 anos de trabalho, como faziam nos países europeus (hoje só os funcionários da burocracia europeia de Bruxelas têm direito a tal). Em vez disso, estou preocupado com o que me irá suceder quando, daqui a mais quinze anos, deixar de poder trabalhar. Nessa altura dificilmente alguém encontrará qualquer resquício dos investimentos que fiz, através do Estado, para a minha reforma. De facto, embora tenha pago com os meus salários as reformas dos nossos mais velhos, em poucos anos os nossos mais novos estarão, em grande parte e os melhores de entre eles, fora do país que os abandonou à sua sorte, esmifrando-lhes a paciência em humilhações e desconsiderações intoleráveis. Do meu investimento restará a falência da segurança social.
Como os meus amigos de geração e de classe embora sem ser racistas ou preconceituosos, claro preferem viver em condomínios fechados ou pelo menos com parque automóvel subterrâneo, construindo assim o seu próprio mundo virtual entre as garagens do trabalho e de casa (e a escola dos miúdos, para aqueles que os fizeram), a quem irei recorrer quando, com os filhos no estrangeiro e sem amigos, precisar de uma sopinha aquecida para entreter o resto da vida? À reunião de condomínio?
Dos filhos dos outros, a recibos verdes e com trabalhos precários, posso esperar desprezo bem merecido por ter sido incapaz de lhes cumprir um destino aceitável. Dos governos que os representarão poderei esperar melhor do que daqueles que me representam agora? Continuarão o aproveitamento do ódio social entre grupos e estratos para dividir e a todos roubar o mais possível. Não é fácil conseguir recursos suficientes para alimentar as ambições de riqueza dos exploradores europeus virados cada vez mais para o seu próprio continente a mama de explorar os outros, é certo, está no fim.
Ironicamente isto vislumbra-se na sequência da globalização feita para enriquecer os patrões de um sistema que, agora, apenas conseguem prometer a redução dos rendimentos, mesmo e sobretudo daqueles de quem dizem não compreender como (ainda) sobrevivem com tanto pouco.
Não admira, pois, que a população europeia, como notou Agostinho da Silva alguns anos antes, se esteja a suicidar demograficamente: é a correspondência pavloviana, de facto, a uma política suicida das elites europeias, enlouquecidas pela sede de poder em tempo de secura.
Reformados provavelmente não faremos mais filhos. Mas seremos capazes de defender os valores morais que atraíram os povos que colonizámos, apesar das barbáries cometidas? Ou abandoná-los-emos, morrendo cobardemente e sem glória, amaldiçoando esta península continental para as civilizações futuras? Reformados, não nos podemos reformar: teremos que lutar pelas nossas reformas, o que quer dizer pela dignidade dos nossos filhos, sejam eles naturais ou adoptados. Como num jogo de futebol, a Europa Connosco reclama tensão aumentada no fim do jogo e vontade de marcar ao cair do pano.
Reformados de todo o Portugal uni-vos!
Prof. Dr. António Pedro Dores
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